Formulário de Busca

Um convite para investigar o mistério do Universo

qua, 27/03/13
por Equipe Milênio |

 

 Ao escolher “Por que o mundo existe? Uma história de detetive existencial” (Why Does the World Exist?: An Existential Detective Story) de Jim Holt como um dos 10 melhores de 2012, o caderno de livros do New York Times alegou: “Há muitos séculos, pensadores tem se perguntado, “Por que existe alguma coisa, ao invés de nada?” Em busca de uma resposta, Holt conduz o leitor numa espirituosa e erudita aventura de Paris a Londres e a Austin, Texas, na qual ele ouve um elenco variado de filósofos, cientistas e até romancistas que oferecem soluções às vezes bem argumentadas, às vezes quase místicas, freqüentemente estranhas, sempre interessantes e instigantes.”

Foi o melhor livro que li em 2012. Me fez pensar, rir, chorar. Uma experiência que uma entrevista com o autor não repetiu. Mas espero que o Milênio com Jim Holt convide o espectador a embarcar nessa leitura.

É um livro agradável, divertido, o que é raríssimo em tomos sobre um assunto tão profundo. Embora seja formado em filosofia, Holt se considera um jornalista, especializado em Ciência. Ele mesmo se define como tendo “um parafuso a menos” (minha tradução para I’m a little unhinged).

O que faz o livro dele ser tão bom, além do elenco de entrevistados de primeira linha (o melhor de todos: o romancista John Updike, pouco antes de morrer), é o tom pessoal da narrativa: enquanto documenta a linha de frente do pensamento contemporâneo na investigação do Sentido da Existência, Holt investiga o sentido de sua própria existência. É o que acaba fazendo chorar leitores hipersensíveis como eu.

Gravamos o Milênio, excepcionalmente, caminhando em Washington Square, no Greenwich Village, onde Holt mora. Numa tarde de fim de verão, um cenário adequado para o tema do sentido a existência.

Holt ficou um pouco assustado com a produção: enquanto caminhávamos conversando sobre o Ser e o Nada, dois cameramen e um soundman andavam, de costas, à nossa frente, gravando a entrevista. Foi difícil fazer de conta que estávamos tendo uma conversa “natural e descontraída” nessas circunstâncias. O barulho dos músicos e da multidão na praça atrapalhou um pouco.

Não foi uma experiência transformadora, como foi ler o livro dele. Nada substitui um bom livro.

por Jorge Pontual

Uma investigação sobre o mistério da existência

sex, 22/03/13
por rodrigo.bodstein |

 

Na próxima segunda-feira, uma investigação filosófica sobre o mistério da existência do Universo. Jorge Pontual entrevista o jornalista e filósofo Jim Holt. Daqui a pouco, no Milênio.

Países enfrentam crises econômicas, guerras civis na África em locais praticamente esquecidos pelo resto mundo, Estados policiais, terrorismo, violência em todos os níveis, encarecimento dos recursos naturais, possível crise na agricultura com a redução dos níveis de fósforo no planeta, milhares de pessoas sem acesso ao mínimo para viver com dignidade, sistemas políticos corruptos que parecem imutáveis. Ao olhar em volta, nada mais natural do que se perguntar o por quê de existirmos ou, talvez, por que existe algo ao invés de nada.

Para Jim Holt, essa é a questão fundamental, pois “é impossível tentar resolver o enigma sobre como o mundo é sem entender por que existe um mundo em primeiro lugar.” Como tudo começou? Quais são as estruturas que determinam nossas vidas? O que está por trás de nossas experiências sensoriais? Há um Deus – ou deuses – que organizam o caos aparente? Somos produtos de outras realidades?

Nesse sentido, é uma busca por tentar entender o roteiro do universo. A dramaturgia, durante milhares de anos, desde Aristóteles, se especializou em compreender como emular o mundo, como contar uma narrativa de um certo período de vida de forma convincente. Quem o personagem é, o rumo que sua vida vai tomar naquele momento, o passado dele, o contexto, seus desafios, tudo isso faz parte do esforço para criar uma realidade que faça com que o leitor ou espectador aceite e crie empatia com.

A investigação de Holt é como a de um personagem, preso no meio de uma história e caminhando por cada etapa, que se pergunta sobre a estrutura que mantém aquela narrativa coesa, sobre como aquelas palavras fizeram ele ser daquela maneira e por que razão, dentre todas as possibilidades, ele está ali para viver aquela experiência e o que acontecerá com ele depois que a história terminar.

No seu percurso, Holt entrevistou diversos filósofos e intelectuais para avaliar e comparar as diferentes perspectivas sobre a existência do universo e, nas palavras dele, “achei que haveria uma explicação mais profunda, uma que fosse além das alternativas tradicionais de Deus e da ciência e foi para lá que minha busca me levou.” No próximo Milênio, Jorge Pontual entrevista o jornalista e filósofo Jim Holt sobre os rumos que essa busca existencial tomou. Segunda-feira, 23h30, no Milênio.

por Rodrigo Bodstein

Vídeo extra: Richard Evans

qua, 09/02/11
por Equipe Milênio |

Como em todas as quartas-feiras, publicamos o material extra das entrevistas da semana. Nesta, o historiador britânico Richard J. Evans, revela um pouco mais das relações belicosas do Terceiro reich com os demais países europeus e com a Rússia stalinista, analisa a derrota da Alemanha nazista na II Guerra e fala um pouco mais sobre a personalidade de Hitler.
Apenas a primeira parte está legendada.

E clicando aqui, você pode ler um trecho, em português, do primeiro livro da trilogia sobre o Terceiro Reich, de Evans: “A Chegada do Terceiro Reich”.

@mileniognews

Mais uma vez, um assunto puxa o outro…

seg, 07/02/11
por Equipe Milênio |

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Típico do Milênio: saímos atrás de uma ideia e encontramos outras; procuramos um entrevistado e esbarramos em outros, até de programas anteriores.

Foi o caso de nossa ida a Cambridge para entrevistar o professor Richard Evans, diretor do departamento de História da universidade, especialista em Alemanha, sobretudo o período do Terceiro Reich, assunto em que é considerado uma dos maiores autoridades no mundo.

Como o cinegrafista Paulo Pimentel e eu chegamos cedo para nosso encontro com o professor, resolvemos tomar um café no prédio ao lado. Era o departamento de Economia, onde nos deparamos com o cartaz apontando a sala de John Maynard Keynes (1883-1946), considerado um dos maiores economistas de todos os tempos. Keynes defendia políticas econômicas que entram em discussão acalorada no momento, porque envolvem o papel do Estado em época de recessão. Keynes foi tema de um Milênio, em dezembro de 2006, que fizemos em Londres com seu mais dedicado biógrafo (30 anos de pesquisa), Robert Skildesky. Veja aqui:

É inevitável que uma visita a uma universidade do gabarito de Cambridge (sempre na lista das cinco melhores do mundo) desperte lembranças de outras entrevistas do Milênio, pois a área é uma fonte rica de pessoas com ideias, a meta do programa.

Nos lembramos logo de Simon Blackburn (em novembro de 2004), Quentin Skinner (em setembro de 2002) e Christopher Catherwood (em dezembro de 2006), autor do livro ‘A Loucura de Churchill’, sobre a “invenção” do Iraque pelo governo britânico como entidade política separada, na década de 1920, início da trapalhada ocidental na velha Mesopotâmia. Veja abaixo as três entrevistas:

Não muito longe de onde estávamos, outro prédio acomodou como professor e pesquisador um dos maiores gênios da humanidade: Isaac Newton. A cátedra dele, por sinal, foi herdada por outro gênio, desta vez o contemporâneo Stephen Hawking, reconhecido sempre em sua cadeira de rodas. Os assuntos em que eles dois são pioneiros já motivaram Milênios variados, alguns nos Estados Unidos, outros aqui, como o que fizemos, em dezembro de 2003, com o astrônomo-real Martin Rees, formado em Cambridge. Veja aqui:

No prédio onde Newton morou, entrevistamos para o Milênio há vários anos o então diretor do Trinity College, o Prêmio Nobel de Economia Amartya Sen, que nos apontou na sala de sua residência oficial um relógio de parede deixado pelo famoso astrônomo e matemático no século XVII. “O Newton deixou isso aí”, disse-nos então o mestre, em setembro de 2001, como se falasse de um visitante desleixado. Veja aqui:

Mais uma caminhada pelas ruas medievais de Cambridge (a universidade começou no século XIII) e pode-se encontrar o laboratório onde, em 1953, James Watson e James Crick desvendaram a estrutura do DNA, abrindo as portas para avanços extraordinárias em Genética. E um dos mais famosos geneticistas do mundo, Steve Jones, deu entrevista ao Milênio em dezembro 2002. Veja abaixo:

Quem veio estudar Teologia em Cambridge, mas acabou resvalando para a Ciência, foi Charles Darwin, que inspirou programas especiais na Globonews em 2009, e sobre quem conversamos muito em dois Milênios que fizemos com o evolucionista Richard Dawkins em 2009. (Clique e reveja esses programas).

A lista de ex-alunos famosos de Cambridge é longa demais para mencionar, mas só para dar um sabor, aqui vão alguns: Charles Babbage e Alan Turing (computadores), Robert Oppenheimer (bomba atômica), Frank Whittle (motor a jato), Milton Friedman (economista), os filósofos Erasmus, Bertrand Russell, Ludwig Wittgenstein, George Santayana e Karl Popper, os escritores Vladimir Nabokov, Kingsley Amis, JG Ballard, Iris Murdoch, Salman Rushdie, Zadie Smith e Michael Crichton, os atores e diretores Richard Attenborough, Ian McKellen, James Mason, Stephen Fry, Hugh Laurie, John Cleese, Sam Mendes, Stephen Frears e Paul Greengrass.

Cambridge formou ainda 15 primeiros-ministros britânicos (além do vice atual, Nick Clegg), três signatários da Declaração de Independência dos Estados Unidos e – com uma certa ironia – John Harvard, o fundador da concorrente universidade americana.

Certamente haverá brasileiros de renome nesta lista; que se manifestem os mais informados.

Depois deste passeio geográfico e histórico pela universidade, retornamos ao professor Evans, nosso entrevistado do dia. O prestativo zelador da Faculdade de História nos ajuda a carregar o equipamento e, surpreso de receber uma equipe sul-americana, conta-nos um segredo: foi espião britânico na Argentina!

Sua história – que não conferimos em outras fontes e apenas registramos aqui por curiosidade – é de que servia num submarino britânico nos anos 80, submerso no Atlântico Sul, quando chegaram ordens para navegar em direção à Argentina. Tinha começado a crise nas Ilhas Malvinas/Falklands e os militares britânicos precisavam saber mais sobre a capacidade da força área argentina. Nosso Jack Clifton foi desembarcado então em segredo no sul da Argentina (ele diz que não lembra o nome do local), perto de um aeroporto militar.

“Fazia um frio de matar”, nos conta ele, e por isso mesmo os guardas da base argentina estavam abrigados em cabanas, permitindo então a Jack observar os pousos e decolagens, sem ser notado. O espião reportou de volta: “os pilotos são muito bons, de alto nível profissional”. Que valor teve essa informação para a guerra que logo explodiu, Jack não sabe. Acrescenta que se surpreendeu com muita gente da população local falando inglês e logo descobriu que eram descendentes de imigrantes do País de Gales, grupo numeroso que foi para a Argentina no início do século XX. O Milênio não existia na época, mas quem quiser pesquisar arquivos vai descobrir o mesmo repórter – com menos rugas, claro – em cobertura do conflito.

Clifton está quase aposentado e seu trabalho de zelador hoje não tem a emoção de seu tempo na Marinha. Mas ele se dá por contente porque os dois filhos estão na universidade. O mais velho estuda Física Nuclear. Em Cambridge.

fotos: Paulo Pimentel

Na sala de Evans, após o “café do Keynes”, cercado pelos muitos livros que o professor já escreveu sobre Alemanha, nossa conversa rendeu o Milênio agora no ar, esclarecedor sobre um período que ainda desperta tanto interesse pelo mundo. Não ficou claro, talvez, na entrevista, que Evans depôs em 2001 como especialista no julgamento em Londres de David Irving, um pretenso historiador britânico que, ao estilo Ahmadinejad, negava a ocorrência do Holocausto. Evans desqualificou por completo as teorias de Irving, que perdeu a causa na Justiça contra um professora que o tinha acusado de simpatias pró-nazistas.

Após a entrevista, quando já nos despedíamos para voltar a Londres, Evans nos conta de um episódio curioso envolvendo Alemanha e Brasil. Uma leva de prisioneiros, destituídos, mendigos e sem-teto (mulheres e crianças inclusive) foi tirada de abrigos em Mecklenburg-Schwerin e despachados para o Brasil, a fim de servirem no Exército ou como colonos. De 1824 a 25, três navios levaram 271 pessoas. Segundo relato de alguns que voltaram, a experiência não foi das mais felizes, para os dois lados. No livro Notes from the German Underground (Yale University Press), Evans conclui que “não está claro qual governo se saiu pior, o de Mecklenburg ou o do Brasil”.

Como a visita a Cambridge demonstrou, uma história puxa outra, que puxa uma terceira, e assim o Milênio nos carrega, celebrando ideias e não idealizando celebridades.

por Silio Boccanera

O preço do prazer

qua, 08/09/10
por Equipe Milênio |

(Re)veja abaixo a entrevista do correspondente Lucas mendes com o psicólogo Paul Bloom, da Universidade de Yale e autor do livro/estudo How Pleasure Works: The New Science of Why We Like What We Like (Como funciona o prazer: a nova ciência do por que gostamos daquilo que gostamos).

Mais tarde vamos publicar os extras da entrevista.

Não se esqueça que você também pode nos seguir via twitter: @mileniognews.

Irina Bokova, diretora-geral da Unesco

ter, 29/06/10
por Equipe Milênio |
categoria Programas, Vídeos

Irina Bokova, diretora geral da Unesco, foi entrevistada pela repórter Elizabeth Carvalho.

Próximo Milênio: Irina Bokova

sex, 25/06/10
por Equipe Milênio |
categoria Notas

foto: agência Unesco

foto: agência Unesco

Irina Bokova é diplomata búlgara e a primeira mulher e cidadã da Europa Oriental a assumir o cargo de diretora-geral da UNESCO, a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura. Entre os concorrentes ao cargo, estava o candidato apoiado pelo Brasil, o egípcio Farouk Hosni.

Diplomata de carreira, Bokova estudou no prestigiado Instituto de Relações Internacionais de Moscou, quando a antiga Bulgária socialista era aliada próxima da União Soviética. Foi delegada do Partido Comunista búlgaro e teve uma carreira política de sucesso. Foi deputada e vice-ministra de Negócios Estangeiros e candidata à vice-presidência.

Durante uma rápida passagem pelo Rio de Janeiro, Irina Bokova conversou com a repórter Elizabeth Carvalho sobre os novos desafios que a Unesco e a própria ONU vivenciam neste início de novo século. “O meu trabalho é guiado pelo meu conceito de um novo humanismo para o século XXI. É preciso incentivar a criação de sociedades mais justas e prósperas, baseadas no conhecimento, na tolerância e na igualdade de oportunidades para todos, graças à educação, à ciência e à cultura e ao acesso à informação. A internet é peça fundamental para isso”, defende Bokova.

Mais na segunda, 28/06, às 23h30. Siga o Milênio: @mileniognews

por Alexandre dos Santos

Vídeo-extra: Steve Fuller

qui, 21/01/10
por Equipe Milênio |
categoria Extras, Vídeos

O sociólogo anglo-americano Steve Fuller continua a conversa com o correspondente Silio Boccanera sobre a capacidade das gerações mais recentes de entender e utilizar com mais facilidade as novas tecnologias, redes sociais etc.

Infelizmente apenas o início deste vídeo-extra está legendado. A entrevista está no original em inglês.

O direito de discordar

ter, 19/01/10
por Equipe Milênio |
categoria Bastidores, Notas

fotos: Paulo Pimentel

fotos: Paulo Pimentel

Cheguei a me surpreender quando disse ao entrevistado Steve Fuller que discordava dele. Não sou chegado a esse tipo de reação pessoal durante a gravação de uma entrevista, mas desta vez me escapou, quando a conversa passou do tema principal – a educação sobre novos meios de comunicação – para o tópico mais amplo do conflito entre evolucionismo e criacionismo.

Claro que já discordei de entrevistados em muitos anos de entrevistas com pessoas de idéias mais variadas, inclusive políticos e ditadores de posições obtusas. Mas a longa prática profissional recomenda que é mais importante registrar o ponto de vista do entrevistado e não o meu, que fica reservado no máximo para apimentar uma conversa separada depois, se houver tempo.

No caso de Fuller, um simpático sociólogo americano radicado há anos na Inglaterra, meu comentário pessoal escapou de voz alta quando nos despedimos, ao fim de uma conversa na qual ele defendeu uma posição – o criacionismo — que passei meses examinando pelo lado oposto: o evolucionismo.

Mergulhei no assunto em 2009 porque se comemorava o bicentenário de nascimento de Charles Darwin e os 150 anos desde a publicação original de sua obra maior e mais influente: Sobre as Origens das Espécies. Não bastasse o envolvimento na preparação de programas especiais para a Globo News sobre Darwin e suas idéias, ainda tive a oportunidade de entrevistar para o Milênio o cientista britânico Richard Dawkins, considerado por muitos o mais influente neodarwinista vivo.

Nada contradiz mais os conceitos de Darwin ou irrita mais a paciência de Dawkins do que a proposta criacionista, que interpreta literalmente as afirmações da Bíblia de que o universo, a Terra, flora, fauna, homem, mulher, barata, tudo foi criado por um ser inteligente, Deus, em uma semana, de uma só vez, há uns 6 mil anos.

Astrônomos garantem que o universo surgiu quase 13 bilhões de anos atrás, geólogos asseguram que a Terra se formou há 4,5 bilhões e os biólogos sustentam que a vida surgiu no planeta há 4 bilhões de anos. No entanto, os fundamentalistas religiosos, espinha dorsal do criacionismo, acreditam nas datas que seus respectivos livros sagrados proclamam, não importa o que a ciência demonstre.

Darwin não tem mais como reclamar, mas Dawkins esbraveja enfurecido que estamos cercados de pedras com bilhões de anos e que dinossauros passeavam pela Terra há mais de 60 milhões de anos, antes de surgir o ser humano. Ele lembra também as provas científicas (fósseis, por exemplo) de que nenhuma espécie surgiu de uma só vez, com a forma que tem hoje, pois foram se modificando ao longo de milhões de anos.

Mais intolerável ainda para os evolucionistas é engolir literalmente, como exigem muitos criacionistas, a história bíblica da Arca de Noé como origem das espécies existentes hoje. Os defensores dessa narrativa alegam que animais e plantas teriam sobrevivido a uma grande enchente na época de Noé, que os teria recolhido antes das chuvas, para soltá-los depois pelo mundo.

Incluía pinguim e canguru? – perguntam os cientistas debochados. Onde Noé encontrou os simpáticos bichinhos que só existem na longínqua Antártida? E se entraram na arca, porque, ao sair, quando a inundação bíblica acabou, eles não seguiram para o Ártico, tão gelado quanto a moradia atual no extremo Sul e mais perto do suposto local onde a arca finalmente encalhou (a Turquia de hoje, dizem os crentes)?

Do meu lado, tenho mais interesse em saber se Noé recolheu jaboticada para preservar na arca. E onde, quando o mundo conhecido não incluía as Américas, foi ele buscar a frutinha que só dá no Brasil?

Fuller 4

Fuller não foi tão raso em nossa conversa e seu senso de humor não o deixaria se ofender com as brincadeiras acima, mas ainda assim ele defende uma versão do criacionismo, mais sutil na metafisica, conhecida como ‘Desenho Inteligente”. É a tese de que, mesmo sem levar em conta as impossibilidades científicas da Bíblia, deveríamos aceitar o argumento de que um ser inteligente está por trás da criação do mundo e dá sentido à vida. Refere-se a um Deus, claro.

Deixando-se de lado a discussão filosófica ou teológica sobre a existência de um ser supremo todo poderoso, resta a questão da tal inteligência por trás da criação. E quando Fuller falou disso, o que me veio à cabeça foi a provável reação enfurecida de Darwin e Dawkins, soltando espuma no canto da boca.

Na verdade, pensei mais no cientista contemporâneo do que em seu compatriota do século XIX, que não alardeava sua descrença num ser superior, espremido que vivia entre a sociedade vitoriana e uma mulher piedosa em casa temerosa de que ele fosse para o inferno.

Fuller 6

Foi mais fácil eu imaginar a reação enfurecida de Dawkins hoje, diante da sugestão de criação inteligente, e isso não só por causa da entrevista que tivemos em julho no Brasil, durante a Festa Literária de Paraty – Flip, mas também porque estou no meio da leitura de seu recém-lançado livro The Greatest Show on Earth (O Maior Espetáculo da Terra).

Na obra ainda inédita no Brasil, Dawkins não resiste à gozação de afirmar que se as espécies foram criadas intencionalmente do jeito que são hoje, o suposto criador nada tem de inteligente, pois produziu muitas soluções burras, só explicáveis pelo fato de que a evolução natural não tem planejamento, não olha para a frente.

Inventou olhos, como os dos homens, que seriam rejeitados por qualquer especialista em ótica, pois a retina foi feita de trás para a frente, e só funciona porque o cérebro corrige as falhas de visão. Entre os órgãos reprodutores masculinos, o canal que leva o esperma dos testículos ao pênis dá uma volta longa e inútil por cima do ureter, que leva a urina dos rins à bexiga. O sistema circulatório envolve uma rede tortuosa de veias e artérias cuja montagem envergonharia um bombeiro hidráulico.

A coluna vertebral do ser humano, fonte de tantas dores, pretexto para tantas massagens salvadoras, não foi projetada para um ser que anda em pé. Dá problemas hoje porque resulta da evolução de uma espécie que se movia na horizontal. Um criador inteligente não a construiria do nada para a forma atual.

“Absurdos” semelhantes aparecem em quase todos os animais vistos por dentro, diz Dawkins, em constraste com a beleza da aparência e do desempenho externos (a graça de uma gazela em disparada, aponta ele), porque só o acaso da evolução por seleção natural, feita aos trancos e barrancos no decorrer de milhões de anos, justifica tanta solução improvisada e aparentemente burra.

No mundo real, exemplificou o cientista, uma reflexão inteligente do homem permitiu a criação do motor a jato a partir de idéias novas, começando do zero em relação ao que existia e tendo em mente o objetivo a atingir. Na natureza, comenta Dawkins, o jato teria de surgir como evolução do que havia antes: o motor a hélice. Seria uma solução burra, se houvesse alguém planejando. Só que na natureza, afirma ele, ninguém planeja, porque “não existe planta de arquitetura e não existe arquiteto”.

Foi irresistível discordar do desenho inteligente defendido por Fuller, mas como é prática no Milênio, deixamos que o público ouça o entrevistado e estabeleça suas próprias conclusões.

por Silio Boccanera

Educação, mídia, amadurecimento etc.

ter, 19/01/10
por Equipe Milênio |
categoria Sem Categoria

Assista à entrevista de Silio Boccanera com o sociólogo Steve Fuller e entenda porque, na opinião dele, aprender desde cedo a “gramática da comunicação” pode ser essencial para que você tenha uma noção mais abrangente do mundo que o cerca.

Não perca ainda esta semana um texto do correspondente Silio Boccanera contando os bastidores da entrevista com o professor Fuller e os extras que não foram ao ar.



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