É fácil ser enganado por "Os rejeitados". A reunião do diretor Alexander Payne ("Pequena grande vida") com o ator Paul Giamatti ("Billions") na superfície parece mais um filme independente com a cara do Oscar, cheio de falas sagazes, grandes atuações, personagens complexos e temas profundos.
A alma do primeiro encontro da dupla desde o excelente "Sideways: Entre umas e outras (2004), que estreou nesta quinta-feira (11) nos cinemas brasileiros, no entanto, é muito maior – e mais simples.
Ao final de suas pouco mais de duas horas de duração, "Os rejeitados" parece mesmo um abraço natalino quente, daqueles que esquentam o coração, com sua história pessoal e sem pressa de uma família improvisada e imperfeita.
Reflexo de seus protagonistas, é uma obra igualmente imperfeita. O que não impede que seja um dos melhores e mais bonitos filmes de Natal dos últimos anos.
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Chega ao país meio atrasado, é verdade, mas talvez a tempo de tocar aqueles que viveram um fim de ano solitário há pouco tempo.
Esta família muito ouriçada
O roteiro de David Hemingson, que estreia no cinema depois de uma longa carreira na TV, acompanha o fim de ano de um professor de história (Giamatti) ranzinza de internato, daqueles bem caricatos.
Obrigado a tomar conta dos poucos alunos que não voltaram para casa durante as férias de Natal, ele cria elos com um dos jovens (Dominic Sessa) e com a chefe da cafeteria da escola (Da'vine Joy Randolph).
A história em si não é revolucionária, mas, sob o famoso olhar sensível de Payne, vira arte. O cineasta repete a paciência mostrada em clássicos desconhecidos como "Nebraska" (2013) e "As confissões de Schmidt" (2002) para elevar momentos à primeira vista corriqueiros.
Em suas mãos, "Os rejeitados" é um festival de contradições agradáveis, da falação afetada intelectual ao silêncio longo embalado pela trilha sempre maravilhosa de Mark Orton, do clichê do protagonista e sua jornada à identificação do público com um personagem tão humano, da neve que cai nos Estados Unidos nessa época do ano e os corredores vazios do prédio ao calor dessa família improvisada entre rejeitados.
É possível questionar a escolha pela estética adotada pelo diretor, que reproduz o estilo e a linguagem do cinema dos anos 1970, mas ela se encaixa como uma luva ao jogo de espelhos que mascara a simplicidade e a verdadeira natureza do filme.
A luz do trio
Payne mais uma vez faz as escolhas certeiras para seu elenco – mesmo que muitas vezes não sejam as mais populares. De fato, acerta tanto que é difícil pensar em qualquer outro nome para interpretar o trio principal.
Giamatti junta o professor à sua longa lista de personagens amargos e turrões e é a escalação mais óbvia – mas não menos perfeita. A indicação ao Oscar é certa, por mais que suas chances não sejam das maiores, mesmo depois de ganhar o Globo de Ouro.
Já Randolph, atriz revelada na ótima (e injustamente cancelada) série de "Alta fidelidade", é favorita absoluta na categoria de atriz coadjuvante.
Sua interpretação é tão sutil e madura como uma merendeira que perdeu um filho alistado na Guerra do Vietnã que é até difícil entender tamanha empolgação das premiações com ela. Até lembrar que a americana tem só 37 anos.
Completando o tripé, Sessa merecia mais atenção. O jovem, descoberto por ser aluno de um dos colégios usados como cenário das gravações, carrega com o coração o centro emocional da trama. E o faz como um veterano.
Reunidos, os três mostram a dor da solidão avassaladora de alguns finais de ano e suas inúmeras facetas. Mas, juntos, não se contentam com a melancolia e provam que é possível encontrar luz em lugares poucos prováveis – mesmo que a história já tenha sido contada antes.