Edição do dia 08/11/2016

08/11/2016 06h04 - Atualizado em 08/11/2016 09h49

Recuperação de minas abandonadas é dever importante das mineradoras

Com mais de 300 minas abandonadas, é grande o risco de um desastre ambiental. As mineradoras sabem o que fazer, mas o trabalho é escasso.

Ernesto PagliaMinas Gerais

O Hora 1 volta a falar da situação das minas fechadas ou abandonadas em Minas Gerais. As mesmas mineradoras que agridem o meio ambiente, conhecem as técnicas para recuperar a natureza. Só que esse trabalho ainda está engatinhando, quando se compara com o tamanho da devastação.

A equipe do Hora 1 foi até a Serra do Rola-Moça, no município do Brumadinho-MG. O imenso tamanho da cava da mina Casa Branca, buraco que fica depois que o minério é retirado da terra, dá a impressão de que a situação é resultado de séculos de trabalho. A verdade é que bastaram apenas 10 anos de mineração para criar a cratera. "É uma corrida para se explorar na alta do minério e em um momento como esse, que a gente vê recuar o valor do minério de ferro no mundo, a gente vê, com muito mais rapidez, minas como essa desativadas, paralisadas e sem nenhum controle", afirma o promotor de Justiça do Meio Ambiente de Minas Gerais, Carlos Eduardo Ferreira Pinto.

O preço do ferro disparou em 2013 por conta da demanda da China - a tonelada chegou a custar US$ 180. A China pisou no freio, o preço do minério caiu, sendo vendido por cerca de US$ 62 / ton em 2016. As reservas também não vão durar para sempre, como explica Carlos Eduardo, que diz que uma mina não dura nem 100 anos. "Hoje os estudiosos, principalmente do quadrilátero ferrífero, já falam que em um tempo de 20, 30 anos, nós já temos o esgotamento de áreas importantíssimas que hoje são tidas como áreas de grande prosperidade minerária".

A mina Casa Branca já rendeu muito minério de ferro, mas está paralizada há 15 anos, desde que a operação foi suspensa pela Justiça após denúncias de problemas ambientais. Mas durante a visita da equipe de reportagem, uma surpresa: a Polícia Ambiental e o Ministério Público flagraram uma sondagem de solo - trabalho feito normalmente para avaliar quanto minério existe no local. O policial embargou a operação.

Dias depois, a empresa conseguiu retomar a sondagem e a reportagem conseguiu localizar o responsável técnico, o engenheiro Glauco Mol Santos. Ele confirmou que os proprietários, Grupo Jafet, de São Paulo, pretende voltar a minerar na Casa Branca. Ele explica que a ideia é reativar a mina para ganhar mais dinheiro. Aí sim, fechar a estrutura como se deve e fazer a recuperação ambiental. O problema é convencer todos os envolvidos. Ernesto Paglia questiona Glauco se esse dinheiro necessário para a recuperação do meio ambiente não deveria ter sido separado do montante arrecadado com o primeiro período de exploração da mina. "Essa visão é a visão moderna e eu entendo que deveria ser feita. Mas essa provisão não foi feita", responde o engenheiro, que também reconhece que não há medição nas represas, o que poderia identificar possíveis ameaças.

Ernesto Paglia:  - De acordo com as autoridades estaduais, a situação é de risco ambiental elevado. De acordo com os critérios deles. Vocês não deveriam estar cuidando melhor do que é patrimônio até de vocês?

Glauco Mol:  - Eu acho que a gente tem realmente que intensificar isso. O Grupo Jafet é um grupo sério. É uma empresa séria e vai ter que buscar as condições de realizar isso.

Um ano atrás, o mundo viu o poder de destuição do rompimento de uma barragem de rejeitos. "O grande problema são algumas barragens, que são pequenas barragens, mas com volume razoável de material contido no seu interior, que representam riscos a mananciais. Já no caso da Samarco, em Mariana, a gente sempre tem um nível de preocupação", diz Francisco Mourão Vasconcelos, biólogo da ONG AMDA.

Ernesto Paglia:  - Mudou alguma coisa depois de Mariana?

Francisco Mourão:  - Claro que mudou. Porque a Samarco era uma empresa considerada modelo na área ambiental e deixou que acontecesse esse desastre.

Um rio devastado até a foz, no litoral do Espírito Santo, 19 mortes e mais de mil desabrigados pela lama. Uma das faces mais trágicas e mais tristes que o mundo já viu da mineração. A esperança é que isso não se repita nunca mais.

A Barragem de Fundão pertence à Samarco, empresa controlada por duas das maiores mineradoras do mundo: a brasileira Vale e a anglo-australiana BHP Billiton. Após meses de investigação, o Ministério Público de Minas Gerais denunciou 22 pessoas e as empresas Samarco, Vale, BHP Billiton e VOGBR pelo rompimento da Barragem de Fundão em Mariana. Entre as denúncias, estão crime ambiental e homicídio qualificado com dolo eventual, que é quando se assume o risco de matar.

Mas a própria Vale, diretamente envolvida na tragédia de Mariana, sabe como recuperar uma mina abandonada e mostra isso na cidade de Nova Lima, vizinha de Belo Horizonte. Um trator e alpinistas industriais trabalham pendurados na encosta, estabilizando as paredes das cavas, que têm mais de 350 metros de profundidade, com uma imensa rede de aço. Um radar de microondas detecta qualquer deslizamento e evita acidentes. "A gente tem que entender a lavra, a mineração, como um processo. Ele tem um início, tem um meio e tem um fim. E o fechamento faz parte desse processo", diz o coordenador executivo de geologia e planejamento da Vale, Paulo Roberto Bandeira.

O preço é alto, mas a mina Águas Claras rendeu 29 anos de exploração de minério de ferro para a Vale. 

Ernesto Paglia:  - Quanto custa recuperar uma mina do porte da Águas Claras?

Paulo Roberto:  - Com o trabalho que já fizemos e que estão em andamento, R$ 300 milhões já foram gastos. E ainda temos uns dois ou três anos [de trabalho] pela frente.

Trata-se de um investimento que muitas empresas não estão dispostas a fazer, apesar de ser uma obrigação. "O empresário ligado à mineração, ele vai se preocupar muito mais com a vida útil e retirada do minério do que com o fechamento", afirma o promotor de Justiça do Meio Ambiente, Carlos Eduardo.

A entidade que representa a indústria mineradora, Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), reconhece o problema. "Evidentemente que nós temos alguns passivos e nós temos toda condição de resolvê-los. Do ponto de vista do Ibram e da Federação das Indústrias de Minas Gerais e do nosso sindicato da Indústria, nós estamos prontos a dar a nossa colaboração", diz Fernando Coura, presidente do Ibram.

Para o promotor de Justiça do Meio Ambiente Carlos Eduardo, o prejuízo fica para a população. "Infelizmente é a sociedade mineira que arca com esse passivo gigantesco porque o estado foi omisso ao licenciar no início essa atividade".

De acordo com o subsecretário de Gestão Regional da Semad, Diogo Melo Franco, o governo mineiro será mais rigoroso na fiscalização. "O estado tem que realmente ter uma postura incisiva no controle dessas minas". Resta esperar que um dia as crateras da mineração se transformem em novos parques. como o Parque das Mangabeiras.