Só confiança basta?
Apesar da intensa recessão em curso, tem sido amplamente noticiado que a confiança de empresários, investidores e consumidores começa a melhorar. Isso fica evidente quando observamos os indicadores obtidos pelas sondagens da FGV (Faculdade Getúlio Vargas). A maioria dos índices de confiança têm apresentado evolução positiva há pelo menos dois meses.
No caso do setor da construção, o índice de confiança subiu 1,8 ponto em agosto e atingiu seu maior nível desde julho de 2015. A partir do mínimo histórico em fevereiro deste ano, o índice já acumula um aumento de 5,9 pontos. Em seu relatório de divulgação a FGV aponta que, apesar da evolução da confiança na construção ser menos favorável do que a registrada nos outros setores pesquisados (indústria, comércio, serviços), a redução do pessimismo na construção já parece evidente. Ainda com base nestes indicadores, destacamos que a intenção de contratar mão de obra também aumentou e o segmento de preparação de terrenos subiu mais do que a média dos subsetores da construção pesquisados (construção de edifícios e obras de engenharia, obras de infraestrutura para engenharia elétrica e para telecomunicações, obras de instalações, obras de acabamento, aluguel de construção e demolição). Estas dinâmicas positivas indicam que expectativas já se refletem em uma incipiente retomada da atividade imobiliária.
Ninguém tem dúvida de que o aumento da confiança e expectativas positivas sobre o futuro são fundamentais. Agentes econômicos, esperançosos de que as coisas melhorem à frente, tomam decisões hoje que aumentam as chances de que as boas expectativas de fato se confirmem. Este fenômeno é o que os economistas chamam de previsões autorrealizáveis. Cidadãos confiantes aumentam seu consumo. Empresas confiantes aumentam seus investimentos e suas contratações. Ambos os movimentos impactam a economia positivamente.
Mas só confiança basta? Para tentar responder a questão precisamos examinar o que gera confiança. De forma geral, isso não é nada trivial, uma vez que envolve complexas dimensões psicológicas. No entanto, no contexto brasileiro atual parece claro que as expectativas positivas estão fortemente relacionadas aos anúncios de políticas econômicas feitos pelo novo governo, particularmente no que diz respeito ao saneamento das contas públicas e à criação de um novo arcabouço microeconômico que sustente um ambiente de negócios mais eficiente. Em outras palavras, a confiança em ascensão reflete um crédito que cidadãos e empresas estão dando para que a nova administração federal coloque a economia nos trilhos. Desta forma, o aumento da confiança precisará ser corroborado por ações do governo. De outro modo, não será difícil que expectativas voltem a ficar negativas e o processo de previsões autorrealizáveis passe a atuar no sentido contrário.
Neste sentido, a gravidade do contexto macroeconômico e setorial não ajudam. Taxas de juros elevadas, restrição de crédito e deterioração do mercado de trabalho certamente ainda trabalham contra a empolgação incipiente. As dificuldades enfrentadas por muitos dos participantes no mercado imobiliário também sugerem que o crédito de confiança não tende a ser de longo prazo, caso condições objetivas de demanda e custo de financiamento não melhorem nos próximos meses.
Com tudo isso, acredito que seja razoável concluir que, sim, manter as expectativas positivas e a confiança elevada são condições necessárias para ampliar as chances de sairmos do buraco e iniciarmos um novo ciclo de crescimento no mercado imobiliário. Mas não podemos nos iludir. A percepção subjetiva dos agentes só continuará a soprar a favor se as condições objetivas da economia permitirem.
É urgente que o governo passe do discurso à ação.
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