Crescimento da inadimplência, juros elevados e mais exigências para a tomada de empréstimos fazem o momento atual não muito favorável para pegar dinheiro emprestado. Isso porque, mesmo que isso não resulte em queda nas concessões, já é possível notar impactos no custo do crédito e na inadimplência do setor financeiro.
Mas por que o crédito está tão caro?
Há vários motivos. O primeiro deles é a relação direta entre os juros cobrados pelas instituições financeiras e a taxa básica do país, a Selic – que subiu de 2% para 13,75% nos últimos dois anos. Mas o 'encarecimento' do crédito também tem relação com o aumento da inadimplência e as dúvidas sobre o futuro da economia brasileira.
Segundo o economista da Boa Vista Flavio Calife, um exemplo desse cenário é o crescimento observado em linhas mais arriscadas, como o cheque especial e o cartão de crédito – duas das modalidades mais caras, com taxas anuais de 134,6% e 88,5%, respectivamente. Os dados são do BC, referentes a setembro.
“A maior parte das pessoas que tomam esse tipo de crédito, muitas vezes, não consegue pegar linhas com condições melhores. E quanto mais essas modalidades crescem, maior é a chance de que haja um problema no futuro, já que essas são modalidades que têm juros elevados e, portanto, um risco maior de inadimplência”, explicou Calife.
Outro ponto, citam os especialistas, são as expectativas sobre a política e a economia do país. De acordo com a especialista em finanças da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL), Merula Borges, um dos componentes que entra na conta agora é a incerteza que ainda existe no mercado sobre a política fiscal do próximo governo.
“É muito importante para o credor saber qual a direção que o país vai seguir para que ele consiga traçar uma expectativa. Incerteza também é risco para quem empresta dinheiro, e quanto menos clareza, mais difícil tende a ficar o acesso ao crédito”, disse Borges.
Já para a especialista de crédito do Serasa, Amanda Rapouzo, aspectos como a evolução do mercado de trabalho, da inflação e da renda também ficam no radar.
“A inflação e o desemprego começam a ficar um pouco mais controlados, mas todo esse cenário econômico ainda pode ter algum impacto no crédito, principalmente em relação àquilo que possa afetar a capacidade de pagamento do consumidor”, afirmou.
Se não agora, quando será a melhor hora para tomar crédito?
A principal recomendação é que o consumidor, se possível, espere até que o cenário da economia e da política fiscal brasileiras esteja mais claro. Com maior previsibilidade, a expectativa é que as taxas de juros recuem, e o crédito fique mais acessível.
Para Maurício Godoi, especialista de crédito e professor da Saint Paul Escola de Negócios, no entanto, esse quadro só deve começar a se desenhar a partir do segundo trimestre do ano que vem, na medida em que as incertezas que temos hoje fiquem menos acentuadas. Ele pondera, porém, que mesmo com a melhora, o acesso ao mercado de crédito ainda deve continuar difícil.
“Mesmo com uma eventual redução da Selic no ano que vem, há a possibilidade de que as instituições financeiras continuem a subir os juros em 2023, exatamente pelos sinais de excesso de endividamento e de menor renda das famílias e até pela desaceleração da atividade, com o PIB [Produto Interno Bruto] do País sem crescer e a economia internacional em recessão”, afirmou Godoi.
“Tudo isso acaba dificultando a tomada de crédito. Já temos visto credores mais exigentes, preferindo operações com garantia e oferecendo prazos menores para o pagamento, e com menor apetite por risco. E a tendência é que isso continue nos próximos meses, então é preciso cautela”, completou o especialista.
E quais são os cuidados necessários na hora de pegar um empréstimo?
Os especialistas destacam alguns pontos de atenção – que também servem para aqueles que não podem esperar por um momento melhor para a tomada de recursos.
O primeiro ponto, destacam, é o controle do orçamento. Antes de pegar um empréstimo, coloque na ponta do lápis todas as receitas e despesas mensais da família – incluindo os gastos pontuais e as contas recorrentes, como de aluguel, gás, água, luz e mercado.
“Isso serve para que ele consiga ver qual é a capacidade efetiva que ele tem dentro do orçamento para conseguir arcar com uma dívida nova. Além disso, colocar tudo no papel também ajuda aqueles que não possuem uma renda mensal fixa a ter um controle melhor do que entra e sai de dinheiro”, disse Rapouzo.
Outro ponto importante é o cuidado com o custo efetivo total (CET), que representa o valor total que será realmente pago em um empréstimo. Ele é expresso por uma taxa percentual anual e considera não apenas a taxa de juros do contrato, mas também os tributos e tarifas que incidem sobre a operação, seguros e outras despesas.
Outras dicas, são comparar as taxas cobradas entre instituições financeiras e linhas de empréstimos (que pode ser feita por meio de marketplaces de crédito) e a troca de dívidas caras (como de cartão de crédito) por outras mais baratas (como o crédito consignado, por exemplo).
“Por fim, acho que também é muito importante ter cuidado com golpes”, alerta Rapouzo. “O consumidor não deve antecipar nenhum valor, independente da modalidade de crédito ou do credor com quem contratou a operação”, completou a especialista do Serasa.