Universidades e institutos federais vêm enfrentando, nos últimos meses, dificuldades para manter serviços básicos, como pagamento em dia de contas de água e luz, em razão da crise econômica e do corte orçamentário promovido pelo governo federal.
Pelo menos cinco universidades informaram ao G1 ter dificuldades de caixa para manter o funcionamento até o fim do ano letivo: Universidade de Brasília (UnB), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e Universidade Federal de Goiás (UFG). Já o Sindicato Nacional dos Docentes (Andes) diz que, segundo os reitores das universidades federais, o dinheiro proveniente dos recursos federais para despesa e manutenção será suficiente somente até o mês de setembro.
Em abril, o governo federal anunciou um contingenciamento de R$ 42,1 bilhões das contas públicas. No Ministério da Educação, o corte foi de R$ 4,3 bilhões, dos quais R$ 3,6 bilhões em despesas diretas da pasta. Com isso, o orçamento do ministério para 2017, que havia sido definido pelo Congresso em R$ 35,74 bilhões, foi reduzido para R$ 31,43 bilhões.
Em nota enviada ao G1, o Ministério da Educação (MEC) explicou ainda que está trabalhando para aumentar o limite de empenho previsto para despesas de funcionamento e de expansão e reestruturação. "Para 2017, o limite de empenho previsto inicialmente para as universidades é de 85% do valor previsto para despesas de custeio e de 60% para despesas de capital", diz a nota (leia a íntegra ao final desta reportagem).
Isso quer dizer que, considerando o orçamento aprovado pelo Congresso Nacional para 2017, 15% dos gastos de custeio (o funcionamento das instituições, como gastos com luz, água, manutenção e serviços terceirizados) ficaram congelados até nova ordem. Já os gastos de capital (que são as despesas com as obras de expansão e reestruturação dos prédios) tiveram um contingenciamento de 40% da verba aprovada pelos parlamentares.
Situação das universidades
Veja em detalhes a situação de universidades e institutos federais de 14 estados, segundo levantamento do G1:
Acre - Universidade Federal do Acre (Ufac) teve uma redução de 16% em repasses do Ministério da Educação (MEC) para o recurso anual de 2017. Segundo a instituição, a porcentagem corresponde a aproximadamente R$ 11 milhões a menos para custeio com manutenção dos campi e investimentos em novas obras.
Amapá - Devido aos cortes no orçamento de todas as universidades federais, a previsão é que em setembro a Universidade Federal do Amapá (Unifap) não tenha como pagar as dívidas de serviços como limpeza, segurança, etc. “Mas isso é para todas as universidades federais. Colapso”, diz a assessoria.
Distrito Federal - A Universidade de Brasília (UnB) está com déficit de quase R$ 100 milhões. A verba repassada pelo governo federal para 2017 é de R$ 136,6 milhões. A previsão de gastos da universidade, no entanto, é de R$ 230 milhões neste ano. Para economizar, a UnB demitiu 130 funcionários terceirizados responsáveis por serviços de manutenção, limpeza, portaria e vigilância.
Espírito Santo - A Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) teve um corte de R$ 12 milhões no orçamento e serviços foram afetados.
Minas Gerais - Na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a escassez de recursos afetou as construções de prédios no campus, as pesquisas científicas e provoca até falta de toner nas impressoras. Além disso, a instituição tem quatro meses de água e luz atrasados. "Tenho 30 anos de instituição e nunca vi uma situação tão séria, tão grave. A falta de recursos vem prejudicando as atividades de professores e alunos", disse a coordenadora do Sindicato dos Trabalhadores das Instituições Federais de Ensino (Sindifes-MG). Neide Dantas.
Paraíba - Obras paradas e orçamento cortado em 60% na Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Segundo o reitor Vicemário Simões, a Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) só tem 60% do orçamento de custeio previsto para o ano. A universidade está precisando fazer contenção de despesas: redução de viagens, principalmente para eventos internacionais, e suspendendo obras de recuperação de edificações.
Paraná - A Universidade Federal do Paraná (UFPR) informou que o orçamento reduzido mplicou em um corte linear de 10% nos recursos para todas as unidades da instituição. Isso implicou, na prática, em uma redução de 10 a 15% nos serviços realizados por funcionários terceirizados – limpeza, portaria, manutenção e serviços técnicos. “Está sendo feita a racionalização dos gastos por meio de ações que envolvem economia de energia (inclui a troca por lâmpadas de LED, de água, de materiais e recursos. Contribui para isso uma campanha da universidade de redução de gastos de custeio, que estimula a comunidade acadêmica a diminuir o consumo de itens como papel, água, telefone e energia elétrica”, disse a universidade.
Piauí - A Universidade Federal do Piauí (UFPI) teve um corte de 20% a 30% nos funcionários terceirizados responsáveis por segurança e limpeza. Apenas obras anteriores a 2016 com empenho já realizado estão em curso. Laboratórios estão com falta de insumos e demora para reposição por causa da falta de recursos.
Rio de Janeiro - A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) sofreu um corte de R$ 150 milhões em 30 meses. Ela está na lista das universidades que só tem verba para funcionar até setembro. Os cortes no orçamento atingiram o fornecimento de energia, devido à falta de pagamento das contas. Os cortes atingiram o fornecimento de energia do prédio da reitoria e do prédio da Faculdade de Letras. A Light, empresa de energia do Rio de Janeiro, informou que a universidade não pagou as contas de luz de setembro e outubro do ano passado e de abril deste ano, totalizando uma dívida de aproximadamente R$ 11,5 milhões.
Rio Grande do Sul - A redução orçamentária causou cortes de gastos com terceirizações, viagens, bolsas e obras, e afetou setores de pesquisa em universidades federais do Rio Grande do Sul (UFRGS, Unipampa, Furg e UFPel).
Rio Grande do Norte - A Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) informou que teve de reduzir os contratos de terceirizados, como segurança, limpeza e jardinagem. Esses serviços continuam, mas em escala reduzida. O Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN) também reduziu o número de terceirizados.
Rondônia - A Universidade Federal de Rondônia (Unir) informou que ainda não foi prejudicada com os cortes porque tem caixa até setembro deste ano. O valor é o que já tinha sido orçado no ano passado. Mas, a partir de setembro, poderá ter dificuldades para pagamento de luz, água e salários.
Roraima - O Instituto Federal de Roraima (IFRR) sofreu corte de gastos e isso tem deixado a instituição com dificuldades para honrar compromisso com credores. Além disso, estão afetadas as despesas com contratos de prestação de serviços, aquisição de material de consumo, diárias, passagens, construções, instalações e aquisição de equipamentos e material permanente.
Santa Catarina - Segundo o reitor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Luiz Carlos Cancellier de Olivo, o "orçamento é praticamente o mesmo de 2016. Esse é um dado positivo se comparado com a grande maioria das IFES". No entanto, não foi considerada, no orçamento de 2017, a inflação de 2016. "Por este motivo temos um orçamento pressionado por conta do crescimento natural dos contratos de terceirização (limpeza, vigilância, cozinheiros e outros). Por este motivo, o ensino a pesquisa e a extensão são afetados pelo fato do nosso orçamento não ter crescido. Em relação às obras, estamos priorizando as que estão em andamento e as que estavam paradas. A nossa principal ação é controlar as despesas e repactuar os grandes contratos. A nossa preocupação para o segundo semestre está no contingenciamento orçamentário, pois mesmo tendo orçamento, não temos certeza se teremos autorização do MEC para executá-lo", disse o reitor.
Nota do Ministério da Educação
Leia a íntegra de nota do Ministério da Educação, divulgada na noite de quarta-feira (26):
O MEC aumentou, recentemente, o limite de empenho para as universidades e institutos federais em 10 pontos percentuais. A liberação do orçamento de custeio, que é utilizado para a manutenção das instituições de ensino, passou de 60% para 70%. Já o orçamento de capital, utilizado para adquirir equipamentos e fazer investimentos, passou de 30% para 40%.
Desde o início do ano, o MEC repassou cerca de R$ 4 bilhões em recursos financeiros para as instituições federais: universidades; institutos federais; Instituto Nacional de Surdos; Instituto Benjamin Constant; e Fundação Joaquim Nabuco. Disso, R$ 2,9 bilhões foram apenas para universidades federais.
No último mês, o MEC liberou, também em recursos financeiros, R$ 626,6 milhões, sendo que R$ 444,3 foram apenas para universidades e institutos federais do país inteiro. Os valores são aplicados na manutenção, custeio e pagamento de assistência estudantil, hospitais universitários, entre outros. Os recursos estão previstos na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2017. Essa liberação cobre as despesas de custeio e investimento das unidades de modo a não comprometer o funcionamento de nossas instituições.
Para 2017, o limite de empenho previsto inicialmente para as universidades é de 85% do valor previsto para despesas de custeio e de 60% para despesas de capital. No entanto, o MEC está trabalhando para aumentar esse limite, assim como fez no ano passado, onde, mesmo após o contingenciamento feito pelo governo anterior, conseguiu liberar 100% de custeio para as universidades.
No contingenciamento do ano passado, ainda feito pelo governo anterior, o limite de empenho disponível foi menor do que o deste ano, sendo de 80% para as despesas de custeio e de 40% para as de investimento nas universidades e institutos federais.
Mesmo diante do atual ajuste, o valor disponível para estas instituições será 5,3% maior do que o disponível à época do contingenciamento em 2016 – o que corresponde a um aumento de R$ 385,7 milhões. No mesmo período do ano passado, o limite de empenho disponível foi de 80% para as despesas de custeio e de 40% para as de investimento nas universidades e institutos federais.
Destaca-se que os repasses financeiros são enviados pelo MEC às reitorias das Universidades Federais na medida em que a execução da despesa pública vai ocorrendo, mediante a liquidação da própria universidade, conforme determina o artigo 63 da Lei n° 4.320/1964. Por esse motivo, não dá para definir uma “última data de repasse” ou “quando será o próximo repasse”. Cada instituição tem um tempo diferente. As universidades, no âmbito da autonomia administrativa e de gestão financeira e patrimonial que possuem, de acordo com o previsto no artigo 207 da Constituição Federal, é que realizam a aplicação dos recursos. Dessa forma, o ministério, após efetuar liberação financeira, não possui qualquer ingerência sobre os processos de pagamento que estejam a cargo de suas unidades vinculadas.
* Colaboraram as redações do G1 nas capitais