04/06/2015 08h41 - Atualizado em 04/06/2015 08h41

'Empatar' despesas e ganhos de empresa leva tempo; saiba planejar

Cálculo permite detectar quantidade mínima de vendas para zerar contas.
Para manter as portas abertas durante esse período, é preciso planejar.

Karina TrevizanDo G1, em São Paulo

Ponto de equilibrio (Foto: Editoria de Arte/G1)

Entre abrir um novo negócio e chegar ao chamado ponto de equilíbrio – o "break even", estágio em que a empresa ainda não lucra, mas consegue empatar as receitas com as despesas para zerar o orçamento do mês –, os empresários passam por um período que requer muito planejamento. O tempo até conseguir equiparar ganhos e gastos precisa ser estimado antes da inauguração. Mesmo assim, há casos em que o ponto de equilíbrio demora mais a chegar e o negócio acaba fechando as portas.

Para que o empresário não fique no prejuízo, é necessário entender o próprio negócio, dizem os especialistas. O consultor de negócios Daniel Schnaider aponta que é possível chegar ao “xis da questão” do ponto de equilíbrio com alguns dados em mãos. “O ponto de equilíbrio é o número de unidades que eu tenho que vender do produto para a minha receita e minha despesa ficarem equacionadas”, diz o especialista em estratégia.

Calculadora na mão
Há três pontos fundamentais para fazer esse cálculo, ensina Schnaider. “O primeiro deles é o custo fixo da operação, ou seja, quanto custa para manter a empresa aberta. Depois vem o custo variável, que é o quanto custa criar cada unidade do produto vendido ou serviço prestado. O terceiro é o preço de venda do produto ou serviço”, lista ele. “O custo fixo dividido pelo preço de venda menos o custo variável vai me dar quantas unidades tenho que vender para pagar o custo fixo”, ensina (veja um exemplo do cálculo na imagem acima).

Se em 24 meses a empresa não atingiu o equilíbrio, alguma coisa está errada"
Adalto Gonçalves, professor de finanças

Seguindo essa fórmula, o dono de um pequeno negócio de sapatos, por exemplo, que tenha um gasto fixo mensal de R$ 6 mil com despesas como o espaço e funcionários, gaste R$ 20 para fabricar cada sapato e venda a unidade por R$ 50 precisa comercializar pelo menos 200 unidades por mês para zerar as contas da empresa, sem lucro nem prejuízo. “Isso significa pelo menos pagar as contas e sobreviver”, diz Schnaider.

Essa não é a única conta necessária para o planejamento de um novo empreendimento. Antes de abrir o negócio, é preciso fazer uma estimativa de quanto tempo vai levar para atingir o ponto de equilíbrio. Além disso, é necessário fazer outro cálculo, lembra Adalto Barbaceia Gonçalves, professor da pós-graduação em finanças do Insper: “Se a empresa acredita que vai levar 1 ano para chegar ao equilíbrio e tiver custo fixo de R$ 5 mil, precisa ter no caixa pelo menos R$ 60 mil para se manter nesse período”, diz ele, ressaltando a importância de ter um capital de reserva para os primeiros meses.

Para a Elefante Verde, o ponto de equilíbrio é a quantidade de franquias que precisam ser vendidas por mês, conta o empresário Fábio Duran (Foto: Divulgação)Para a Elefante Verde, há uma quantidade de
franquias que precisam ser vendidas por mês para
atingir o equilíbrio, conta o empresário
Fábio Duran (Foto: Divulgação)

Na prática
Fábio Duran, um dos sócios do negócio de marketing digital Elefante Verde, de Mogi das Cruzes (SP), tem na ponta da língua o resultado do cálculo que aponta o ponto de equilíbrio de seu negócio. Para zerar as contas da empresa, que trabalha no esquema de franquias, precisa vender duas unidades por mês. “Nós estamos muito próximos do ponto de equilíbrio”, afirma.

A Elefante Verde é especializada em marketing digital para pequenas e médias empresas, e oferece serviços para torná-las presentes na internet. Também foi feito o cálculo do tempo estimado para novos que franqueados atinjam o ponto de equilíbrio com a unidade: entre 6 e 12 meses.

O planejamento, no entanto, precisou ser refeito várias vezes com o negócio em funcionamento, já que a empresa passou por mudanças de estruturação desde que foi fundada, em 2011, pelo empresário Caio Sigaki.

Após a inauguração, o ponto de equilíbrio foi atingido cerca de 6 meses depois, segundo Duran. Ao longo dos anos seguintes, porém, a empresa ganhou outros sócios até chegar ao número atual de oito componentes. O valor investido aumentou e a estimativa de ponto de equilíbrio foi refeita a partir do novo modelo.

Para equilibrar as contas, a OdontoCompany precisa iniciar um mês com a agenda preenchida, revela Paulo Zahr (Foto: Divulgação)Para equilibrar as contas, a OdontoCompany
precisa iniciar um mês com a agenda preenchida,
revela Paulo Zahr (Foto: Divulgação)

“O investimento inicial foi baixo, tudo começou com R$ 10 mil. Já no final de 2011 havia alcançado o ponto de equilíbrio por ser mais enxuto o modelo. Depois vieram sócios investidores e passou para R$ 150 mil. Depois dessa primeira rodada, em 2013 tiveram mais duas rodadas de investidores, e foram levantados mais R$ 300 mil. Mas tudo isso é para estruturar, crescer e ter caixa para novas contratações. A gente ainda não tira dinheiro da empresa”, relata Duran.

Outro caso é o do dentista Paulo Zahr, criador da rede de franquias OdontoCompany. Ele conta que logo que abriu o primeiro consultório, em São José do Rio Preto (SP), era necessário que pelo menos 75% do tempo de trabalho fosse ocupado com atendimentos de clientes – ou seja, o ponto de equilíbrio era 75% da agenda preenchida.

O negócio foi aberto nos anos 1990, época de inflação descontrolada, lembra o empresário. O ponto de equilíbrio foi atingido no segundo semestre após a inauguração. “Quando a gente abriu foi uma época de inflação, uma loucura, acordava com um preço e dormia com outro. Naquela época você não sobreviveria se demorasse mais do que isso [para alcançar o ponto de equilíbrio]”, conta Paulo.

Se você planejou vender 5 mil unidades e descobre que vende 2,5 mil, tem que se planejar novamente"
Daniel Schnaider, consultor de negócios

Hoje, a proporção de horários lotados contra os livres nas agendas dos consultórios para que os gastos pelo menos empatem com os ganhos é outro. A meta calculada é que, com no mínimo 8 cadeiras por consultório, a agenda de um mês já esteja lotada quando ele começa. “Estamos em maio já trabalhando a agenda de junho. Se não está garantida a agenda, tem que lançar mão de uma campanha [de propaganda]”, diz Paulo. Com esse esquema, a estimativa para o franqueado da OdontoCompany é de 6 meses para atingir o ponto de equilíbrio.

A conta ainda não fecha e o caixa está no fim. E agora?
Segundo Adalto Barbaceia Gonçalves, “o tempo máximo de tempo de equilíbrio que uma empresa tem que pensar é 24 meses. Se em 24 meses não atingir, alguma coisa está errada”.

Muitas vezes, o planejamento se torna errado já com o negócio em andamento. “Se você planejou vender 5 mil unidades e descobre que vende apenas 2,5 mil, tem que se planejar novamente. Eu posso fazer alguma mudança para vender mais? Posso mudar um componente do produto para diminuir o custo variável [custo para produzi-lo]? São atitudes que a empresa toma depois de descobrir que o planejamento estava errado”, diz Daniel Schnaider.

Veja abaixo 5 dicas para empresários que ainda não atingiram o ponto de equilíbrio:

selo economia (Foto: G1)

Evitar ter um volume muito grande de estoque e preferir ter “mais fornecedores que possam ser parceiros” do que funcionários fixos durante os primeiros meses de funcionamento da empresa são algumas formas de diminuir o custo fixo mensal, explica Gonçalves.

Outra dica é identificar despesas que podem diminuir, como gastos adicionais de telefone ou energia elétrica.


selo ecnopmia (Foto: G1)

Segundo Gonçalves, é preciso “saber crescer forma gradual”. “Às vezes começar pequeno significa até começar com um grau de informalidade maior, para depois transformar aquilo em algo efetivo. É como se fosse um teste”, diz o especialista. “A pessoa pode começar como representante comercial naquela área antes de abrir uma empresa para vender os produtos, por exemplo.”

Por sua vez, Schnaider adverte que negócios que começam grandes demais podem ter dificuldades para vender o número mínimo de produtos para zerar as contas. “Se quiser fazer desde o começo uma coisa grande, vai ter que aumentar o preço de venda e aí não se consegue atingir o número de unidades”, diz.


selo economia (Foto: G1)

Gonçalves alerta que o novo empresário precisa estar prevenido durante o tempo em que não irá tirar dinheiro da empresa.

“Ele precisa incluir os gastos pessoais dele como uma necessidade nesse período – um valor que ele vai precisar guardar como pessoa física para sobreviver sem ganhar nada nesse momento.”


selo economia (Foto: G1)

Oferecer um produto ou serviço por um preço incompatível com o mercado é um erro que precisa ser evitado. “Isso é muito delicado”, diz Gonçalves. “Se estiver errando para baixo, provavelmente está com volume de venda que vai crescer mas não vai ter margem suficiente para cobrir o custo fixo. Se estiver muito alto, não consegue volume suficiente de vendas para gerar a margem necessária. Como se descobre isso? Fazendo um comparativo com o concorrente. É preciso entender se está realmente atendendo à necessidade daquele cliente.”


selo economia (Foto: G1)

Para explicar esse ponto, Gonçalves usa o exemplo fictício de uma doceria que vende produtos com qualidade superior às concorrentes locais e, logo, mais caros. Por isso, a empresa não estaria conseguindo atingir o equilíbrio. “Antes de montar, o empresário tem que responder à pergunta: existem clientes na região que realmente reconhecem que esse produto é diferenciado, a ponto de ser possível colocar um preço maior e a clientela achar que vale? Precisa ver se aquela região precisa disso”, diz.

“Se a região precisa disso e a loja não está vendendo o suficiente, talvez haja uma falha de comunicação entre a empresa e a clientela. Será que ele está divulgando corretamente? É preciso atrair pessoas para conhecer aquele produto. Pode ter algum erro no marketing do negócio. Agora, se naquela região não houver necessidade desse produto, pode sim chegar num nível um pouco abaixo de qualidade e ficar com um preço mais competitivo.”

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