'Não haverá solução mágica para resolver o que não fizemos até agora', diz Goldfajn
O ano de 2015 está quase no fim e a pauta econômica ficou vergonhosamente abandonada. O agravamento da crise política foi afastando as prioridades capazes de estancar a piora da economia, principalmente a deterioração do mercado de trabalho e a resistência da inflação. O desejo de sair da crise é o único consenso que emerge hoje no país – mas nem isso significa unidade nas soluções. O que já está claro para todos, mesmo entre pensamentos políticos contrários, é que não será por mágica ou por milagre.
“Não podemos mais ficar no autoengano. Não haverá solução mágica para resolver o que não fizemos até agora. Se as soluções fossem fáceis mesmo, já teriam sido adotadas. Não adianta pensar numa guinada populista porque estamos sem dinheiro. As incertezas politicas e econômicas estão entrelaçadas e devem continuar com uma nova queda do PIB desemprego subindo em 2016”, avalia o economista-chefe e sócio do Itaú Unibanco, em entrevista exclusiva ao blog.
Para Goldfajn, que foi diretor do Banco Central na administração de Arminio Fraga e de Henrique Meirelles, o país vive a “ressaca” do excesso de gastos públicos, acima dos limites do sustentável. “Não adianta pensar que mais um drinque no café da manhã vai rebater a ressaca da noite anterior. A ressaca virá, não adianta ficar postergando”, disse ao G1. Pela previsão do banco, este ano o rombo nas contas públicas será de 1,2% do PIB, ou seja, o país ficará com a conta negativa em dezenas de bilhões de reais. Para ajustar as contas e devolver o equilíbrio econômico ao país, Ilan fala numa economia nos gastos públicos da ordem de 3,5% do PIB, um esforço gigantesco e muito custoso.
“A receita correta não é a mais divertida. O que é curioso é que está todo mundo cansado do ajuste fiscal sem ele ter começado. Melhorar a eficiência do Estado não é uma coisa de curto prazo e não se consegue economizar 3,5% do PIB pela eficiência. Esses 3,5% vão ter que sair do bolso de alguém. O que nós precisamos é de líderes que possam conduzir um processo que vai beneficiar a todos em algum momento. E para isso tem que ter confiança da sociedade”, avalia o economista.
Perguntado sobre a falta de crédito, especialmente para as empresas, Goldfajn rebate que o que está escasso na praça é vontade de investir, dado o tamanho da insegurança com o futuro do país. Em conversas com empresários por todo país, o executivo explica que o que está faltando no mercado é demanda, ou seja, consumidor querendo comprar. Junta-se a isso, o aumento brutal nos custos acumulados: energia, transporte, mão de obra. De novo, a confiança, ou a falta dela, fecha o quadro na economia real.
“Se a confiança estivesse alta e estivesse faltando óleo para fazer o motor andar, seria o caso de falar de crédito para o dia a dia das empresas. Mas a confiança está no pior nível da série das pesquisas. Recuperar a confiança leva a tempo – construir leva mais tempo que destruir. A reclamação que mais escutamos dos empresários é sobre vendas (em queda) e custos (em alta). Quando eles olham para frente só querem sobreviver – se você é empresário não vai vender com margem negativa, vai repassar os custos – o que é melhor do que vender com prejuízo”, disse Ilan Goldfajn.
E quem está na outra ponta deste cenário? Os trabalhadores.
“O trabalhador poderia aceitar um reajuste de 8% se ele acreditasse que a inflação fosse baixar, que as coisas fossem melhorar mais rápido. Mas a indicação de que o ano que vem vai ser tão ruim faz ele se defender e querer mais. Essa dinâmica alimenta a inflação.
A inflação leva tempo para ceder, ela não cai de maduro, não cai na mesma velocidade com que ela sobe. Uma hora acaba caindo, mas demora. A piora das expectativas fortalece a inércia inflacionária, ou seja, se você não enxerga um futuro melhor, você se protege. A economia como um todo reage num movimento que aprofunda a recessão”, analisa o economista do Itaú Unibanco.
Sobre as conquistas sociais da última década, Ilan refuta as teses de que elas teriam sido enganosas, ou artificiais. "A nova classe média surgiu do aumento do emprego e da renda, dos salários”, ele defende. Mas infelizmente, essa visão não imuniza o alto risco de perdas e reversões negativas nos próximos anos.
“Essa é a parte mais difícil e mais triste. Uma boa parte das conquistas teve mais a ver com uma melhora do mercado de trabalho que com as transferências de renda, como o bolsa-família. A nova classe média veio do emprego, do salário subindo. O problema foi que os salários foram aumentando sem que a produtividade acompanhasse – não havia justificativa para ter uma renda tão alta. Ainda assim, temos que tomar muito cuidado para não haver uma reversão aguda dessas conquistas.
Agora, com a crise, o salário real está caindo, o desemprego está subindo rapidamente. A pior coisa que pode acontecer é a nova classe média ter de voltar para a classe baixa. As pessoas não querem isso, claro, principalmente depois que já experimentaram uma vida melhor. Se as soluções fossem fáceis mesmo, já teriam sido adotadas. Elas não são fáceis e qualquer guinada populista terá perna curta”, alerta Ilan Goldfajn.