O advogado de Marcelly Peretto, a irmã do comerciante assassinado a facadas no apartamento dela em Praia Grande, no litoral de São Paulo, pediu a prorrogação do prazo para responder à acusação da cliente. Conforme documento obtido pelo g1, Leandro Weissmann alegou que o tempo concedido não foi suficiente para entrevistar a acusada no presídio e, em seguida, dar a resposta à Justiça.
Rafaela Costa (viúva), Marcelly Peretto (irmã) e Mario Vitorino (cunhado e sócio) foram presos por envolvimento na morte de Igor Peretto, de 27 anos. As mulheres se entregaram à polícia em 6 de setembro, enquanto o homem foi detido após ser encontrado escondido na casa de um tio de Rafaela, no dia 15 do mesmo mês.
No pedido à Justiça, Weissmann declarou que "muito embora tenha sido concedido prazo suplementar às defesas para apresentação de resposta à acusação, o prazo concedido não [foi] suficiente à acusada Marcelly".
O advogado anexou um documento enviado à Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) pedindo uma entrevista com a cliente, presa no Centro de Detenção Provisória (CDP) Feminino de Franco da Rocha (SP). Weissmann, porém, foi informado que a data disponível era 18 de dezembro.
"Mesmo telefonando à penitenciária e informando existir prazo correndo, não foi possível antecipar o atendimento", afirmou o advogado. Ele pediu a prorrogação do prazo a partir da data da entrevista.
"Esclarecendo que a demora se dá por culpa do Estado e não da defesa e o deferimento do pleito não acarretará qualquer prejuízo processual", acrescentou.
Pedido do advogado
Procurado pelo g1, Weissmann disse que a defesa não pode ser prejudicada pela deficiência do Estado. "Portanto, a acusada não pode sofrer violação ao seu direito constitucional de ampla defesa. Por outro lado, sabemos e entendemos que o Estado tem dificuldade em sua estrutura", pontuou ele.
Em nota, a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) informou que o atendimento presencial de advogados no Centro de Detenção Provisória (CDP) de Franco da Rocha não requer agendamento, e pode ser feito de segunda a sexta-feira, das 8h às 18h.
Ainda de acordo com a SAP, o atendimento virtual necessita de agendamento prévio. Segundo a pasta, o defensor de Marcelly foi informado pela unidade que haveria horário disponível no dia 18 de dezembro, mas desistiu do pedido ao saber da data.
A SAP informou que a teleaudiência ocorre no sistema prisional desde 2020 e contabilizou, até julho deste ano, 2,7 milhões de atendimentos a presos em contato com advogados, com Defensoria Pública e com o Poder Judiciário para realizações de Audiências e Citações.
Resposta da Justiça
Na última quinta-feira (19), o juiz da Vara do Júri, das Execuções Criminais e da Infância e da Juventude da Comarca de Praia Grande, Felipe Esmanhoto Mateo, decidiu pela prorrogação do prazo de três dias para a defesa de Marcelly apresentar resposta à acusação.
"De forma excepcionalíssima, considerando a complexidade do caso e a proximidade do recesso forense, concedo derradeiro prazo de 3 dias para apresentação de resposta à acusação. [...] De modo que o prazo de 3 dias se mostra suficiente", acrescentou o juiz.
Felipe pontuou que haviam passado sete dias desde o pedido feito pelo advogado de Mario, que teve o prazo prorrogado em cinco por causa de uma conjuntivite. Além disso, a nova ampliação de tempo, assim como a anterior, passou a ser válida para os demais corréus.
Conforme apurado pelo g1, apesar da decisão do juiz constar nos autos do processo, ela ainda não foi publicada no Diário Oficial. Desta forma, a prorrogação do prazo de três dias ainda não está em vigor. Uma data final ainda não foi divulgada oficialmente.
A equipe de reportagem apurou também que existe a possibilidade da publicação ocorrer somente em 2025 por conta do recesso do Judiciário.
Últimas palavras
De acordo com as testemunhas, Igor declarou amor pela esposa, Rafaela Costa, minutos antes de ser morto a facadas no apartamento da irmã em Praia Grande. As últimas palavras constam em um inquérito da corporação e em uma denúncia do MP-SP.
"Vocês sabem o quanto eu amo aquela mulher, [o] quanto sou louco por ela", disse Igor, de acordo com uma testemunha. "Vocês tudo contra mim, tudo armando contra mim. Eu era o único que não sabia de nada".
Segundo a denúncia do MP-SP, Igor também demonstrou estar decepcionado com a irmã e o cunhado. "Do que adiantou eu fazer tudo? Eu me esforço tanto, eu fiz isso sempre por todos, seus traíras, p***", teria dito a vítima antes de ser morta a facadas.
Triângulo amoroso
O MP-SP concluiu que o trio premeditou o crime porque Igor era um "empecilho no triângulo amoroso" entre Rafaela, Marcelly e Mario Vitorino. Ao g1, a promotora Roberta afirmou ter considerado o caso como "chocante e violento".
A promotora disse que em nenhum momento os envolvidos tentaram salvar Igor ou minimizar o sofrimento dele. "Fizeram buscas de rota de fuga ou de quanto tempo demoraria para [o corpo] cheirar e chamar a atenção de alguém e eles terem tempo de fugir", complementou.
Vantagem financeira
De acordo com a denúncia recebida pela Justiça, a morte de Igor traria "vantagem financeira" aos acusados. Os advogados dos presos negaram a versão apresentada pelo MP-SP, que afirmou que Rafaela mantinha relacionamentos extraconjugais com Mário e Marcelly, estabelecendo uma relação íntima entre o trio sem o conhecimento do comerciante.
O Ministério Público citou quais seriam as vantagens financeiras aos denunciados. Segundo o órgão, Mário poderia assumir a liderança da loja de motos que tinha em sociedade com o cunhado, enquanto a viúva receberia herança. “Marcelly, que se relacionava com os dois beneficiários diretos, igualmente teria os benefícios financeiros”.
O MP considerou a ação do trio contra Igor um "plano mortal". O documento diz que eles planejaram o crime, sendo que Mário desferiu as facadas, a viúva atraiu o comerciante e, junto com Marcelly, incentivou Mário a matá-lo.
O órgão levou em conta essas informações para elaborar a denúncia por homicídio qualificado. “O crime foi cometido por motivo torpe, pois Mário, Rafaela e Marcelly consideraram Igor um empecilho para os relacionamentos íntimos e sexuais que os três denunciados mantinham entre eles.
Ainda segundo a denúncia, o assassinato também foi praticado mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, pois Igor estava desarmado e foi atacado por uma pessoa com quem tinha relacionamento próximo e de quem não esperava mal.
Sobre o crime
O crime aconteceu em 31 de agosto no apartamento da irmã de Igor, em Praia Grande. Dentro do imóvel estavam a vítima, Marcelly e Mário Vitorino. Rafaela chegou com Marcelly ao apartamento, mas o deixou 13 segundos antes do marido chegar com o suspeito pelo assassinato.
De acordo com os depoimentos do trio e dos advogados, a viúva Rafaela tinha um caso com Mário. Além disso, o advogado de Marcelly chegou a dizer que a cliente e Rafaela tiveram um envolvimento amoroso no local antes da chegada de Igor e Mario no apartamento.
Igor Peretto foi morto a facadas e teria ficado tetraplégico [sem movimento do pescoço para baixo] se tivesse sobrevivido. A informação consta em laudo necroscópico obtido pelo g1. Três pessoas próximas à vítima foram presas: Viúva, irmã e cunhado.
Quadrinhos
A reconstituição do caso foi registrada pela Polícia Civil em uma história em quadrinhos. De acordo com o laudo da perícia, obtido pelo g1, o cunhado e a irmã da vítima participaram da simulação e apresentaram versões contraditórias.
No documento, o perito criminal explicou que as ilustrações das versões "seguem um padrão similar aos de fotonovelas e de histórias em quadrinhos". O objetivo foi facilitar a compreensão das cenas apresentadas pelos investigados para uma minuciosa análise das versões.
Além das fotos capturadas durante a reconstituição, de acordo com o laudo, também foram utilizados elementos gráficos e textuais, comuns em histórias em quadrinhos. Entre eles: Quadros de legenda, balões de fala e onomatopeias [figura de linguagem que usa palavras para imitar sons].
Prisões
As mulheres se entregaram e foram presas em 6 de setembro, enquanto Mário foi detido após ser encontrado escondido na casa de um tio de Rafaela, em Torrinha (SP), no dia 15 do mesmo mês.
O trio havia sido preso temporariamente em setembro e, no início de outubro, a prisão temporária foi prorrogada. Na ocasião, a defesa de Rafaela chegou a entrar com pedido de habeas corpus, que foi negado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A Justiça de Praia Grande (SP) converteu as prisões do trio, de temporárias para preventivas, após a denúncia feita pelas promotoras Ana Maria Frigerio Molinari e Roberta Bená Perez Fernandez, do MP-SP.
O que se sabe sobre a cronologia do crime até o momento:
04:32:38 - Marcelly e Rafaela chegam de carro ao prédio de Marcelly;
05:40:17 - Rafaela vai embora do apartamento de Marcelly;
05:42:27 - Rafaela deixa o local com o carro;
05:42:40 - Mario e Igor chegam ao prédio de Marcelly;
05:44:40 - Mario e Igor saem do elevador em direção ao apartamento de Marcelly;
06:04:31 - Mario e Marcelly saem do apartamento pelas escadas e acessam o subsolo, logo após o homicídio;
06:05:03 - Mario e Marcelly saem pela rampa do subsolo e vão em direção ao carro dele;
06:05:25 - Mario e Marcelly partem de carro em direção ao apartamento dele;
06:11:29 - Mario e Marcelly chegam ao prédio dele;
06:16:44 - Mario e Marcelly deixam o prédio dele e fogem;
08:48:00 (aproximadamente) - Mario e Marcelly se encontram com Rafaela em um posto na Rodovia Governador Carvalho Pinto, no km 124, em Caçapava (SP), onde a viúva abandonou o carro e embarcou no carro do amante, onde já estava a irmã da vítima;
09:47:42 - Mario, Marcelly e Rafaela chegam em Campos de Jordão (SP), onde a irmã da vítima teria entrado em um carro por aplicativo e retornado para Praia Grande;
12:28:00 - Mario e Rafaela se hospedam em um motel em Pindamonhangaba (SP), onde permanecem até 15h37. No mesmo dia, abandonam o carro dele no Centro da cidade.
Últimas imagens de Igor
Vídeos mostram momentos antes e depois do assassinato de comerciante que descobriu traição
O g1 teve acesso às últimas imagens do comerciante com vida. Os vídeos mostram os três suspeitos e a vítima chegando ao apartamento onde ocorreu o crime. Primeiro, chegam Marcelly e Rafaela, mas a viúva deixa o apartamento antes de Mario aparecer com Igor (assista o vídeo acima).
Nas imagens, obtidas pelo g1, é possível ver Rafaela e Marcelly chegando de carro e subindo de elevador até o apartamento da irmã da vítima, por volta das 4h30. A esposa de Igor deixou o local sozinha, cerca de dez minutos depois, antes da chegada dos homens.
Igor e Mario também foram filmados chegando de carro ao prédio, às 5h42. A dupla subiu de elevador aproximadamente dois minutos depois. Na ocasião, o comerciante parecia questionar o cunhado antes de acessar o imóvel da irmã. Este é o último registro dele, feito pelas câmeras de monitoramento.
Mario e Marcelly são casados no papel, mas já não estavam mais juntos. O crime aconteceu no imóvel dela, onde foram filmados saindo às 6h04. O casal desceu pelas escadas, foi até o subsolo e deixou o prédio a pé pela garagem.
De lá, os dois foram de carro para o apartamento de Mário, que fica a poucos quilômetros de distância do local do assassinato. Eles chegam ao prédio às 6h11, ficaram aproximadamente cinco minutos e saíram segurando bolsas e outros objetos.
A Polícia Militar foi acionada pela síndica. Com a ajuda de um chaveiro, solicitado por ela, a porta foi aberta e os agentes notaram sinais de sangue no corredor. Eles encontraram o corpo de Igor caído em um quarto, próximo da janela.