Infância em comunidade pobre, sete irmãos, oito operações e mais: conheça a história de Rebeca Andrade

A reportagem foi até Guarulhos (SP), onde Rebeca vivia com a família, na Vila Fátima. A ginasta tem seis irmãos e uma irmã. O pai saiu cedo de casa, quando ela ainda era bem pequena, e a mãe, Dona Rosa, trabalhava fora o dia inteiro como empregada.

Como tantas famílias brasileiras, os filhos mais velhos cuidavam dos mais novos. Mas o que não faltou ali foi união e apoio para que o talento da Rebeca não se perdesse pelo caminho. Emerson Andrade, o segundo filho, levava Rebeca a pé para o treino. O trajeto todo levava cerca de duas horas, quase dez quilômetros de ida e volta. E para aliviar o cansaço da irmã, o Emerson decidiu comprar uma bicicleta.

“Foi daí que eu tive a ideia de começar a pegar reciclagem na rua. Como eu tinha uma boa amizade com o rapaz do ferro-velho, eu vi uma bicicleta lá que me interessou e perguntei para ele se ele me vendia. Aí ele falou que venderia se eu conseguisse para ele R$ 50. Mas, para a minha sorte, quando chegou ali nos trinta, ele falou: ‘pode levar’”, conta Emerson.

Rebeca ia na garupa da bicicleta.

“Ele [Emerson] não me deixava descer para eu não ficar cansada, porque era uma subida, e ele ia empurrando até o ginásio”, relembra.

Entre os oito irmãos, Rebeca é apontado como a "ciumenta".

"A Rebeca sempre foi ciumenta, principalmente com os irmãos. Desde pequena ela é assim", diz a irmã Elisama Andrade.

Ainda segundo a família, na infância, a ginasta já demonstrava uma personalidade forte.

"Quando ela era pequenininha, já era toda fortinha. Um dia, eu falei: 'Ele me bateu.' E ela perguntou: 'Quem?' Apontei e ela saiu correndo atrás do menino. Rebeca correu três quarteirões atrás desse menino", conta Yago Rodrigues, um dos irmãos.

"Lógico! Eu desse tamanhinho, peguei o menino e falei: 'Você está mexendo com o meu irmão? Está maluco?' Eu estava com uma varinha na mão e dei umas varadas na perna dele. Meu Deus, está doido", relembra Rebeca, rindo da situação.

O caminho para o alto rendimento teve uma passagem rápida pelo Centro de Excelência em Ginástica do Paraná, até chegar ao Clube do Flamengo, no Rio, onde a Rebeca encontrou a estrutura certa para poder crescer. Dona Rosa conta que viu a oportunidade como uma forma de melhorar a vida da filha.

"Não posso deixar a menina morrer na praia. Se está havendo uma oportunidade que vai dar uma melhoria para ela, por que eu vou deixá-la sofrendo aqui? Ela vai até o final. Deu certo, deu. Não deu, vai tirar bastante proveito de aprendizagem, né? E vai ter a família esperando de braços abertos."

Rebeca passou por oito cirurgias ao longo de sua carreira, sendo a maior parte delas no joelho. A ginasta diz que chegou a pensar em desistir. Veja no vídeo acima.

“Eu já tinha ligado para minha mãe. Falei para ela ir me buscar, que a ginástica não era mais para mim, para ela chamar meu tio com um caminhão porque eu ia levar tudo embora pra São Paulo, que eu não queria mais viver isso”, relata.

Nesse momento, o conselho da mãe foi preciso: “A mãe não quer te obrigar a te forçar a nada, mas não é justo que você desista antes de tentar”, conta Rosa.

O ápice veio com a conquista da medalha de ouro, um momento celebrado não apenas por Rebeca, mas por milhões de brasileiros. A ginasta brasileira subiu ao pódio ao lado de outras duas mulheres pretas: as americanas Simone Biles e Jordan Chiles, que fizeram reverência a Rebeca.

“Acho que elas entenderam como aquilo era especial para mim, mas ao mesmo tempo era especial para todas as pessoas pretas”, comenta Rebeca.

Na conversa com Sandra Annenberg, Rebeca Andrade ainda revelou sua personalidade fora dos ginásios.

"Eu só durmo", brinca a ginasta.

E quando o assunto é o que a deixa de mau humor, Rebeca também foi direta:

“Ai, conversar comigo logo de manhã cedo. Acabei de acordar e a pessoa vem com aquela energia lá no talo... Bom dia, não sei o quê?”, revela.

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