Daniel Ortega conquista 4º mandato consecutivo na Nicarágua; país é um Estado policial, diz CIDH

Daniel Ortega mandou prender sete concorrentes de verdade e só enfrentou candidatos desconhecidos nas urnas. Ele teve 75% dos votos.

Por g1


Daniel Ortega é declarado vencedor das eleições na Nicarágua

O presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, confirmou nesta segunda-feira (8) o quarto mandato consecutivo, ao receber 75% dos votos.

As eleições não tiveram uma real concorrência: 7 pré-candidatos da oposição foram detidos para que não pudessem concorrer.

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Motociclista passa diante de mural com o rosto de Daniel Ortega, presidente da Nicarágua (à esquerda), e do revolucionário César Augusto Sandino, durante as eleições gerais deste domingo (7), em Manágua — Foto: Andrés Nunes/AP Photo

Após a apuração de metade das urnas, a presidente do Conselho Supremo Eleitoral (CSE), Brenda Rocha, anunciou que o candidato liberal Walter Espinoza (apontado como colaborador do governo) aparece em segundo lugar, com 14,4% dos votos.

Mulher de Ortega é a vice-presidente

Depois de chegar ao poder pelas urnas em 2007, Ortega, que completará 76 anos na quinta-feira (11), terá outros cinco anos como presidente, no comando da Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) e ao lado de sua esposa, Rosario Murillo (70). Ela foi candidata à vice-presidência pela segunda vez.

Homem passa por um outdoor de propaganda do presidente da Nicarágua, Daniel Ortega, no início da campanha para as eleições presidenciais, em Manágua, em setembro — Foto: Reuters/Maynor Valenzuela

Oretga é um ex-guerrilheiro de um movimento de esquerda dos anos 1970 conhecido como sandinista. Ele também governou o país nos anos 1980, depois que a FSLN derrubou em 1979 o ditador Anastasio Somoza.

Além de Ortega, havia cinco outros candidatos que concorreram, mas eram desconhecidos classificados como colaboradores do governo.

Acusação de ditadura

Com 14 anos de poder, Ortega é acusado pelos críticos de nepotismo e de instaurar uma ditadura. O ex-guerrilheiro alega que seu governo é do povo e defende a soberania do país dos "ataques" dos Estados Unidos.

O presidente americano, Joe Biden, chamou as eleições deste país da América Central de farsa.

Com bandeiras da FSLN, simpatizantes de Ortega festejaram durante a madrugada, antes mesmo do anúncio dos resultados, no centro de Manágua, a capital do país.

Motoqueiro passa em frente a cartaz com Daniel Ortega em Manágua, em 2 de novembro de 2021 — Foto: Oswaldo Rivas / AFP

No total, 4,4 milhões de eleitores estavam registrados para votar, e o CSE calculou em 65% a taxa de participação. O observatório independente Urnas Abertas afirmou, no entanto, que a abstenção alcançou 81,5%, de acordo com uma verificação própria, não autorizada.

Os opositores, a maioria no exílio, ou presa, defenderam a abstenção.

Eleições para o Executivo

As eleições também definiram os 90 deputados do Congresso, que, assim como todos os poderes do Estado está sob controle do governo. A Urnas Abertas afirmou que a votação foi marcada pela "abstenção", pelo "controle paramilitar" e pelo "assédio a funcionários públicos" para forçá-los a votar.

À medida que reformas eleitorais foram adotadas durante seu governo e o cerco se fechou à oposição, Ortega aumentou o percentual de suas vitórias. Em 2006, venceu com 38%; em 2011, com 63%; e, em 2016, com 72%.

Mais de 100 mil exilados

As eleições aconteceram três anos e meio após os protestos de 2018 que exigiram a renúncia de Ortega. A repressão deixou pelo menos 328 mortos e mais de 100 mil exilados, o que provocou uma grande crise no país de 6,5 milhões de habitantes da América Central.

Em uma ofensiva contra a oposição iniciada em junho, três partidos foram considerados ilegais, e 39 ativistas sociais políticos, empresários e jornalistas - incluindo sete aspirantes à presidência -, detidos. Desde 2018, 120 opositores foram presos.

"Como o regime perdeu boa parte de sua base social e, portanto, também de poder real, recorre a uma repressão crescente para tentar anular o processo de implosão em andamento", analisou o sociólogo Oscar René Vargas.

Depois de votar no domingo, Ortega chamou os opositores de "terroristas" e "demônios". Também disse que "conspiraram contra a paz" do país.

De acordo com leis aprovadas em 2020, os detidos foram acusados de atentar contra a soberania, de promover sanções internacionais, "traição à pátria", ou "lavagem de dinheiro", como é o caso da principal aspirante da oposição à presidência, Cristiana Chamorro. Filha da ex-presidente Violeta Barrios (1990-1997), ela se encontra em prisão domiciliar.

CIDH: Nicarágua é um Estado policial

O processo de concentração de poder e enfraquecimento da democracia na Nicarágua foi paulatino, e o país é hoje um Estado policial no qual o governo instalou um regime de supressão de todas as liberdades por meio do controle e vigilância dos cidadãos e da repressão, segundo a presidente da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), Antonia Urrejola.

“Todos os poderes estão alinhados e dirigidos pelo Executivo e, portanto, não representam limites ao exercício do poder nem impedem arbitrariedades; pelo contrário, eles os facilitam ou consolidam”, afirma Urrejola, em entrevista ao g1.

Para a CIDH, uma democracia precisa ter essa separação de poderes e que as diferentes funções de um Estado precisam ser exercidas por diferentes órgãos.

A Nicarágua realizou eleições no domingo (7), mas o atual presidente, Daniel Ortega, impediu praticamente todos os seus concorrentes de fato de participar das eleições (eles foram presos ou impedidos de concorrer).

“A CIDH constatou nos últimos meses a intensificação das repressões por meio de um conjunto de ações, entre elas a detenção arbitrária e a criminalização de mais de 30 pessoas por acusações infundadas e sem as devidas garantias judiciais —incluindo 7 pré-candidatos à presidência que ainda estão privados de liberdade”, segundo Urrejola.

Antonia Urrejola em imagem sem data no site da CIDH — Foto: Reprodução/CIDH

Durante este ano, a CIDH emitiu 32 medidas cautelares para pessoas pessoas da oposição ou líderes de movimentos sociais ou jornalistas ou pré-candidatos.

A entidade afirma que já pelo menos 145 pessoas privadas de liberdade por terem se manifestado. A crise de direitos humanos começou no país em 2018, de acordo com a CIDH.

Antes das eleições houve uma intensificação da repressão, com mais prisões arbitrárias. Três partidos foram banidos e há perseguição a entidades de direitos humanos e organizações civis.

“Com essas ações, o governo busca se perpetuar no poder mediante a realização de eleições que não dão garantias mínimas de liberdade, acesso a informação, transparência e pluralidade em um contexto em que todos os espaços democráticos se fecham e há impunidade estrutural”, afirma Urrejola.

Além disso, houve uma série de reformas eleitorais que, em conjunto, restringem a democracia.

O que tem acontecido na prática

A CIDH lista algumas das ações na prática do regime de Ortega:

  • Uso arbitrário de força letal e não letal que resultou em violações dos direitos à vida e à integridade pessoal;
  • Execuções extrajudiciais;
  • Detenções arbitrárias;
  • Invasões e ameaças de retaliações.;
  • Maus tratos;
  • Criminalização de pessoas que exercem o que deveriam ser direitos democráticos, por meio de centenas de processos judiciais sob acusações infundadas e desproporcionais, como terrorismo ou crime organizado;
  • Irregularidades nas garantias judiciais e no acesso à justiça

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