Você já comeu bicho-do-coco? Conheça a experiência de degustar insetos amazônicos em roteiro de ecoturismo no Marajó

Repórter do g1 Pará conta a experiência em fazenda de economia sustentável que convida turistas a conhecer sabores exóticos de larvas e extrai do inseto matéria-prima para produção de cosméticos e remédios.

Por Denilson d'Almeida, g1 Pará — Belém-PA


Bicho-do-coco é atrativo em roteiro de ecoturismo no Marajó.

Quem visita a propriedade Curuanã, localizada na comunidade Jubim, o município de Salvaterra, no Arquipélago do Marajó, é convidado a degustar o bicho-do-coco, que é uma espécie de larva encontrada no caroço de tucumã e dele se extrai um óleo que é usado como anti-inflamatório, antioxidante e cicatrizante.

Este inseto amazônico é o protagonista do modelo de negócio sustentável que uma família extrativista implantou na fazenda. Além de nutritivo, ele serve de matéria-prima para a produção de óleos com propriedades terapêuticas (fármacos) e cosméticos que são comercializados no estado do Pará.

A equipe do g1 embarcou nessa aventura e saiu de Belém rumo ao Arquipélago do Marajó, região de inúmeros contrastes sociais para conhecer um pouco mais sobre este inseto amazônico.

Esta empreitada rende experiências e um mergulho desafiador na sabedoria popular do caboclo marajoara, que conhece as propriedades farmacêuticas de folhas, caules, raízes, frutos e sementes das espécies da região.

Anti-inflamatório natural, óleo extraído do bicho-do-coco é usado na produção de remédios e cosméticos. — Foto: Reprodução/Redes Sociais

A viagem de balsa, saindo do distrito de Icoaraci, na capital, em direção ao porto na foz do Rio Camará, em Salvaterra demora menos de três horas. Ao desembarcar, o percurso até a Fazenda Curuanã leva cerca de meia hora, seguindo de carro.

Quem chega é direcionado a um barracão de palha, cercado por árvores frutíferas e de espécies oleaginosas. No centro, uma mesa farta com frutas, sucos, café, geleias, pães caseiros, bolo, cuscuz, tapioca, queijo de búfala (queijo do Marajó) e linguiça marajoara.

Numa segunda mesa, uma amostra de tudo o que produzido na fazenda: sabonetes e óleos naturais, geleias e polpa de frutas.

94% da produção da fazenda é feita com a extração e manejo de espécies frutíferas e oleaginosas — Foto: Denilson d'Almeida

Degustação

Durante a apresentação dos produtos, ocorre a degustação do bicho-do-coco, que pode ser feita tanto in natura, ou seja, com ele tirado na hora ou com ele frito com farofa. O sabor da larva lembra a polpa de coco. O repórter do g1 Pará, Denilson d'Almeida, encarou a aventura. (Assista ao vídeo abaixo)

Repórter Denilson d'Almeida faz degustação de bicho-do-coco no Marajó

Além do 'óleo de bicho', no local também são produzidos óleos de andiroba, copaíba e outros medicamentos naturais feitos a partir de sementes, raízes, cascas de árvores e folhas de espécies encontradas nos 200 hectares da fazenda - uma área equivalente a 200 campos de futebol.

O processo é artesanal e conta ainda com uma produção de sabonetes que auxiliam no tratamento de doenças de pele e também combatem cravos e espinhas.

A partir de frutas encontradas na propriedade são produzidos licores, geleias e trufas. Com destaque para o cupuaçu, tamarindo, jenipapo, bacuri, abacaxi, taperebá, coco e tucumã – este já citado anteriormente.

A fazenda pertence à família de Marcio Bastos há três gerações. Atualmente, foi aberta para o turismo, por meio de visitas agendadas, como estratégia para divulgar o modelo econômico sustentável que vem sendo desenvolvido por ele e pela esposa.

Sustentabilidade

O avô e o pai de Marcio trabalhavam com búfalos e cavalos marajoaras. Para esta atividade era preciso desmatar áreas de floresta como forma de preparar o pasto para os animais. Com isto, parte da vegetação nativa foi perdida.

“Com a morte do meu pai eu assumi a gestão da fazenda e decidi que iria trabalhar para viver do que a terra nos dava, sem que eu precisasse desmatar ou queimar a floresta”, disse.

O modelo de negócios da família é baseado no que eles denominam de ‘tripé da sustentabilidade marajoara’, no qual se leva em consideração os aspectos socioculturais, a preservação ambiental e a economia familiar de subsistência.

“Na base sociocultural a gente faz um resgate, manutenção e difusão da cultura marajoara. Estamos falando sobre as propriedades medicinais das folhas, sementes, raízes, plantas e frutos que nos foram repassadas de geração a geração”, explica Marcio.

Hoje, 94% da produção deles é feita com o que colhem e plantam na fazenda. O cuidado requer apenas o manejo adequado de cada espécie.

Inclusive, a família recupera áreas degradadas plantando espécies oleaginosas e frutíferas. Isto garante que a floresta dentro da fazenda continue de pé e fornecendo tudo o que a família precisa para obter uma economia sustentável.

Extrativismo sustentável produz fármacos e cosméticos naturais no Marajó

Na divisão de tarefas nesse modelo de negócios, a esposa de Márcio, Sheila Barros, e os filhos, Maryane Bastos e Márcio Júnior, assumiram a responsabilidade de se aproximar e buscar novas técnicas para melhorar a atividade extrativista.

Os três fizeram cursos na Escola de Ensino Técnico do Estado do Pará (Eetepa) e Sheila, atualmente, cursa Tecnologia de Alimentos na Universidade do Estado do Pará (Uepa).

Família implantou um modelo econômico sustentável que depende apenas do que a terra oferece. — Foto: Denilson d'Almeida

Eles sabiam que para empreender precisavam primeiro aprender mais sobre o novo modelo de negócios a fim de traçar um planejo de manejo sobre as espécies.

“O extrativismo sustentável está perdendo espaço para as grandes indústrias de cosméticos. Têm empresas que procuram pessoas, aqui, da região do Marajó, para adquirir óleo de tucumã, mas não se contentam apenas com o óleo que a gente consegue com as sementes e frutos caídos no chão. Querem que a gente corte a árvore para extrair o máximo possível de óleo e não podemos fazer isso. Ao cortar uma árvore, levará anos para outra crescer e dar frutos”, denuncia Sheila.

A atividade deles reaproveita até as folhas de palmeiras e as cascas de coco que passam a ser utilizadas na confecção das embalagens dos produtos. Tudo feito de forma artesanal.

A produção de licor e de geleias depende da safra de cada fruto.

Licor produzido na fazenda é vendido para todo o Brasil. — Foto: Denilson d'Almeida

Atualmente, a comercialização destes produtos é feita na própria fazenda e também em eventos e feiras sobre turismo e sustentabilidade que a família participa pelo Brasil.

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