Seria um bocado politicamente incorreto ter ciúmes, ou inveja mesmo, da visita de Barack Obama à Argentina. Por compaixão ou honestidade intelectual é preciso admitir que os argentinos não só merecem este momento como precisam muito dele. A Argentina foi ignorada pela comunidade internacional nos últimos 15 anos e a escolha de Obama faz as porteiras se abrirem novamente ao país. O peso político da presença do presidente mais poderoso do mundo nos nossos vizinhos também age como reconhecimento de que os argentinos vêm fazendo "escolhas certas" desde a eleição de Maurício Macri em 2015.

 

Entre elogios e degustações gourmets, Obama assumiu, simbolicamente, um papel de fiador da recuperação esperada na economia argentina e, principalmente, na reconquista da confiança dos investidores internacionais. Perguntado pela imprensa que o acompanha na visita, o presidente americano deu alguma atenção ao Brasil e fez torcida na superação da nossa crise. E mais: nos incumbiu de uma baita responsabilidade. "Precisamos de um Brasil forte e eficiente para nossa própria economia e para a paz mundial", disse Obama.

 

Mr. President, posso lhe garantir que, aqui, a torcida não é diferente. O ego do Brasil é do tamanho do seu território, mas talvez a gente não tivesse pensado num papel tão relevante no cenário internacional. O brasileiro quer ser o cidadão do futuro e levar sua criatividade nata pelos cantos do mundo, mas colaborar para a “paz mundial” é, certamente, um desafio e tanto – se não uma honra. Por incrível que pareça, representar este papel num momento de tanta turbulência internacional pode ser menos difícil do que lhe atender no outro quesito.

 

Na parte em que o senhor nos pede que sejamos “fortes e eficientes”, podemos apenas lhe oferecer um alerta de que será mais penoso e demorado. Olhando daí da Argentina, onde a inflação roda na casa dos 35% e o crescimento patina na última década, e avistando o Brasil com uma inflação na casa dos 10% e um PIB em profunda recessão, pode lhe dar a impressão de que o nosso problema é menor. Sem comparar números ou indicadores, lhe garanto que há uma enorme diferença entre nós e os vizinhos, e é precisamente por isso que o sr. está aí e não aqui. Os argentinos estão começando a fazer o caminho de volta. Nós.. bem, nós estamos ainda caminhando para trás, sem saber exatamente aonde vamos estacionar.

 

Como o sr. está em viagem, imagine, foi à Cuba!, fica difícil ser atualizado de tudo que se passa pelo mundo. Sem contar o horror que atinge a Bélgica e milhares de europeus, reféns do terrorismo e impotentes diante dos radicais.  Aproveito esta missiva para lhe contar, rapidamente, como estamos. Assim, ficará mais fácil assimilar o tamanho da dificuldade que enfrentamos por aqui. O desemprego cresce vertiginosamente. Só em fevereiro, 104 mil pessoas perderam o emprego formal. As pesquisas que acompanham o mercado de trabalho indicam que ainda está em curso um processo de correção do nível de desocupação na economia e, assim sendo, corremos o risco de fechar 2016 com uma taxa de desemprego acima de 10%.

 

Sobre a inflação, há um dado fresquinho e, abusando um pouco da realidade, uma boa notícia. O IBGE divulgou nesta quarta-feira (23) o IPCA-15 de março, uma espécie de prévia do índice oficial de inflação que adotamos no Brasil. Ele veio baixo (0,43%) e por isso tirou nos tirou do patamar de dois dígitos, onde estávamos há 4 meses (9,95%). No ranking dos países do G-20, estamos em terceiro lugar com a inflação mais alta. Na média, o índice de preços ao consumidor do grupo está em 2,6% (dados de janeiro). 

 

Sobre o crescimento, não há ponto de vista que satisfaça um otimista. Este ano o PIB pode cair mais de 4% – pior do que os 3,6% de 2015, marcando a nossa biografia com o pior biênio da história. O sr. pode imaginar o tamanho do estrago que esta composição descrita acima é capaz de fazer numa economia. O sr. pode também nos perguntar: e o que estão fazendo para superar este momento?

 

Veja bem, Mr. President, deixei esta parte para o final, mesmo ela sendo a mais relevante. O Brasil também vive uma das piores crises políticas e institucionais da história. As contas públicas do país estão muito desequilibradas e em rota de deterioração. O nosso Banco Central elevou a taxa de juros a incríveis 14,25% ao ano, e a inflação só fez subir. Esta queda dos preços que lhe contei acima, é fruto da recessão, não resultado de uma boa política econômica do governo. Como o sr. vê, para recuperarmos nossa força e buscarmos mais eficiência, vamos ter que, primeiro, resolver o vácuo de governabilidade e liderança que acomete o nosso país.

 

Mas quem sou eu para estragar a sua viagem. Aproveite seu bife de chorizo e o delicioso doce de leite argentino. Ah, e um vinho, claro! Os Malbec são uma ótima pedida. Hasta Luego!