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Uma boa lembrança

qua, 14/12/11
por Equipe Milênio |

 

“Leila, quem está pra vir aqui é o Eric Kandel, você tem que entrevistar”. Ouvi isso em outubro de Eliana Freire, competente psicóloga especializada em dependência química, mestre pela Universidade de Houston (Texas, USA), professora da PUC-RJ. Também vem a ser a companheira de muitos anos do meu pai. “Kandel quem?”, pensei. Eliana explicou como pôde, no meio de uma reunião de família. Era Nobel de Medicina, tinha um belo trabalho sobre a memória, algo assim.

Comentei com Rodrigo Bodstein, que edita o Milênio (e joga nas onze) na Globonews. Sugerimos a entrevista à coordenação de Programas do canal. Aprovada a pauta, precisávamos marcar data, hora e local para nossa gravação – e não nos parecia elementar cercar um Prêmio Nobel. Finalmente, era também hora de estudar sobre o professor.

Descobrimos que Eric Kandel tem entusiastas no Rio de Janeiro. E eles acabaram sendo uma força-tarefa que nos ajudou. Um (Cid Merlino) nos emprestou o documentário baseado em “Em Busca da Memória”, belo livro em que Dr. Kandel resume sua vida e suas pesquisas. Outro (Firmo Freire) nos fez chegar às mãos a própria autobiografia, na edição original em inglês. Mais dois da tropa (Fátima Vasconcellos e Jorge Alberto da Costa e Silva) fizeram a ponte com nosso entrevistado-alvo. Eric Kandel vinha ao Rio numa viagem rápida, para o Congresso Brasileiro de Psiquiatria. Agenda apertada, muitos compromissos (é o pop-star da Neurociência). Mas tinha uma brecha na agenda no sábado de manhã.

Sábado seria minha folga. E justo naquele dia minha filha mais velha faria uma prova para mudar de escola, daqueles padrão vestibulinho, para as quais as crianças (mesmo com 9 anos) se preparam por meses. Mas Eric Kandel merecia o esforço. Eu daria um jeito. Poderia deixar a pequena no local do exame, encarregando o pai de ir buscá-la, e correr para o local da entrevista, por que não? O problema era: que local? Quando ficou definido o horário, fomos atrás de um cenário (normalmente não gravamos o Milênio em estúdio) e percebemos que não seria exatamente fácil.

Não podia ser no hotel em que Kandel e Denise, sua adorável e inseparável esposa, estavam hospedados: nos explicaram que o lugar estava lotado, que havia vários eventos etc etc etc. E tínhamos 36 horas para encontrar uma locação. Finalmente Rodrigo Bodstein tirou da algibeira o Midrash, centro cultural judaico cuja direção prontamente topou nos abrir as portas. Seriam duas coincidências em uma: primeiro porque Dr. Kandel é judeu e esse fato tem papel decisivo em sua história (quem vir a entrevista vai entender por quê); depois, porque foi no Midrash que o tal documentário “Em Busca da Memória” tinha sido exibido meses antes, aproximando o cientista da comunidade “psi” carioca e aumentando sua legião de admiradores.

Moral da história: deu certo. Nossa quase-operação-de-guerrilha em nome de quarenta minutos com o homem que mudou o entendimento sobre a formação da memória funcionou. Eric Kandel (e Denise) chegou pouco depois das dez, com a simplicidade que só os muito, muito bons no que fazem sabem ter. Gravou conosco o tempo que quisemos. Fez graça com um cachorro da vizinhança que teimava em latir durante a conversa. Ficou feliz com as perguntas. Foi simpaticíssimo quando minha caçula (a de 3 anos) apareceu “pra buscar mamãe no trabalho” (era fim-de-semana, afinal, e moramos a poucas quadras do Midrash).

Há coisas na vida que são meio iluminadas e essa entrevista com Eric Kandel foi uma delas. Tão especial, que dias depois, ele mandou por Federal Express um livro autografado e um bilhete carinhoso (no papel timbrado da Universidade de Columbia, coisa fina!). Valeu a pena. (E, em tempo: minha filha mais velha passou na prova.)

Antes deste relato terminar, merece destaque o cuidado de cirurgião (neurológico!) que Bodstein teve ao editar a entrevista. Tínhamos gravado uma conversa longa, que precisava ser cortada para caber no tempo do programa. E Rodrigo conseguiu enxugar as gorduras e tecnicalidades sem tocar no cerne, sem tirar as linhas de raciocínio do mestre, sem podar seus arroubos emocionais (por sinal muito bonitos, como vocês viram ou verão).

Para quem já conhecia Kandel, tenho a dizer que me junto a vocês no fã-clube. Para os que não conhecem, o que sugiro é que não percam: vejam a reprise na TV ou assistam à entrevista aqui na internet. Acho que vocês vão gostar.

por Leila Sterenberg

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Eric Kandel e a nova ciência da mente

sex, 09/12/11
por rodrigo.bodstein |

 

Na próxima segunda-feira: A memória é o que dá sentido e coerência à vida, mas há uma base biológica para compreender como ela funciona?

Cada informação que coletamos, nossas experiências, boas e ruins, tudo isso ajuda a formar um conjunto de pequenas peças que, em certo momento, nos definem e criam a identidade pela qual vamos compreender o mundo à nossa volta e atuar na sociedade. Uma nota musical, uma frase, o que determina que certos momentos fiquem em nossa memória ao longo dos anos? Eric Kandel, prêmio Nobel no ano 2000, acredita que a resposta está na biologia. Ao analisar o hipocampo e doenças como o Alzheimer e a esquizofrenia, Kandel transitou entre a psicanálise, a filosofia, as artes e o funcionamento sistema nervoso com a premissa de que a percepção e a memória dependem de como nosso corpo é capaz de armazenar nos neurônios as informações que recebe.

E, essas informações, em geral, são limitadas. O cérebro está em um processo criativo constante que cria e recria significados aos estímulos que recebe. O simples ato de olhar para o rosto de alguém exige um esforço considerável. O cérebro precisa compilar, ininterruptamente, os pedaços de informações para formar um quadro coerente do que está vendo. Nesse sentido, ao apreciar uma obra de arte, como uma pintura, cada pessoa estabelecerá uma conexão emocional diferente, que dependerá das experiências que acumulou em sua vida e do que está conseguindo perceber naquele instante. O mais interessante é que existem regiões específicas do cérebro que respondem em cada uma dessas situações. Além disso, a maior parte das decisões que tomamos são feitas de forma inconsciente. Os sinais elétricos percorrem o sistema nervoso alguns segundos antes de termos consciência do ato. O que fundamenta as respostas do corpo? Memória e experiência.

A nova ciência da mente, que Eric Kandel desenvolve em seu laboratório na Universidade de Columbia, em Nova York, está transformando a relação entre a biologia, as ciências humanas e as artes. Indica não apenas novos caminhos para o tratamento de doenças mentais e para perda de memória, como também abre espaço para transformar a forma como compreendemos o mundo. Não perca a entrevista, segunda-feira, 12/12,  às 23h30, na Globo News.

por Rodrigo Bodstein



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