Ficou para dezembro, provavelmente, o tão esperado movimento de alta de juros dos Estados Unidos. Na reunião do FOMC, o comitê de política monetária, desta quarta-feira (02), a maioria dos diretores do Fed decidiu pela manutenção da taxa básica americana entre 0,25% e 0,50%. O mercado já esperava por esta notícia e estavam todos aguardando os sinais sobre os próximos passos que vieram no comunicado do BC americano. Tudo indica que em dezembro, exatamente um ano depois que eles subiram a taxa pela primeira vez em oito anos, o Fed vai repetir o gesto. Eles querem apenas “mais algumas evidências” de que chegou a hora.

 

Estas evidências são, basicamente, o ritmo da recuperação da economia americana. Ninguém duvida mais de que a maior economia do mundo já deixou o pior para trás mas a volatilidade dos indicadores nos últimos meses tem mantido a cautela mais forte do que a tranquilidade para mexer nos juros. O Fed olha para o que acontece dentro de casa, mas não consegue deixar de considerar como anda a economia da China e da Europa. O preço do petróleo – que é definido no mercado internacional – também é variável importante e que pode afetar a inflação dos EUA.

 

Como existe uma neurose envolvida no acompanhamento das ações do Fed, a palavra “algumas” (evidências) no comunicado desta última reunião do FOMC ganhou um significado relevante e que corrobora a expectativa para alta dos juros em dezembro – data do próximo encontro. Os analistas interpretaram que o “algumas” é um termo mais suave e indica que dos diretores do BC americano não precisam de “novas” evidências e sim de uma ou outra confirmação para tocar o barco.

 

Aqui no Brasil a dinâmica da decisão sobre os juros não é muito diferente. O BC identifica os riscos e, especialmente sob a gestão de Ilan Goldfajn, diz com clareza o que o Copom espera acontecer para que a taxa seja ajustada – no nosso caso, infelizmente, a realidade é muito mais cruel, já que temos a maior taxa do mundo, de 14%, e é impossível pensar em juro com número “0” na frente. Há uma diferença importante entre nós e eles. Aqui o BC tem apenas um objetivo, qual seja, cumprir a meta de inflação. Lá, o Fed persegue duas metas: a de inflação e a do emprego. Já tivemos discussões sobre se o Brasil deveria ampliar o mandato do BC mas ainda não houve argumento suficiente para estimular a mudança. Até porque, é imprescindível que o país viva alguns bons anos de sucesso na política monetária para se atrever a mudar as regras do controle da inflação – uma coisa caríssima ao Brasil.  

 

Durante este ano todo em que os juros dos EUA não mudaram, o Fed tem mantido o mundo de castigo. Nenhuma grande decisão sobre investimento foi tomada, tanto no mercado financeiro quanto nas operações da economia real, ou seja, investimentos na produção, na infraestrutura, etc. Neste tempo todo a China ameaçou, assustou, alegrou e continua uma incógnita – e ela faz toda diferença para a economia mundial. A Europa está sem coordenação política para lidar com a imigração, terroristas atacaram cidades relevantes nos países mais ricos, o Reino Unido deixou a União Europeia e a ideia de outros “exits” ganhou força em outras nações.

 

Aqui no Brasil, não que o Fed nos dê alguma consideração, nós vivemos um ano dificílimo com a recessão mais resistente e difícil de superar, inflação ainda alta, um impeachment que deixou traumas, muitas delações sobre a corrupção, convulsão social contra mudanças na gestão dos cofres públicos e na educação entre tantos outros eventos. Mas para nós também é importante acompanhar de perto o que vai acontecer com a taxa de juro americana porque, quando ela subir, uma boa parte do dinheiro que circula mundo a fora vai sofrer realocações. Mesmo que pague muito pouco em comparação com o que nós oferecemos, os investidores preferem deixar mais um pouco no porto mais seguro do planeta. E o dólar também pode subir criando desconforto para a nossa inflação – mais trabalho para o nosso BC. Mas quem liga para isso, além de nós?