Por Aline Midlej

Aline Midlej é apresentadora do Jornal das Dez, na GloboNews

Quero a verdade (e o abraço) de Luna Reys


— Foto: REUTERS/Jon Nazca

O que dizia o menino refugiado que embarcou numa garrafa pet rumo a uma nova oportunidade de vida pelo Mar Mediterrâneo, quando foi pego pelos soldados?

A viagem interrompida pela polícia espanhola comoveu o mundo essa semana porque havia verdade. Chorando em desespero, ele ainda tentou pular um muro em frente à praia. Tudo sendo registrado pelas equipes de TV em frente ao suplício de milhares de imigrantes que tentam chegar a Ceuta, território autônomo pertencente à Espanha no norte do continente africano.

A verdade constrói dramas transponíveis a qualquer barreira de idioma, avassaladores para o nosso conforto mundano.

Naquele mesmo cenário, a cena mais solidária mobilizou as redes sociais, de novo. A imagem de Luna Reys abraçando o imigrante africano, agonizando depois da tragédia, não podia ser mais verdadeira. E doeu na gente.

A voluntária da Cruz Vermelha, de apenas 20 anos, foi ovacionada (e também perseguida) pela atitude espontânea de acolhimento. De um lado, #GraciasLuna; de outro, mensagens racistas, que jamais ocuparão as páginas deste blog.

"Ele estava chorando. Eu estendi minha mão e ele me abraçou", ela disse numa entrevista na TV. Quem compreende esse ódio? Só consigo pensar num tipo de sentimento que só os maiores mentirosos são capazes, aqueles que mentem pra sua própria humanidade.

“Quem joga seus filhos ao mar aberto?", indagou a correspondente Cecilia Malan, durante nossa conversa, na GloboNews, sobre essa nova crise migratória. Só quem tenta fugir do pior dos mundos, concluímos juntas.

Famílias que sucumbem a fome, a guerras e perseguições, muitas vezes, só têm a possibilidade de enviar seus filhos numa viagem de riscos improvisados. Na terça-feira um bebê foi resgatado no mar onde a guarda civil de Ceuta já deteve mais de 8.000 pessoas.

Todos tentavam entrar, vindos principalmente do Marrocos. A maioria é deportada, e tem aqueles que ficaram pelo caminho. Há pessoas perdendo a vida tentando buscar uma realidade melhor, atrás de uma outra verdade possível.

Aqui no Brasil, o conceito de mentira ganhou novos significados em mais uma semana de depoimentos na CPI da Covid, enquanto vidas continuam sendo colocadas em riscos evitáveis.

Falta uma bússola comum, guiada pela verdade luminosa da ciência, da empatia. Voltamos a registrar mais de 2.000 óbitos por dia, enquanto o vírus continua se espalhando entre hipocrisias, sempre mentirosas.

Quero a verdade de Luna Reys. Um pouco dela vive em mim, na Cecilia Malan e, espero, que em você também.

P.S: Saio de férias e volto em duas semanas. Se cuidem!