'FED no divã', diz analista sobre vai e volta do BC americano
Volatilidade é pouco para definir o que está acontecendo com os mercados financeiros mundo a fora toda vez que alguém do FED – o BC americano – fala alguma coisa sobre a condução da economia. Foi só acabarem as primárias para eleição para presidente dos EUA, que definiram Hilary Clinton e Donald Trump como candidatos, que começou a falação dos diretores do FED. Faz mais ou menos um mês que o mercado inteiro, incluindo o nosso, anda para cá e para lá tentando interpretar qual será a próxima decisão sobre os juros: sobem agora ou mais para frente. Diferentemente do que acontece no BC brasileiro, lá os diretores regionais têm “voz própria” e dão opinião pública e aberta sobre o que devem fazer com os juros.
“O FED está no divã. As múltiplas personalidades dos diretores debatendo se querem subir, se querem descer, ou deixar os juros onde está, estão levando o BC dos EUA a deitar no divã e reavaliar o que ele quer, qual o melhor modelo a ser adotado e qual a velocidade. Cada um defende o seu. Essa disputa pública de ideias está claramente ligada ao momento político, às eleições para a presidência. A tensão é enorme e tem explicitado a intensidade das divergências”, disse ao G1 o analista Adeodato Netto, chefe de mercados da Eleven Financial Research.
A próxima reunião do FOMC, o Copom deles, vai acontecer na próxima semana, por isso a sensibilidade aumenta. Nesta segunda-feira (12) os mercados acordaram acreditando que a alta dos juros estava perto porque o último membro do FED a falar na semana passada sinalizou que esta deveria ser a decisão do colegiado. A reação do mercado para esta expectativa é de dólar mais caro e bolsas em queda. No meio do dia, a diretora do FED de Chicago, da Lael Brainard rebateu o colega dizendo que eles não estavam “prontos para subir os juros”. Pronto. O mercado virou de novo com bolsa subindo e dólar caindo.
O que está em jogo lá é a resposta da inflação à decisão do FOMC. Os EUA também têm metas e precisam conduzir a economia limitando a inflação em 2% ao ano. Atualmente ela está abaixo disso. Para quem quer subir os juros agora, a avaliação é de que a economia já está na rota da recuperação e a volta do consumo vai provocar aumento da inflação. Para quem está defendendo esperar mais um pouco, a explicação é que ainda é cedo para dizer que a atividade econômica vai dar conta do recado porque a retomada ainda não engrenou na velocidade necessária para recolocar os indicadores sem gerar mais desequilíbrios.
“Diferentemente do acontece no Brasil, os investimentos na economia americana são feitos com capitação de recursos no mercado, com 100% de uso de capital de terceiros, não só de bancos. Se o FED mexe na taxa de juros ele transfere o peso desta alta para economia real. Com a taxa de capitação mais cara, as empresas repassam para os preços esta diferença, o que vai bater na inflação, claro. Parece que não é isso que quer a Janet Yellen (presidente do FED). Ela quer que a aceleração ‘natural’ da economia leve a uma alta dos preços. Se não for assim, eles podem acabar gerando um desequilíbrio que eles mesmos terão que lidar lá na frente”, explica Adeodato Netto.
Quem menos fala nessa “terapia coletiva” dos membros do FED é a “dona da casa”, Janet Yellen, que também preside o FOMC. Ela fala pouco mas acaba sempre tendo a palavra final. Mesmo tendo este poder reconhecido, ela não consegue evitar a “DR” pública e muito menos a volatilidade dos mercados, efeito direto da confusão na sinalização sobre as ações do BC americano.
Falta liderança da Yellen? Perguntei ao analista da Eleven Financial.
“Acho que não. É ano de eleição nos EUA e por si só o ambiente fica mais agitado. Hoje tinha gente falando que a Lael Brainard (FED Chicago) doou dinheiro para campanha da Hilary Clinton. O Trump está acusando o FED de manter os juros baixos para ajudar a candidata democrata. É um nível de polarização que não se via há muito tempo por lá. É um momento de tensão política maior e isso impacta os gestores da economia. Como não há mais um discurso do mundo em guerra, a economia ganhou espaço. Como bem disse o James Carville, ‘It’s the economy, estupid!’. E no final, a palavra mais forte é da Yellen e o mercado sabe disso, mas não consegue não se estressar com os ruídos”, disse Adeodato Netto.