de olho no orçamento

Por Alexandro Martello, Jéssica Sant'Ana e Bianca Lima, g1 e GloboNews — Brasília


Secretário Rogério Ceron explica proposta de mudar piso de gastos em saúde e educação

Secretário Rogério Ceron explica proposta de mudar piso de gastos em saúde e educação

O secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, informou que a área econômica encaminhará, no segundo semestre deste ano, uma proposta de emenda à Constituição (PEC) para alterar o formato de correção do piso (valor mínimo) dos gastos com saúde e educação a partir de 2025.

No próximo ano, conforme divulgado na proposta de arcabouço fiscal, o piso para as despesas com saúde e educação voltarão a ser reajustadas pelas regras antigas — que vigoravam antes do teto de gastos, implementado em 2017.

Com isso, os gastos em saúde deverão ser de, ao menos, 15% da receita corrente líquida e os de educação, de 18% da receita de impostos. Somente o retorno dessa regra, explicou Ceron em entrevista ao g1 e à GloboNews, representará um aumento de cerca de R$ 30 bilhões nessas despesas, a maior parte destinada à área de Saúde, somente em 2024.

"Se você olhar o passado [antes do teto de gastos], você indexa [essas despesas] pelo critério da receita. Quando cria vinculação direta com a receita, cria movimentos de muita volatilidade. Em um 'boom' de crescimento [da economia, o piso de saúde e educação sobe]. E em um ciclo de crescimento de baixa, dá o rebote para baixo [nesses gastos]", declarou ele.

Ele lembrou que, ao mesmo tempo, um grupo de trabalho criado pelo Ministério do Trabalho está debatendo uma política de correção permanente para o salário mínimo. Esse tema, porém, não precisa de alteração na Constituição. Então, não será incluído na PEC que será enviada para debater os pisos em saúde e educação.

Como pode ser a nova regra

O secretário do Tesouro Nacional disse o objetivo da nova regra para o piso em saúde e educação é que ela assegure um aumento real nessas despesas, ou seja, acima da inflação. Porém, que seja mais previsível do que vincular o crescimento dessas duas despesas à variação da receita.

Uma das possibilidades em estudo é vincular o piso em saúde e educação ao crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) per capita. Segundo Ceron, essa pode ser uma meta mais previsível e também compatível com a proposta de arcabouço fiscal — a nova regra para as contas públicas.

"[Vincular as despesas em saúde e educação ao] PIB per capita é uma possibilidade. Tem mais a ver com o ganho efetivo per capita, o ganho de produtividade per capita, de valor agregado, do que uma mera indexação com a receita [arrecadação], declarou Ceron.

Somente essa vinculação ao PIB per capita, segundo o secretário, já representaria um amento real, ou seja, acima da inflação. "PIB per capita pega a produtividade, que sempre está obtendo na economia. Acaba sendo um critério mais sustentável em linhas gerais", declarou.

Ele ressaltou, contudo, que o modelo de correção a ser proposto para 2025 ainda não foi fechado pela área econômica.

"Não sei se é um PIB per capita. Pode vir a ser isso, mas não é esse o ponto. Isso vai ser discutido, mas há um leque de possibilidades. Pode ser um valor real por ano, mas alguma coisa que seja mais estável e que oscile menos. E que seja sustentável. O objetivo é elevar o patamar per capital e gradativamente, mas de forma sustentável", declarou.

Com a regra do teto de gastos, ficou estabelecido que o piso para gastos com saúde e educação fosse corrigido apenas pela variação da inflação, não sendo mais obrigatório um gasto acima disso.

Discussão com a sociedade

O secretário do Tesouro Nacional explicou que as novas regras para o piso de gastos em saúde e educação serão discutidas com os setores responsáveis, as chamadas áreas fins.

"O que o ministro tem colocado é abrir um debate racional e consistente com as áreas fins, para criar critérios de correção que sejam mais sustentáveis e perenes no tempo. Para evitar esse vai e volta [nas despesas, por conta de estarem atreladas a um patamar da receita líquida], que é interminável", declarou.

Em rede social, Élida Graziane Pinto, procuradora do Ministério Público de Contas de São Paulo, observou que os pisos estaduais e municipais são os mesmos na Constituição Federal desde 1988, enquanto que os pisos federais foram redesenhados várias vezes.

"O aumento da complementação federal ao Fundeb, prometido de forma escalonada até 2026 pela EC 108, foi praticamente neutralizado pela inibição da arrecadação do ICMS e do IPI no ano passado. Cabe, pois, cautela com mais uma possível retração do gasto federal em saúde e educação", acrescentou ela.

Entenda os pisos para saúde e educação

  • Até 2016, antes da regra do teto de gastos, o piso (valor mínimo de gastos) era ligado a um patamar da receita líquida. No caso da saúde, a regra fixava um piso de 13,7% da receita líquida para 2017, de 14,1% para 2018, de 14,5% para 2019 e de 15% a partir de 2020. Para educação, o mínimo era de 18% da receita de impostos.

Com essa regra que vigorava antes do teto de gastos, se a economia apresentava crescimento, isso se refletia na arrecadação de impostos. E geralmente os gastos com saúde e educação tinham um ganho real, ou seja, acima da alta dos preços (medida pelo IPCA).

A partir do teto de gastos, que teve validade entre 2017 e 2023, ficou estabelecido que o piso para gastos com saúde e educação seria corrigido apenas pela variação da inflação do ano anterior - não sendo mais obrigatório um gasto acima disso. Para que as despesas em saúde e educação crescessem acima da inflação, teriam de ser cortadas outras despesas.

  • Cálculos da Instituição Fiscal Independente (IFI), ligada ao Senado Federal, apontam que a área de Saúde deixou de receber R$ 45,1 bilhões em verbas federais, nos últimos seis anos, em razão dos limites impostos pelo teto de gastos. Na Educação, o orçamento deveria ter sido R$ 7,2 bilhões maior.

Com o fim do teto de gastos neste ano e sua troca pelo chamado arcabouço fiscal, a nova regra para as contas públicas, voltou a vigorar a regra anterior - com base na receita líquida. Somente o retorno dessa regra anterior vai gerar um aumento de R$ 30 bilhões nas despesas dessas duas áreas em 2024.

O governo do presidente Lula quer acabar com essa vinculação do patamar mínimo dos gastos em saúde e educação à receita. Secretário do Tesouro, Rogério Ceron, o objetivo será fixar um piso que assegure aumento acima da inflação - algo que não estava garantido pela regra do teto de gastos -, mas de forma mais previsível que a vinculação à receita.

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