Depois de soltar um inesperado pacote de bondades com dinheiro público, o presidente interino Michel Temer se deu conta de que tinha abusado da confiança que os investidores do mercado financeiro lhe deram até agora. Este “sujeito”, o mercado, é sensível ao fisiologismo e entortou a boca ao perceber que o governo afrouxou o cinto além da conta. Até agora o peso da nova equipe econômica, as aprovações no Congresso Nacional e a sinalização das medidas de contenção dos gastos públicos tinham tecido um tapete de credibilidade para Temer caminhar. Mas é melhor não desfilar ignorando a plateia, sob o risco de escorregar.

 

Percebendo o perigo o presidente interino aproveitou um evento em que recebeu apoio de 46 entidades do agronegócio para tirar a casca da banana do caminho. “A partir de certo momento começaremos com medidas, digamos assim, mais impopulares”, discursou no Global Agrobusiness Forum em São Paulo. O que o mercado quer é, digamos assim, exatamente isso. A justificativa é mais racional do que desumana. Foi o excesso de populismo que nos levou ao quadro atual. E o pior do populismo é ser financiado pelos cofres públicos. Pior ainda é tentar ser populista quando os cofres estão arrombados.

 

O acordo com os estados – em que houve leniência além do esperado e socorro financeiro além do razoável – o mercado aceitou com uma boa dose complacência com o governo. Como se tivesse se aproveitado do feito, Michel Temer embalou e concordou com o aumento no salário do funcionalismo público com custo que chega a R$ 70 bilhões em dois anos – em pleno desemprego de 11,4%. Na mesma toada, Temer anunciou reajuste do Bolsa Família em 12,5%, com impacto de quase R$ 3 bilhões. Como discordar desse aumento para um programa que representa tão pouco no orçamento total da União? A questão aqui é a mensagem. É para ser ortodoxo ou popular? Político ou gestor? Austero com todos ou generoso com poucos?

 

Passados quase dois meses de governo interino, Michel Temer gastou boa parte do velcro que o envolvia quando chegou à presidência. E não foram só os escândalos de corrupção nos gabinetes ministeriais onde ele colocou aliados políticos que provocaram desgaste. A demora em apresentar as medidas – que ele mesmo chama de impopulares agora – também pesa. A PEC dos Gastos, que limita o aumento das despesas públicas foi engavetada pelo presidente do Congresso, Renan Calheiros, para só depois da votação final do processo de impeachment. Sem falar, já falando, da reforma da previdência. Nesta semana o governo deve apresentar o tamanho do rombo esperado para as contas públicas em 2017 – que promete ser assustador, para acima dos R$ 100 bilhões.

 

O tempo vai passando e a pergunta que não quer calar já grita pelos cantos: de onde virão as receitas necessárias para equilibrar minimamente a gestão dos cofres da União no curto prazo? Quanto mais tempo levar a aprovação das ações mais definitivas, mais caro vai ficando o financiamento das necessidades do setor público. Adotar medidas impopulares não será uma opção indesejada. Será a única opção resumida a, basicamente, aumento e/ou criação de impostos. É apenas uma questão de tempo. Tempo da governabilidade de Michel Temer sair da corda bamba esticada pelo processo de impeachment de Dilma Rousseff. Até agosto, data da votação final do processo, a melhor ferramenta será a comunicação, ou a cantoria. No discurso de hoje, o presidente interino fez apenas uma serenata debaixo de uma sacada. Lá na janela, o mercado.