Inflação seguirá no centro do debate do país
Um banqueiro central já disse uma vez: “Banco Central bom é aquele que ninguém lembra que existe”. Este estágio quer dizer que a moeda está estável e fora de perigo, que a vida das pessoas segue sem sobressaltos ou ameaças sobre a renda. O Brasil ainda não conseguiu alcançar esta etapa e devemos levar mais tempo para chegar a este dia. Mesmo agora com a inflação em queda, teremos que conviver diariamente com o BC, acompanhando seus passos e cada palavra de suas mensagens
No caso brasileiro, inflação baixa demais ainda não quer dizer estabilidade da moeda. Nunca vivemos um período parecido, nem mesmo quando o Plano Real foi lançado, porque além dos índices em queda, a taxa de juros segue a mesma trajetória, podendo alcançar o menor patamar da história nos próximos meses. Por melhores que sejam Ilan Goldfajn e sua equipe, eles também estão diante de um ineditismo, não só com a dupla inflação/juros, mas de conjuntura. E não é só por cauda da crise política.
Recapitulando
O país acaba de sair da maior recessão da história. Foram dois anos e meio de queda do PIB (-8%) e da renda per capita (-10%). A destruição de fontes geradoras de riqueza, com fechamento de empresas e negócios, foi sem precedentes e, no atual momento econômico mundial, com as economias interligadas e dependentes, ainda é cedo para entender os efeitos do estrago. Desemprego e subemprego atingem mais de 22 milhões de pessoas. Além disso, poupança interna e investimentos também caíram muito, revelando a fragilidade do país para seguir em frente. Vai ser na raça e com o que sobrou.
Diferentemente das outras crises agudas vividas aqui, nesta escapamos do que sempre nos derrubou: as contas externas. O Brasil era muito dependente de dólares e a saída abrupta de investidores assustados com nossas trapalhadas fazia a moeda americana disparar – provocando alta da inflação, para dizer o mínimo – e consumia as reservas internacionais do país. Com o baú cheio, US$ 380 bilhões, e excesso de capitais no mercado internacional, nem a perda do grau de investimento, selo de bom pagador que atrai (ou afasta) investidores, foi capaz de espantar de vez quem apostava na nossa economia.
As contas públicas estão catastróficas. Quem olha a fotografia da situação fiscal do país dificilmente encontra estímulo para acreditar que temos solução. Quando rodamos o filme do que vem acontecendo na gestão pública nos últimos 10 anos, daí é show de irresponsabilidade, ou de horror mesmo. O que tem segurado o país de pé é o roteiro do filme que pode ser produzido se a política econômica de Henrique Meirelles, ministro da Fazenda, for mantida num próximo governo e se o Congresso Nacional aprovar a reforma da previdência.
A instabilidade das contas públicas sempre nos rondou, mas nunca chegou a ser uma ameaça real como agora. Até porque, havia espaço para aumento de impostos e o governo nunca tinha se metido numa rota tão suicida quanto a que passamos no governo de Dilma Rousseff, com recorde de isenções, subsídios e pedaladas. Mesmo quando acendeu alertas, a política fiscal errática do PT se dava num ambiente de relativa atividade econômica. Agora não dá mais para mexer com impostos, o PIB afundou 8% em dois anos, a dívida pública pode dobrar na década e os puxadinhos feitos no orçamento público federal foram vetados pelo teto de gastos implementado no país.
E a inflação? Como se comportou?
Ela reagiu ao afundamento da demanda, claro. A queda da renda per capita foi tão violenta, que não tinha como ser diferente. Ela também reagiu ao excesso de oferta de alimentos e moeda no mundo o que provocou, de um lado uma forte redução no preço dos alimentos, de outro, a manutenção de um dólar mais fraco. Esta dupla já foi suficiente para permitir ao BC derrubar os juros quase que pela metade entre 2016 e o final deste ano (projeção para a Selic em 7%).
O que não sabemos ainda é se esta reação em cadeia foi pontual, conjuntural, ou seja, vai apenas responder aos estímulos da recessão e do excesso de oferta, ou se ela veio para ficar. Se foi pontual, provavelmente o BC estará mais tranquilo para fazer trabalho, com livro texto sobre a mesa. Se ela for mais permanente, o desafio ficará mais complexo. Tudo que tivemos como referencia até agora será questionado. Por exemplo: que tamanho de desemprego gerará riscos para inflação? Que nível de taxa de juros deixará a atividade se recuperar sem gerar bolhas de consumo? Num país sem segurança fiscal poderá deixar a economia andar solta no supermercado?
Provavelmente o BC vai discorrer sobre estes temas no próximo Relatório Trimestral de Inflação que será divulgado nesta semana. O RI chegará no mesmo dia em que o IPCA 15 de setembro será liberado pelo IBGE. Os economistas de mercado esperam uma taxa perto de 0,15%, o que levará a taxa em um ano para perto de 2,5%. Se a atividade econômica ganhar mais força até o final do ano, capaz da inflação reagir com pouquinho mais de força e evitar que o BC descumpra a meta de inflação, que tem o piso em 3%
Esta mistura do que está acontecendo agora que nos distancia daquele ideal de nem lembrar que existe um BC na vida. Que dirá um Copom?! A inflação seguirá no centro do debate do país pelo menos até que o prognóstico fique mais claro.