O mercado dos carros usados continua acelerado, mesmo com o aumento do preço dos veículos nos últimos anos: foram 6,4 milhões de carros usados vendidos até agosto deste ano. Os dados são Federação Nacional das Associações dos Revendedores de Veículos Automotores (Fenauto).
É um mercado mais de cinco vezes maior que o de carros zero km, que emplacou 1,19 milhão de modelos novos no mesmo período. O grande atrativo dos usados é o desconto de preço, mas o comprador precisa ter atenção ao fazer sua avaliação para pagar o preço justo pelo veículo.
O g1 reuniu as principais dicas para fechar a compra de um carro usado com mais segurança, dos itens básicos a se observar aos pontos mais complexos, como checar a documentação e identificar o desgaste das peças.
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Saiba o histórico do carro
A lataria amassada, um vidro quebrado ou o estofamento furado podem ser resolvidos facilmente com peças novas. Solucionar um problema de documentação pode não ser tão simples.
A primeira atitude do comprador em potencial deve ser uma pesquisa de informações do veículo por meio do número do Registro Nacional de Veículos Automotores (Renavam).
Com ele, você consegue:
- Consultar dados básicos do veículo, como placa, marca e fabricante, modelo, ano de fabricação, cor original, e número do chassi;
- Listar quantos donos o veículo já teve e quando as transferências aconteceram;
- Consultar situação atual e histórico de multas, licenciamento, além do pagamento do IPVA e o seguro obrigatório do SPVAT (antigo DPVAT);
- Lista de acidentes graves e também se foi acionado o sinistro do seguro;
- Buscar se o carro consta como roubado ou furtado nos sistemas de segurança pública;
- Avaliar se o carro foi penhorado.
Nem todas as informações são abertas ao público, mas dois especialistas ouvidos pelo g1 são categóricos quando apontam a importância de emitir um laudo cautelar com ajuda de empresa do ramo.
Para Alexandre Dias, mecânico e proprietário das oficinas Guia Norte, e Tenório Júnior, técnico e professor de mecânica automotiva, ter acesso a esta informação é uma forma muito eficiente para evitar golpes e surpresas desagradáveis de difícil solução.
Confira a quilometragem
Já com o carro por perto, você precisa começar a buscar detalhes importantes. Um dos mais fáceis de ver é a quilometragem, exibida no odômetro do painel de instrumentos.
Em média, o brasileiro percorre 15 mil km por ano com um carro. Você precisa multiplicar esta quantidade para a idade do carro. Assim, um carro de 2020 com rodagem média deve estar na casa dos 60 mil km no odômetro.
Obviamente, carros de locadora, de taxistas ou motoristas de app vão ter médias bem mais altas. Cabe ao comprador decidir se o custo-benefício vale a pena.
Por outro lado, números muito abaixo do esperado sem uma explicação condizente devem levantar suspeitas. Tenório Júnior afirma que encontra odômetros modificados com alguma frequência em sua oficina.
Nesse caso, é importante se atentar a outras partes do carro que demonstrem a sua idade, como:
- Estado do freio traseiro: veículos com mais quilômetros rodados devem apresentar mais desgaste de pastilhas, disco ou tambor;
- Lanternas: quanto mais tempo tem o carro, mais desbotada e menos brilhante são suas lanternas. Uma troca pode ter sido realizada por zelo do atual dono, mas também para mascarar maior quilometragem ou até um acidente;
- Alavanca de câmbio, manopla de freio e volante: itens com maior manuseio precisam demonstrar algum sinal de desgaste, como brilho irregular;
- Pedais do acelerador e freio: estes itens sofrem a mesma regra e precisam demonstrar sinais de desgaste, como desbotamento, borracha irregular ou perda de brilho;
- Tapete do motorista: ele é o mais utilizado e em carros com poucos quilômetros, este item não pode apresentar sinais de desgaste idêntico aos outros tapetes dos passageiros — um carro sempre anda com motorista, mas pode circular sem passageiros.
Atenção ao motor e câmbio
Há pontos do motor que precisam ser bem verificados, em busca de sinais de anormalidade. Além do visual de desgaste do conjunto, como preças apresentando corrosão ou falta de brilho esperado para o metal e plástico.
É importante também ficar atento a vazamentos de óleo, que podem ser notados com o carro estacionado.
“Recentemente avaliei um Nissan Kicks de 2022, com 40 mil km e ele apresentava um vazamento de óleo entre o motor e o câmbio. Em um carro com apenas dois anos, este vazamento é inadmissível. Se fosse um veículo com 15 anos, seria compreensível”, comenta Tenório Júnior.
Tenório explica que uma situação como essa demanda a remoção do câmbio apenas para entender a extensão do vazamento. O custo de reparo já sobe consideravelmente, e a venda demora mais para ser realizada até que a questão seja resolvida.
Alexandre Dias, do Guia Norte, comenta que alguns modelos utilizam correia banhada a óleo. Sem o devido cuidado, como uso do tipo de óleo incorreto para o modelo de carro, problemas podem aparecer pouco tempo depois da compra do usado. Um dos mais comuns é o desgaste prematuro e outro está na perda da elasticidade da borracha, criando fissuras capazes de romper o item.
“Um óleo vencido ou errado para o carro específico, ele não só pode estragar motor, como estraga componentes como a correia”.
Não é fácil entender se o óleo está correto, mas é possível conferir a viscosidade dele com a vareta do próprio motor. Quanto mais espesso, mais problema ele pode gerar ao não lubrificar corretamente todas as peças. Neste caso, os pistões serão danificados, aumentando o consumo de combustível, produção de ruído e reduzindo a eficiência de todo o conjunto motriz.
O câmbio também precisa ser avaliado. Em carros manuais, a embreagem não pode fazer o veículo andar somente perto do fim do curso do pedal, enquanto as trocas de marchas precisam ser suaves e sem trancos.
Problemas neste ponto não impedem a venda, mas fazem o valor do carro diminuir — já que o comprador está ciente de que precisará gastar dinheiro para corrigir os defeitos. Supondo que o carro custe R$ 60 mil e o reparo no câmbio consuma R$ 6 mil, você precisa negociar o veículo por ao menos R$ 54 mil.
Nos automáticos, as trocas entre as letras P, R, N e D também precisam ser suaves e sem trancos. Tenório aponta que manutenção neste tipo de transmissão pode facilmente ultrapassar os R$ 10 mil.
Suspensão e pneus podem indicar quilometragem alterada
As molas de suspensão são um bom indicativo de idade de um veículo. Carros mais novos são mais altos porque as molas seguraram o peso do veículo por menos tempo. Então, se um vendedor tentar reduzir a idade de um veículo com molas mais gastas, é possível que seja uma cilada
“Os amortecedores são os itens que mais trabalham em um carro. Um carro com cinco anos de uso não vai ter a mesma altura de um veículo com um ano”, comenta Alexandre Dias.
Os pneus também precisam ser observados com atenção. Apesar de serem itens de manutenção básica, eles podem servir para mascarar um carro que tenta se passar por mais jovem.
Vale ficar atento à informação do chamado de DOT (sigla em inglês para Department of Transportation), uma numeração de 13 dígitos padronizada de uma legislação dos EUA para regulamentar as especificações dos pneus.
“No DOT você pega a semana e o ano que o pneu foi fabricado nos quatro últimos dígitos. Um pneu 2022 significa fabricação na 20ª semana (maio) de 2022. Um carro de 2017 com esta informação mostra a substituição do pneu”, comenta Alexandre Dias.
Não é digno de desespero, afinal um pneu pode ter sido trocado por uma colisão ou por furo rotineiros. Mas juntando essa informação com outras evidências é possível checar se o atual dono tentou dar uma "renovada" em um veículo antigo.
Sistema elétrico e airbag
Antes de começar a olhar vidros, travas e som, o painel de instrumentos é a primeira parte a ser observada.
Tome nota das luzes de:
- Injeção eletrônica;
- ABS;
- Controle de estabilidade;
- Óleo.
Tenório Junior aponta se uma ou mais destas luzes continuarem acesas após a ignição, a solução pode demandar manutenção, e isso impacta diretamente no valor proposto para a venda do carro usado.
“Em uma semana, um cara pediu avaliação para um carro da Volkswagen. A luz do óleo não acendia. Desliguei a ignição e liguei novamente, nada. Descobri então a remoção desta luz”, conta Tenório Júnior.
“Se a pessoa faz isso para esconder um problema de óleo e continua rodando, o dano pode causar a retífica do motor, custando mais de R$ 10 mil e um tempo longo do carro na oficina.”
Outro detalhe importante é o airbag. Em caso de problemas, o reparo pode ser custoso. Ou pior: um acidente pode se tornar fatal.
“Tem muita gente que compra carro batido, com airbag estourado. O vendedor remove o airbag, fecha o painel e apaga a luz indicadora. Você só notará a falta em uma colisão, que pode ir desde um risco leve na pintura, até acabar com a sua vida”, comentou Alexandre Dias.
No mercado existem oficinas com scanners capazes de identificar anomalias no sistema elétrico inteiro, como a presença do kit do airbag e trocas feitas em outras partes. Para o restante, como vidros, travas, som e ar-condicionado, um simples teste no momento da visita ao carro já é suficiente para encontrar problemas.
Estado da pintura e da carroceria
“Observar as frestas entre as peças. A porta do motorista, fechada, precisa ter a mesma distância em todos os pontos. Qualquer mudança aqui pode ser facilmente notada e significa que a carroceria ou a porta estão desalinhadas”, comenta Tenório Júnior.
A distância entre o para-lama dianteiro e a porta, além do espaço entre a lataria e o capô do motor, também podem servir de teste para identificar carroceria com problemas.
Júnior também alerta para que o comprador preste atenção nas longarinas frontais e traseiras. Elas, quando tortas ou não uniformes, indicam que o carro passou por algum acidente e em alguns casos não é possível solucionar o problema.
Já na pintura, não é indicado avaliar o carro sob luz solar direta ou quando estiver molhado. Em ambientes com iluminação artificial, é possível notar ondulações no reflexo e elas podem indicar problemas.
Fechando o olhar superficial, estofamento e acabamento são pontos simples de notar desgaste normal ou exagerado para a idade do carro usado. Recentemente, o g1 preparou uma lista que mostra como identificar carros que passaram por enchentes, que traz reflexos importantes que devem ser observados no interior dos veículos.
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