O ano de 2023, um dos piores para filmes inspirados em quadrinhos de super-heróis, se encerra com "Aquaman 2: O Reino Perdido", que estreia nos cinemas nesta quarta-feira (20). A sequência do sucesso de 2019 não é muito original (problema, aliás, também do primeiro filme), e tem algumas falhas aqui e ali, mas se revela bem melhor do que o esperado.
A nova aventura chega às telonas coberta por um mar de fofocas de bastidores, descaso de seu estúdio e uma desconfiança enorme do público, que já não se empolga mais com esse subgênero como antes.
Mesmo assim, não é uma bomba cinematográfica, como muitos chegaram a cogitar, e cumpre seu papel de entregar uma aventura divertida para o público em geral, além de encantar com os ótimos efeitos visuais.
Assista ao trailer de "Aquaman 2: O Reino Perdido"
Na nova trama, Arthur Curry (Jason Momoa) divide seu tempo com as obrigações que passou a ter como rei de Atlântida e seu combate a piratas e contrabandistas. O que ele mais gosta de fazer é cuidar de Arthur Jr, o filho que teve com Mera (Amber Heard).
Só que uma série de problemas climáticos, que podem prejudicar a vida na superfície, chama a atenção do herói, que descobre que quem está por trás disso é seu antigo inimigo, Arraia Negra (Yahya Abdul-Mateen II, de "Matrix Resurrections").
Disposto a vingar a morte do pai, o vilão toma posse de um artefato poderoso de um reino que havia sumido no mar. Para salvar seu povo, Arthur resgata seu irmão, Orn (Patrick Wilson, de "Invocação do Mal"), preso desde os acontecimentos do primeiro filme.
Fim de uma era
"Aquaman 2: O Reino Perdido" chega aos cinemas com uma inusitada situação: o filme marca o encerramento do DCEU, universo integrado (atual) de adaptações dos personagens da DC Comics.
A ideia era rivalizar com o Universo Cinematográfico da Marvel, mas uma série de escolhas erradas e produções decepcionantes fez com que o projeto fosse deixado de lado após a entrada de James Gunn como novo copresidente do DC Studios, que decidiu recomeçar tudo do zero.
Assim, fica perceptível que "Aquaman 2" foi formatado para que tivesse um começo, meio e fim sem se conectar com absolutamente nada do que veio antes (a não ser a primeira parte de 2019) e nem do que poderia vir depois. Isso pode causar uma certa decepção, especialmente para quem gosta de ver histórias interligadas como as do outro estúdio.
Ao mesmo tempo, também dá um certo alívio para o filme, que tem independência para focar apenas em si mesmo. Nem mesmo a cena pós-créditos foge dessa regra. Fica até mais fácil para o espectador se interessar e se divertir com o longa, graças ao seu descompromisso.
Faltou apenas a "Aquaman 2" um pouco mais de personalidade, já que ele, assim como o recente "Besouro Azul", não tem vergonha de copiar na cara dura coisas que outros filmes de heróis já tinham feito antes, como "Pantera Negra" ou mesmo "Homem de Ferro". Quem vê muitos filmes do subgênero vai perceber as semelhanças facilmente.
Um dos pontos positivos do filme está na boa direção de James Wan (de "Jogos Mortais", 2004), que realiza incríveis sequências de ação com inúmeros e complexos efeitos visuais e desenvolve e expande o universo aquático do herói com criaturas e veículos realmente incríveis.
O diretor de "Invocação do Mal" também acerta no tom nas sequências mais dramáticas, especialmente uma que ocorre quase no final do longa.
Deu água na graça
Wan só não acerta muito bem na hora de fazer comédia, especialmente nas cenas envolvendo a dinâmica entre os irmão. Embora Momoa e Wilson estejam bem em seus papéis, tantos os atores quanto o diretor são sabotados pelas fracas piadas do roteiro, escrito por David Leslie Johnson-McGoldrick ("Aquaman").
O filme também sofre com alguns momentos que se arrastam e que podem causar desinteresse do público. Talvez se a trama fosse um pouco mais dinâmica, como foi a do primeiro longa, isso não tivesse ocorrido.
Além disso, embora as coreografias das lutas também estejam muito boas, Wan peca em repetir o recurso de salvamento no último segundo. Isso faz com o que o público não tema pelo destino de seus personagens, já que sabe que o perigo será contornado da mesma maneira, sem surpresas.
Performances aquáticas
Outro fato curioso está na participação de Heard. Por mais que não fale tanto ou tenha a mesma importância dos colegas, a presença da atriz no filme é bem maior do que foi especulado por causa da conturbada briga nos tribunais entre ela e o ex-marido, Johnny Depp, que levou anos e se encerrou em 2022.
Um dos grandes responsáveis por tornar o Rei de Atlântida relevante para as novas gerações, Momoa ainda se vale de seu enorme carisma para mostrar que é o Aquaman definitivo, mesmo quando o material que lhe deram não ajuda muito.
O ator, que também se destacou em 2023 como o vilão alucinado de "Velozes e Furiosos 10", tem uma ótima química com seus companheiros de cena, em especial Patrick Wilson, que passa bem a ambiguidade de Orn, já que seu personagem não se mostra confiável.
Já Yahya Abdul-Mateen II não sai muito do clichê vilão vingativo para compor o Arraia Negra. Ele é funcional e apenas isso e tem pouco espaço para se mostrar ameaçador de verdade. Isso ocorre apenas em uma cena, mas o mérito maior é mais da direção de Wan do que propriamente da performance do ator.
No final das contas, fica a dúvida do que levou a Warner Bros a apostar mais no decepcionante "The Flash" do que em "Aquaman 2: O Reino Perdido", um filme muito melhor acabado e com uma direção mais eficiente. A aventura, aliás, também supera o simpático "Besouro Azul" e é um bom espetáculo visual para ver na tela grande.
Embora as chances sejam remotas, não seria possível imaginar que o herói vivido por Momoa seja reaproveitado por Gunn caso faça tanto sucesso quanto no filme original. Se isso não acontecer, "Aquaman 2" encerra esse capítulo da DC no cinema como um filme inofensivo, porém divertido com o Rei de Atlântida. O jeito vai ser mesmo aguardar como vai ser o recomeço de tudo.