“Essa cerveja é boa pra mulher, é bem doce e levinha”. “Sorte do seu namorado de namorar com uma cervejeira, né?”. “Mulher e cerveja? No máximo ajuda lavando as panelas”. Cansadas de ouvir essas e muitas outras frases machistas, um grupo de cervejeiras brasileiras criou, no início do ano, o Coletivo ELA, que tem como objetivo empoderar as mulheres do meio, além de debater e combater o preconceito no mercado da bebida no país. Com mais de 100 participantes, elas já lançaram uma cerveja e agora partem para ações de conscientização.
Apesar de já conversarem sobre o tema em bares, eventos cervejeiros e na internet, a gota d’água foi a divulgação de mais um rótulo que tratava a mulher como objeto. Com a discussão aberta nas redes sociais, surgiu a ideia de criar o Coletivo ELA (sigla para Empoderar, Libertar, Agir), para tomar ações mais concretas. “A gente começou a ver que poderia ser muito mais do que isso, de só fazer uma cerveja”, explica a sommelière de cervejas Fernanda Correa de Freitas.
O primeiro passo foi a fabricação da cerveja, mas esse não é o principal objetivo do grupo. “Nossa ideia é educar, despertar uma discussão. As pessoas só vão mudar se souberem os motivos para estarem erradas”, comenta. A bebida, inclusive, teve lançamentos em diversos Estados e os lucros serão totalmente revertidos para entidades de apoio a mulheres que sofrem agressões.
Mensagem na garrafa
Para quebrar o clichê de que mulheres gostam das leves e docinhas, o primeiro rótulo produzido inteiramente pelas integrantes do Coletivo na Cervejaria Dádiva é uma pancada de amargor, encorpada, com 10,5% de teor alcoólico. “Quando decidimos questionar, resolvemos começar com uma American Barley Wine, que não é nem de perto o que a galera considera uma cerveja de mulherzinha”, explica Larissa Paschoal, uma das fundadoras do ELA que participou da brassagem.
Lembra das frases no começo do texto? Todas foram ouvidas pelas integrantes do Coletivo e estão na embalagem da ELA American Barley Wine. “Queríamos passar um pouco a ideia do que a gente passa diariamente no bar”, explica Larissa, que criou toda a identidade visual do ELA e da cerveja.
As integrantes escreveram à mão algumas das ofensas que já ouviram, e suas letras foram impressas num pacote de papel pardo. “A ideia é que quando vai abrir, você vai rasgar o machismo”. As cores do rótulo, magenta e roxo, também fogem da associação com o rosa.
Próximos passos
Os próximos passos do Coletivo já começaram a ser dados, com uma primeira roda de discussão promovida em São Paulo e previsão de mais uma ainda em outubro no Rio de Janeiro. “E queremos desenvolver cursos voltados para mulheres que estão no mercado, palestras e discussões que envolvam o feminismo”, comenta Fernanda. A ideia é também atrair quem não está no meio cervejeiro, mas têm curiosidade.
A recepção do Coletivo ELA foi majoritariamente positiva. Larissa comenta que no lançamento da cerveja em São Paulo, por exemplo, muitas mulheres que não fazem parte do meio cervejeiro compareceram. “Foram pessoas que não são do meio, que não tinham contato, mas se identificaram com a ideia”, lembra.