16/01/2014 07h19 - Atualizado em 16/01/2014 14h19

'Faltava até papel higiênico', diz atriz Juliana Alves, aluna da UniverCidade

Atriz será transferida para Candido Mendes, que acolherá alunos de teatro.
Grupo Galileo informou que vai recorrer da decisão do descredenciamento.

Vanessa Fajardo e Ana Carolina MorenoDo G1, em São Paulo

Juliana Alves, aluna de teatro da UniverCidade, no espetáculo 'Forrobodó' (Foto: Marcelo Rodolfo/Divulgação)Juliana Alves, aluna de teatro da UniverCidade, no espetáculo 'Forrobodó' (Foto: Marcelo Rodolfo/Divulgação)

Aluna do curso de graduação em teatro do Centro Universitário da Cidade (UniverCidade), no Rio de Janeiro, a atriz Juliana Alves, de 31 anos, já conseguiu a transferência para outra faculdade depois que o Ministério da Educação (MEC) oficializou, na quarta-feira (15), o descredenciamento da instituição e da Universidade Gama Filho, ambas geridas pelo Grupo Galileo. Ela contou ao G1 que a crise se agravou no segundo semestre do ano passado, com a saída de vários professores, chegando ao ponto de faltar papel higiênico nos banheiros da faculdade (entenda o caso).

A atriz afirmou que já está reunindo os documentos para providenciar a transferência. O campus de Ipanema da Universidade Candido Mendes vai acolher os cerca de 200 alunos do curso de teatro da UniverCidade e admitir o corpo docente.

A atriz Juliana Alves faz curso de graduação de teatro na UniverCdade (Foto: Sergio Baia/Divulgação)A atriz Juliana Alves  (Foto: Sergio Baia/Divulgação)

Juliana afirma, porém, que seu caso é pontual e que a imensa maioria dos alunos de outros cursos da instituição não sabe para onde vai. A atriz e rainha de bateria da Unidos da Tijuca, revelada pelo programa Big Brother Brasil, entrou no curso de teatro da universidade no segundo semestre de 2011, por recomendação de colegas de profissão que elogiaram a qualidade do ensino.

"Apesar das dificuldades da instituição, o curso de teatro da UniverCidade tem uma tradição muito grande, era um dos melhores do Rio, vários colegas de profissão fizeram."

Segundo a atriz, a crise se agravou quando boa parte do corpo docente do curso de teatro foi demitida no último semestre de 2013, o que fez com que vários alunos desistissem das aulas.

"Faltava até papel higiênico nos banheiros, mas quando os professores foram demitidos foi terrível, porque eram eles que mantinham a qualidade do curso. Pegou todo mundo de surpresa. Não fazia mais sentido ficar lá."

Faltava até papel higiênico nos banheiros, mas quando os professores foram demitidos foi terrível, porque eram eles que mantinham a qualidade do curso. Pegou todo mundo de surpresa. Não fazia mais sentido ficar lá"
Juliana Alves, atriz
e aluna da UniverCidade

Juliana lembra que os alunos de teatro tiveram a "sorte" de encontrar uma nova instituição que os recebesse com quase o mesmo corpo docente e mensalidades no mesmo valor, em média – ela preferiu não revelar. No entanto, essa não é a situação da maioria. 

"A imensa maioria não sabe para onde vai, nem que procedimento tomar. Muitos colegas tinham bolsas e não vão poder pagar o curso em outra instituição, simplesmente por impossibilidade. Um grupo como a Galileo não merece cuidar de algo tão importante como a educação."

Juliana Alves no palco em peça feita no curso de teatro da UniverCidade (Foto: Arquivo pessoal/Juliana Alves)Juliana Alves no palco em peça feita no curso de teatro da UniverCidade (Foto: Arquivo pessoal/Juliana Alves)


A atriz diz que não conseguiu concluir o último semestre do curso, porque os alunos tinham de apresentar uma peça, conforme previsto na grade curricular, mas não havia um espaço para ensaiar na instituição. "Estudar numa situação dessas é um ato de determinação. Enfrentamos uma série de precariedades, nos sentimos desrespeitados, os professores foram humilhados, iam dar aula sem receber salário."

A jornalista Vanessa Riche, do Sportv, se formou na Universidade Gama Filho (Foto: Sportv/Reprodução)A jornalista Vanessa Riche, do Sportv, se formou na
Universidade Gama Filho (Foto: Sportv/Reprodução)

Ex-aluna da Gama Filho lamenta
A jornalista e apresentadora Vanessa Riche, do Sportv, cursou publicidade e propaganda e jornalismo na Gama Filho (UGF). Em 1990, ela passou para o curso de psicologia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mas trocou a federal pela UGF no segundo semestre, quando foi aprovada em publicidade. Na época, ela afirma que a concorrência era de 36 candidatos por vaga.

Quando conseguiu um emprego em rádio e decidiu seguir por esse caminho, em 1995, Vanessa retornou à Gama Filho para o curso de jornalismo. Ela contou ao G1 que, naquela década, a universidade já se destacava pela infraestrutura e corpo docente, e que ficou impressionada nas vezes que voltou à faculdade, já como profissional, para dar palestras aos alunos. Sua última visita foi há cerca de quatro anos.

Era uma universidade de nome, todo mundo queria estudar lá. Eu amava os professores. Minha primeira prática de televisão eu aprendi lá"
Vanessa Riche, jornalista
e ex-aluna da Gama Filho

"Tinha auditório, praça de alimentação, sinal de que estava crescendo. A tendência é que houvesse uma melhora, não uma decaída. Em vez de crescer, parou, estagnou", disse ela.

Vanessa lembra que aprendeu com professores que atuavam no mercado de trabalho. "Era uma universidade de nome, todo mundo queria estudar lá. Eu amava os professores. Minha primeira prática de televisão, eu aprendi lá", diz. "É muito triste você ver uma instituição com o nome que tem e há tanto tempo no mercado deixar isso acontecer. Aí é coisa de administração."

A apresentadora disse que, quando fez publicidade e propaganda, teve como colega de classe no ciclo básico de comunicação a atriz Adriana Esteves, que estrelou sua última novela, "Avenida Brasil", em 2012, no papel da vilã Carminha. O G1 tentou contato com a atriz para comentar a situação da Gama Filho, mas a assessoria de Adriana disse que ela com a agenda fechada até depois do carnaval e não iria se pronunciar a respeito.

'Estou 'bolada' até agora', diz Sandra de Sá

Sandra de Sá estudou psicologia na Universidade Gama Filho (Foto: Alexandre Durão/G1)Sandra de Sá estudou psicologia na Universidade Gama Filho (Foto: Alexandre Durão/G1)


A cantora Sandra de Sá cursou psicologia na Universidade Gama Filho entre os anos de 1976 e 1980, mas não se formou. Trancou a matrícula no último período por não conseguir conciliar o curso com a carreira musical. A crise da instituição foi acompanhada pelo Twitter por Sandra, que lamenta o desfecho da história com o descredenciamento feito pelo MEC.

Estou bolada até agora. Como pode o nível [da universidade] cair a esse ponto?"
Sandra de Sá, cantora
e ex-aluna da Gama Filho

"É uma tristeza. Sinceramente, não entendo como uma coisa dessas pode acontecer. Será que é a cabeça torta das pessoas? É querer ter vantagem em tudo? Estou 'bolada' até agora, nem sei que adjetivo usar. Como pode o nível [da universidade] cair a esse ponto?", afirmou Sandra, que está em turnê em São Paulo, em entrevista ao G1.

A cantora lembra que a Gama Filho era uma instituição "cobiçada e disputada" na época em que ela foi aluna. "Era uma das melhores, quando a pessoa passava soltava 'uivos', tinha uma infraestrutura bacana, boas aulas práticas." A cantora afirma que foi lá que fez amigos e iniciou sua carreira artística. "Entrei para o núcleo de atividades artísticas e culturais, andava com meu violão no carro, fui conhecendo as pessoas de teatro, comecei a me inscrever em festivais e entrei para o MPB 80. Foi lá que tudo começou."

Entenda o caso
No fim de 2012, o MEC instaurou um processo de supervisão na Gama Filho e na UniverCidade, motivado por denúncias de irregularidades, deficiência acadêmica e problemas financeiros. No início do ano passado, a crise se agravou, com a deflagração de greve de professores, funcionários e estudantes por falta de pagamento de salários nas duas instituições. A dívida é estimada em R$ 800 milhões.

Diante desse cenário, o MEC criou em abril de 2013 uma comissão de acompanhamento para avaliar a situação, além de outra formada por professores, funcionários, estudantes, pais e sindicatos, entre outros, para identificar soluções e articular acordos.

Ao longo do ano passado, segundo nota divulgada pelo MEC, foram alternados na Gama Filho e na UniverCidade períodos de normalidade acadêmica e resolução de problemas apontados pelo ministério (incluindo o pagamento de professores) com períodos de agravamento da crise, com ocupação de alunos na reitoria, suspensão do fornecimento de água e luz, e ausência de serviços de segurança e limpeza, o que impedia o funcionamento das instituições. No dia 2 de agosto do ano passado, o MEC suspendeu o vestibular das duas universidades, impedindo o ingresso de novos alunos.

No dia 8 de outubro, o grupo Galileo assinou um Termo de Saneamento de Deficiências (TSD) com o MEC, no qual se comprometia a realizar um conjunto de ações de curto, médio e longo prazos. O ministério, então, revogou a suspensão do vestibular, no dia 10 de outubro.
Ao longo de outubro e novembro, foram feitas visitas para acompanhar se o termo estava sendo cumprido. Segundo o MEC, o grupo Galileo não cumpriu as premissas firmadas no contrato, "especialmente na operação de captação de recursos que viabilizaria os aportes essenciais para a consecução das demais ações saneadoras, indicando a reinstalação da crise".

Protesto é contra descredenciamento da Gama Filho e da UniverCidade (Foto: Isabela Marinho / G1)Protesto contra descredenciamento da Gama Filho
e da UniverCidade (Foto: Isabela Marinho/G1)

No dia 12 de dezembro de 2013, diante do descumprimento do que foi acertado, o MEC suspendeu novamente o vestibular da Gama Filho e da UniverCidade, os processos regulatórios das duas instituições e novos contratos para financiamento estudantil (Fies) e bolsas do Programa Universidade para Todos (Prouni). Além disso, houve restrição das instituições à participação no Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec).

Com a instauração do processo administrativo, as duas universidades tiveram um prazo de 15 dias para apresentação de defesa e de 30 dias para recorrerem das medidas cautelares impostas. As instituições se manifestaram no dia 3 de janeiro de 2014, e a proposta foi analisada pelo MEC, que optou pelo descredenciamento delas, com "o objetivo de preservar o interesse dos estudantes e da sociedade por uma educação superior de qualidade".

No dia 14 de janeiro, o MEC publicou no "Diário Oficial da União" o descredenciamento da Gama Filho e da UniverCidade. Reitores e universidades federais do Rio propuseram a federalização destas instituições. Em nota, o MEC afirmou que essa seria uma prática inconstitucional.

Em nota, o grupo Galileo Educacional afirmou que a decisão do MEC é "injusta e arbitrária, que leva o caos a duas das mais tradicionais e respeitadas instituições de ensino superior do Rio de Janeiro." Segundo a organização, que vai recorrer da decisão, o descredenciamento põe "em risco o emprego de 1.600 professores e cerca de mil funcionários administrativos, além de comprometer o futuro de milhares de estudantes."

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