O preço da dúvida – ou seria da mentira?
A reação positiva do mercado financeiro no Brasil após a abertura do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff não é uma surpresa. Se tivesse sido negativa, também não seria. Bolsa de valores abriu em alta e o dólar, em queda nesta quinta-feira (3). Esse movimento não mostra consistência ou tendência. Até porque não há como prever o "andar da carruagem" pelo caos político instalado no país.
Enquanto o país tomava o primeiro lanche da manhã, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, apareceu numa entrevista coletiva, disse e repetiu várias vezes que a presidente Dilma Rousseff mentiu. Neste contexto, esta primeira sinalização dos investidores não pode ser considerada uma avaliação de que a saída de Dilma seria a melhor solução para o país. É enorme a quantidade de dúvidas que precisam ser esclarecidas até que o quadro tenha alguma nitidez. Por exemplo, se o processo avançar com velocidade, pode antecipar uma renúncia da presidente? A natureza das acusações que serão analisadas pelo Congresso Nacional atinge o vice presidente Michel Temer?
Com a declaração de Cunha, rebatendo agressivamente a presidente Dilma, o quadro político se agrava, se é que isso era possível. Se começar a valer um toma lá da cá ao vivo e dinâmico, as incertezas podem aumentar. Portanto, as negociações no mercado financeiro na manhã não são, necessariamente, uma precificação dos efeitos das ações do deputado. No foco dos investidores, assim como da sociedade, não há uma liderança legítima para conduzir o país, mesmo que seja para apitar a luta livre entre o Legislativo e o Executivo.
Tão ou mais caras que as dúvidas políticas, são as econômicas. Ajuste fiscal? Aumento de juros? Inflação alta? Isso não é problema do governo ou dos congressistas. O Banco Central, que tem lá alguma autonomia, confirmou na ata da última reunião do Copom que os juros vão subir. E não deve demorar. Com a inflação resistente e sem ajuda do equilíbrio nas contas públicas, a dose do remédio do BC tem que aumentar, agravando as distorções que corroem os fundamentos do país. Enquanto o preço médio dos alimentos no mundo caiu cerca de 18% em um ano (dados da FAO), aqui eles subiram quase 10%. Nem o fator natureza explica tamanha diferença.
A produção industrial sobrevive nem se sabe como. Segundo o IBGE, o setor teve queda de 0,7% em outubro. Em um ano, a queda chega a 11,2%. O oxigênio está na reserva e, em Brasília, quem comanda a válvula está gritando pelos pulmões sem considerar o risco de asfixiar o país inteiro. E quando o grito vem com mentiras, o consumo duplica. Com menos oferta, o preço do cilindro do oxigênio vai aumentar – e não há juros altos que controlem essa alta.