Um jovem universitário é acusado de fazer provas do Enem no lugar de outras pessoas
Um jovem de 23 anos, estudante de medicina, foi alvo de uma operação da Polícia Federal. Ele é suspeito de aplicar uma fraude no Enem. De acordo com as investigações, André Rodrigues Ataíde usava documentos falsos para fazer provas no lugar de outras pessoas.
Com esse esquema, pelo menos dois candidatos teriam conseguido vaga no curso de Medicina de uma universidade pública no Pará - a UEPA. A investigação traz um alerta sobre uma possível fragilidade do modelo atual de aplicação da prova, que é o mesmo em todo país. Veja no vídeo acima.
As denúncias
A Polícia Federal recebeu duas denúncias anônimas, as investigações começaram e culminaram na operação realizada na última sexta-feira (16).
Moisés Oliveira Assunção tem 25 anos e, segundo as investigações, quem fez o Enem no lugar dele, usando identidade falsa, foi André Rodrigues Ataíde, de 23 anos.
Com a fraude, o candidato entrou em medicina, no campus de Marabá da Universidade do Estado do Pará, a UEPA, mesmo sem escrever uma palavra sequer na redação.
“Há informações de que teria recebido algo em torno de R$ 150 mil. Isso teria sido feito em parcelas, né?", diz o delegado Ezequias Martins, da Polícia Federal.
A descoberta da fraude
Às 15h26 do dia 5 de novembro de 2023, um rapaz que se inscreveu pra fazer o exame troca mensagens com a então namorada: "Eu peço o e-mail do cara pra mandar um negócio importante. O e-mail dele". Nesse horário, ele deveria estar sem celular, incomunicável e concentrado na prova.
Domingo seguinte, 12 de novembro, o segundo e último dia do Enem 2023. E mais uma vez, o candidato manda mensagens para a namorada bem no horário do exame.
Para a polícia, não há dúvidas: ele não estava na sala de provas, ele não fez o Enem.
A fraude foi descoberta após duas denúncias anônimas: as assinaturas foram analisadas e os peritos também compararam os padrões de caligrafia e atestaram que não foi Moisés quem escreveu a redação, e sim André.
No dia 12 de novembro de 2023, às 18h44, logo depois do fim das provas, André postou cinco estrelinhas, e escreveu, na sequência: "tava easy demais". Para a Polícia Federal, as cinco estrelinhas significam Enem.
A um amigo, Moisés contou o que ele e André fizeram com a identidade falsa.
“A gente pegou e rasgou no meio. A gente não tem foto. Ninguém tirou foto. Tá ligado? Eu não tirei foto dessa identidade. Eu, fazendo a matrícula pode esquecer. Não vou ligar para os comentários, não”, diz.
O histórico fraudulento de André
André está no quinto ano de Medicina na UEPA - a mesma onde Moisés passou de forma fraudulenta, segundo a Polícia Federal.
André sempre tirou boas notas, tanto no Enem quanto na universidade. Mas há provas de que essa inteligência toda foi usada para o crime, pelo menos em mais outro caso.
Segundo as investigações, no Enem de 2022, André fez as provas no lugar de Eliesio Bastos Ataíde, de 25 anos, também usando identidade falsa. A Polícia Federal diz que André falsificou a assinatura de Eliesio e fez a redação se passando por ele.
Eliesio foi aprovado na faculdade de medicina da UEPA e fez o curso normalmente no ano passado. Como moisés entrou este ano, as aulas dele e de todos os outros alunos começam no dia 4 de março.
O que aconteceu com os envolvidos
Quanto aos três acusados de fraudar o Enem, eles vão responder em liberdade por falsidade ideológica e uso de documento falso.
Contra André, o jovem que segundo a Polícia Federal fazia as provas no lugar dos outros, novas denúncias surgiram.
“Estamos apurando também se ele também teria realizado outras provas de Enem, outras provas de concursos também, outros vestibulares”, acrescenta o delegado.
Segundo os advogados de defesa, os acusados são amigos.
“Nós provaremos que André e Eliesio são alunos de medicina e são inocentes. Não existe recebimento pelo André de nenhuma quantia para fazer a prova em nome de terceiros”, diz Diego Freites, advogado de André e Eliesio.
“Quem fez a prova foi o próprio Moisés. Ele está inteiramente interessado em apoiar e cooperar com a policia e com a Justiça Federal para que esse assunto seja o mais rápido possível solucionado”, relata Jordano Matias, advogado de Moisés.
O que diz a universidade e o INEP
Em nota, a Universidade do Estado do Pará disse que "acompanha e colabora com as investigações conduzidas pela Polícia Federal e aguarda a conclusão do processo para tomar as medidas cabíveis."
“Ninguém esperava que algo tão grave acontecesse perto da gente,”, relata Lucas Amorim, vice-presidente do Centro Acadêmico da Faculdade de Medicina/ UEPA.
“O Enem ele tem 25 anos de história. Ele tem 15 anos em que ele é utilizado como a principal prova de seleção para ingresso no ensino superior público e privado no Brasil. E nunca foi identificado nada nessa natureza. Então a gente acredita se tratar de um caso isolado”, relata Ricardo Magalhães, diretor de gestão e planejamento do INEP.
O caso poderia ser evitado?
Segundo o delegado Ezequias Martins, “a digital é um sistema verificável, é um sistema seguro. A gente consegue realmente aferir com mais facilidade se aquela pessoa realmente é a que fez a prova".
Já o INEP diz que a "identificação biométrica, a princípio, a gente não enxerga como um meio que garantiria isso. Mas se a gente, junto com Polícia Federal, entender que vai ser importante, que vai dar mais segurança, certamente nós vamos tomar as medidas cabíveis para estudar tecnicamente a proposta. A sociedade brasileira pode ficar tranquila, que o Enem é uma política pública segura, mas nem por isso a gente vai se furtar de aperfeiçoá-lo, se for o caso".
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