O anarquismo e a democracia atual
Os frequentadores da pitoresca Portobello Road, em Londres, com suas barraquinhas que vendem bugingangas e pseudo-antiguidades a turistas desavisados, talvez não se surpreendessem de saber que ali vive um anarquista. A casa que David Graber compartilha com vários companheiros de militância radical não ganharia exatamente um prêmio de decoração da Casa & Jardim, encaixando-se mais no estilo que se poderia esperar de uma república de estudantes. Ainda assim, conseguimos encontrar um cantinho menos caótico para gravar nossa conversa (ah, como a câmera engana…), que no mínimo pode ser caracterizada como “pouco ortodoxa“.
Isso porque as ideias de Graeber pouco têm de tradicionais e acadêmicas, como talvez se pudesse esperar de um professor de Antropologia da conceituada London School of Economics, onde ele dá aulas e orienta teses de mestrado e doutorado. Nascido e educado nos Estados Unidos, foi professor da Universidade de Yale, onde seu radicalismo causou desconforto suficiente para que o afastassem. Surgiu daí o que ele considera uma “lista negra” não oficial, mas capaz de impedir sua contratação por outras universidades americanas. Foi acolhido então pelo Goldsmith College de Londres e, a partir deste ano, transferiu-se para a LSE.
Graeber é um radical, na medida em que propõe virar a sociedade de cabeça para baixo, por meio de uma revolução que acabe com o sistema capitalista (“não vai durar muito mais tempo”, ele insiste) e adote princípios anarquistas: sem governo e sem estado. O que Graeber oferece de interessante para quem acompanha as entrevistas do Milênio é justamente o confronto de ideias, a defesa de um radicalismo pouco frequente nos debates políticos tradicionais. A postura dele não se limita a um plano intelectual e distante, mas se compromete com ação, demonstrada em seu envolvimento com manifestações de rua e ativismo com grupos militantes.
por Silio Boccanera