As chamadas "pedaladas fiscais" – atraso de repasses a bancos públicos pela execução de despesas do governo – existiam no governo Fernando Henrique Cardoso, mas assumiram proporções maiores na gestão da presidente Dilma Rousseff, segundo números do Banco Central (BC). Na comparação, elas somaram R$ 1 bilhão e R$ 948 milhões, respectivamente, no fim dos anos de 2001 e 2002, no governo FHC. No fim de 2013 e 2014, no governo Dilma, os valores chegaram a R$ 36,07 bilhões e R$ 52 bilhões, respectivamente.
As pedaladas fiscais são um dos fatores apontados no pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff que está sendo analisado pelo Congresso Nacional.
O levantamento foi publicado no fim de março no relatório do BC que traz dados sobre as contas públicas de fevereiro.
Governo Lula
Durante o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ainda segundo o levantamento do Banco Central, a prática continuou a ser adotada. No fim de 2003, primeiro ano da gestão de Lula, havia um passivo do governo com bancos públicos e com fundos, como o FGTS, contabilizado de R$ 1,2 bilhão, passando para R$ 1,07 bilhão no fim de 2004.
Ao fim dos anos seguintes, esse expediente continuou sendo observado. De acordo com dados do Banco Central, no fechamento de 2005, 2006 e de 2007, por exemplo, as pedaladas fiscais somaram, respectivamente, R$ 1,06 bilhão, R$ 799 milhões e R$ 997 milhões.
O mesmo aconteceu nos anos subsequentes dos dois mandatos de Lula. No fechamento de 2008, 2009, 2010, por exemplo, os números do BC indicam um passivo com os bancos públicos e fundos de R$ 2,3 bilhões, R$ 4,04 bilhões e R$ 8,43 bilhões, respectivamente.
Aumento nas pedaladas
No governo da presidente Dilma Rousseff, a prática, condenada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), teve prosseguimento, em dimensões maiores. De acordo com dados do Banco Central, as pedaladas somaram R$ 12,98 bilhões no fim de 2010 – primeiro ano do mandato de Dilma – avançando para R$ 19,7 bilhões em dezembro de 2012.
Já no fechamento de 2013 e de 2014, por sua vez, o atraso nesses pagamentos, saltou para R$ 36,07 bilhões e R$ 52 bilhões, respectivamente.
A oposição afirma que as pedaladas foram usadas para marcarar o resultado ruim que as contas públicas teriam em 2014 – anos de eleições presidenciais –, caso os passivos fossem quitados pelo governo.
No ano passado, os dados do Banco Central mostram que a prática continuou. Em janeiro de 2015, o passivo do governo com bancos públicos somava R$ 53,76 bilhões, alcançando R$ 58,68 bilhões em novembro do ano passado.
Em dezembro de 2015, o governo alega que quitou os passivos, mas o balanço do BC ainda indicava um estoque de R$ 11,31 bilhões em "pedaladas fiscais".
Pedaladas e impeachment
De acordo com o pedido de impeachment, assinado por dois juristas, Hélio Bicudo e Miguel Reale Junior, além da advogada e professora da USP Janaina Paschoal e representantes de movimentos contra a corrupção, o objetivo das pedaladas foi "forjar uma situação fiscal do país que inexiste, sem o temor de afrontar a lei para chegar ao resultado esperado".
As pedaladas fiscais também foram consideradas irregulares pelo TCU ao recomendar a reprovação das contas do governo Dilma em 2014.
Segundo parecer do ministro Augusto Nardes, do TCU, pela rejeição das contas do governo Dilma em 2014, ao adotar manobras para aliviar, momentaneamente, as contas públicas, o governo desrespeitou princípios constitucionais e legais que regem a administração pública federal. O cenário no ano passado foi classificado por ele como de “desgovernança fiscal”.
Defesa do governo
Chamado para falar na comissão que analisa o pedido de impeachment na Câmara na semana passada, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, afirmou que a prática adotada pelo governo estava de acordo com o entendimento do TCU vigente na época. Ele também disse que o atraso no pagamento foi implementado “corretamente” no governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Barbosa admitiu, porém, que o valor dessa conta suplemento (que operacionaliza o pagamento dos passivos) durante alguns meses, ao longo de 2013, e principalmente no primeiro semestre de 2014, "ficou com valor execessivamente negativo contra a União e por um período longo de tempo".
"Essa conta suplemento, que já existe há muito tempo, essa metodologia de pagamento, não foi objeto de questionado por parte do TCU ao analisar as contas de 2011, 2012 e 2013", explicou Barbosa na comissão que analisa o pedido e impeachment.