Do céu ao inferno. Da lua ao "quartinho de empregada". A semana termina com os extremos do que podemos ser como mulheres. Se preparando para ser lançada ao espaço, e consciente da representação daquele momento, a astronauta Jessica Watkins foi direto no ponto: “quero que isso inspire, principalmente, outras meninas”.
Primeira mulher negra a estar em uma tripulação da Estação Espacial Internacional de lá, a astronauta de 33 anos pode chegar à lua no programa Artemis, alcançando mais um feito histórico. No Brasil, um dia depois, noticiamos a primeira trabalhadora doméstica da Bahia resgatada em condições análogas à escravidão durante uma fiscalização do Ministério do Trabalho. Madalena Silva foi um marco nas nossas consciências, pelo menos para quem tem alguma. Com sua verdade, se tornou um testemunho vivo e brutal dos efeitos mais profundos do racismo.
A justiça talvez tenha começado a ser feita quando Adriana Oliveira cruzou seu caminho. A repórter da TV Bahia tinha a missão de contar aquela história e foi surpreendida por uma situação tão inimaginável quanto perturbadora. Madalena não conseguia dar as mãos à jornalista, que era branca. Sentia uma quase repulsa de si mesma, tamanha violência de uma vida inteira desencaixada, oprimida, desumanizada. O resto vocês já sabem porque o vídeo viralizou. A intuição sensível da jornalista, o preparo com as palavras, a compreensão profunda da situação tornou todo aquele contexto uma aula sobre humanidade para o mundo.
“Foi realmente uma reportagem muito delicada, que mexeu muito comigo. Mas fiquei extremamente feliz em ajudar dona Madalena e, ao mesmo tempo, sensibilizar tanta gente”, me disse Adriana nas redes sociais. Até quando deixarmos de ser "as primeiras", vamos falar sobre as mulheres que temos o direito de ser. Foi o que Adriana disse a Madalena: "somos duas mulheres, com os mesmos direitos. Não tem diferença".
Mulheres fazendo a diferença. O corpo de Vira Hirich foi encontrado nesta sexta-feira entre os escombros do prédio em que morava. A Rússia confirmou o ataque à capital ucraniana. Desde 2018, ela era produtora da rádio liberdade, que só atua em países onde a liberdade de imprensa é banida ou comprometida por governos. Penso nos meus idealismos juvenis, que ainda me sustentam em semanas difíceis de noticiar como essa, como o desejo de informar e transformar realidades a partir disso.
Lembro do censo inédito divulgado essa semana pelo Instituto Alziras mostrando que chefes do executivo municipal governam para apenas nove por cento da população. Quando as mulheres são negras, o percentual cai para quatro por cento. As eleições estão aí, somos a maioria da população, e devemos ser as muitas mulheres que temos o direito de ser. Queremos o céu, a lua, o respeito e as oportunidades, onde for, de mãos dadas.