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  • 'É simplista analisar reação do mercado ligada apenas à reforma da Previdência', diz economista

    Nada como um dia após o outro com algumas crises no meio. Como tem acontecido há algumas semanas, o comportamento do mercado financeiro no Brasil tem sido mais volátil. Um dia mais sensível aos nossos problemas domésticos, outro, mais ligado ao que acontece lá fora. Nesta quarta-feira o dia terminou positivo, com bolsa em alta de mais de 2% e dólar em queda (de 0,40%, a R$ 3,26), depois de fechar na direção contrária no dia anterior.

     

    Analistas têm se questionado se está chegando ao fim a tolerância dos investidores com o governo Temer, especialmente com as sinalizações sobre a reforma da previdência – novo estopim em Brasília com admissão do presidente da República de que a votação estaria fora da pauta este ano. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, entrou no meio de campo, resolveu amenizar o tom, o próprio Temer recuou e, parte da melhora do mercado nesta quarta-feira (08) se deve a isso.

     

    Tem sim peso a instabilidade política e as ameaças contra a previdência em Brasília, mas há muito mais na mesa dos operadores do mercado financeiro. Os rumos da política econômica dos Estados Unidos têm provocado mais onda do que as nossas marolas aqui.

     

    “Ignorar o cenário externo é um erro e leva muita gente a fazer uma análise simplista do que estamos vivendo. Claro que a reforma da previdência e cenário político aqui são importantes. Mas é simplista não olhar para o exterior. Ontem, por exemplo, foi um dia ruim para os ativos de todos os países emergentes. Hoje, tivemos alguma recuperação, mas não houve um fato direcionador de mercado. Lá fora foi um dia com pouca agenda e nós aqui seguimos parecidos com outros emergentes”, ressalva Ignácio Crespo Rey, economista-chefe da Guide Investimentos.

     

    O mercado está preocupado com dois fatores bem relevantes para a maior economia do mundo. O presidente Donald Trump está fazendo mudanças na direção do Banco Central de lá, o FED, o que pode provocar mudanças também na estratégia deles para a taxa de juros americana. Outro ponto é a reforma tributária proposta por Trump e há dúvidas em relação ao efeito que isso vai ter na economia e, ao mesmo tempo, de como isto também pode afetar as próximas decisões do FED.

     

    “Estes temas quando vêm à tona mexem com mercado financeiro no mundo todo e o  Brasil não foi exceção na terça-feira, nem hoje. O dólar, que é uma percepção de risco importante, está tendo oscilações parecidas com relação às moedas dos países emergentes, que não têm um momento politico como nosso”, disse o economista da Guide.

     

    Voltando com a brasa para a nossa sardinha, a reforma da previdência vai continuar no foco das atenções. Mas deve ter uma natureza diferente no questionamento dos investidores. O tempo mais elástico para uma votação já foi dado há algum tempo pelo mercado. Se o governo resolver cortar mesmo a proposta da reforma ao que for mais essencial, como a idade mínima e a regra de transição, os investidores também vão gostar.

     

    “Talvez o governo não jogue mesmo a toalha. O movimento de ontem foi mesmo precipitado. Quem sabe o presidente Temer não acaba usando a reação negativa do mercado como ameaça e volte a brigar pela reforma?”, questiona Ignacio Crespo Rey. 

  • Reformas ou um Frankenstein?

    Os sinais são positivos, mas a realidade é bem mais engenhosa que isso. A economia brasileira ensaia a saída da recessão com a promessa de um primeiro trimestre acima de zero, o que interromperá 11 períodos seguidos de resultados negativos. Para isso, o país terá que atravessar a enorme barreira imposta pelo Congresso Nacional.
     
    Muita gente não sente, até porque a vida segue para a imensa maioria, mas o país está parado feito dois de paus, à mercê de vossas excelências parlamentares. É na Câmara dos Deputados que estão os maiores entraves. A discussão sobre as reformas da previdência e trabalhista acontece para todo lado, em qualquer canto dos salões de Brasília.
     
    O que a gente sabe até agora? Primeiro, e mais importante, é que não há votos nem acordo para a aprovação dos quesitos mínimos da proposta do governo para a previdência. Neste caso, ela continua sofrendo acomodações para acolher os privilegiados e, automaticamente, castigar todo o resto. O placar do jornal Estadão mostra que faltam mais de 200 votos para garantir a aprovação do que já foi acertado.
     
    Na reforma trabalhista, o que parecia que seria um passeio no parque, os obstáculos também se acumulam. Mesmo assim, esta é mais fácil e pode passar, funcionando, inclusive, como o melhor termômetro para a base que ainda está com Michel Temer. Não terminou ainda o cálculo dos efeitos da saída do PSB da coligação que apoia o governo. 
     
    Numa espécie de aval, sem muita guarida, o mercado financeiro oscila pouco e, a cada recuo na reforma da previdência que signifique mais buracos nas contas públicas, os analistas refazem as contas para entender o custo da rendição. Por enquanto, mesmo sabendo que a alma que deveria ser imortal da reforma, como a idade mínima e o fim de várias aberrações do nosso sistema, foi desmantelada, o preço da mudança parece ser menor do que o da desistência de qualquer ponto.
     
    Nesta terça-feira (25), o dólar reagiu com mais força, subia mais de 1% no meio do dia. A bolsa de valores operou em alta desde a abertura, fraquinha, mas no positivo. A condescendência do mercado com o governo parece ter bastante crédito ainda. Os “deadlines” que tinham sido virtualmente impostos para que o bom humor se esvaísse têm sido adiados junto com as datas para votação da reforma na Câmara.
     
    Você pode não ter se dado conta, mas seu futuro, dos seus filhos e netos, está sendo decidido pelo parlamento enroscado na Lava Jato, envolvido com o maior escândalo de corrupção da história e num corporativismo sem precedentes. Aquela janela de oportunidades para a aprovação das reformas estruturais tão esperadas pelos investidores e por parte da sociedade pode se transformar num Frankenstein caríssimo e assustador.
     
    O monstro vai carregar as marcas das costuras de todos os interesses políticos e de sobrevivência da pior classe de lideranças que o país já notou. As partes do bolso, do fígado e do coração serão compostas por você, caro leitor. E por todos os brasileiros que assistem à cirurgia nada reformista de Brasília, sem anestesia.

  • Carne, inflação e impostos

    Surpresas são inevitáveis. Quando elas chegam num momento de muito desequilíbrio, o estrago pode ser bem maior do que o normal. É o que estamos vendo agora com o escândalo da operação Carne Fraca. A descoberta de um esquema hediondo de manipulação da produção de carnes colocou o Brasil no centro das atenções mundiais. Vários países já anunciaram boicote às exportações brasileiras e, mesmo que muito já tenha sido esclarecido sobre a abrangência do estrago nos produtos, o estrago na imagem do país só faz crescer.

     

    Muito disso vem das falhas de gestão dos principais implicados na situação, desde a Polícia Federal até o presidente Michel Temer que demorou para reagir com mais contundência ao escândalo. A resposta mais rápida, como sempre acontece, se dá no preço dos ativos envolvidos na crise. As ações das maiores empresas de carne sofreram perdas bilionárias na última sexta-feira (17) e começaram a semana despencando na Bolsa de Valores de São Paulo. O movimento melhorou no meio do dia, reduzindo as quedas.

     

    Ainda é cedo para saber o tamanho da repercussão nos mercados e quanto tempo ele vai durar, mas o dano já foi feito. Aqueles que não cometeram crime terão mais trabalho para provar sua honestidade e, enquanto isso, vão perdendo espaço para os concorrentes mundiais que não vão esperar o Brasil se inocentar para ocupar o vácuo deixado pela Operação Carne Fraca.

     

    As empresas também não podem ignorar o risco à saúde dos brasileiros que consumiram carne podre sem saber. Neste caso, a reação dos envolvidos foi fraca demais, demorada e pouco convincente. O movimento no comércio parece não ter sido muito afetado pelo escândalo, já que muita gente continuou comprando carnes nos supermercados e açougues. Mas no médio e longo prazo, a depender dos alertas e do grau de esclarecimento, este quadro pode mudar.

     

    Exposto o cenário da crise mais recente, chegamos aos problemas mais recorrentes do Brasil. Quero falar especialmente de inflação e dos impostos. Qualquer queda nos preços das carnes – se as empresas tiverem que reverter as vendas externas para o público interno, o que aumentaria a oferta – pode beneficiar a inflação de alimentos que vem caindo com mais força. A não ser que o governo brasileiro consiga reverter a crise com mais habilidade.

     

    Sobre os impostos, estes não têm a ver com a carne, pelo menos não com o escândalo da Carne Fraca. Como disse aqui no Blog na semana passada, o aumento de tributos está sendo fortemente considerado e deve ser anunciado nesta terça-feira (22) pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. O governo está com a corda no pescoço e não há mágica que faça aparecerem algumas dezenas de bilhões de reais para cobrir o rombo das despesas públicas este ano.

     

    Lembremos que o governo federal tem que cumprir a meta de déficit fiscal de cerca de R$ 140 bilhões. Levando em conta a expectativa do crescimento do PIB este ano e as receitas esperadas pela recuperação da economia, ainda está faltando muito dinheiro para cumprir a meta acima.

     

    A opção menos dolorosa deve ser pelo aumento de alíquotas de impostos indiretos, como PIS/Confins, Cide da gasolina e o IOF de operações com câmbio. Agora que o dólar está mais baixo, os gastos dos brasileiros no exterior ensaiam uma alta, boa oportunidade para sacar um naco desse bolo. Vamos conferir já.

     

    A conclusão é que a operação Carne Fraca não deve estancar a queda da taxa de juros nem influenciar na questão fiscal – pelo menos no curto prazo. O Banco Central continuará enfrentando um quadro de queda da inflação e vai responder a isso com mais intensidade. A Carne Fraca tampouco vai impedir ou criar embaraços para que o governo anuncie aumento de impostos se as contas públicas realmente não deixarem outra opção.

     

    Mesmo que os efeitos nefastos de mais este escândalo não sejam explosivos para a condução da macroeconomia, eles são extremamente danosos para a percepção sobre o Brasil. Já somos um dos mais corruptos do mundo e, depois da descoberta da carne podre, essa imagem ganha o reforço de pessoas sem nenhum escrúpulo, nenhum, nem o mais elementar deles. Aqui rouba-se de tudo e por tudo: da Petrobras à merenda escolar, do cofre público aos frigoríficos que vendem carne podre para faturar mais.

     

    Isso não é nada bom para quem depende do investidor privado, especialmente dos estrangeiros, para financiar a travessia da recessão para a volta do crescimento econômico. Depois de tudo que passamos nestes últimos anos, o desequilíbrio a que chegamos, a Lava Jato, a Lista do Janot, e tantos outros episódios lamentáveis, o Brasil segue refém de seu próprio veneno – do tipo que apodrece a própria carne.

  • Sem contrapartida, ajuda aos estados é filantropia desonesta com dinheiro público

    Um passo para frente e três para trás. É assim que caminha a discussão para solucionar a crise dos estados. A noção básica de que, não importa o que tenham feito para destruir as contas regionais, as lideranças políticas no Brasil acham que o Tesouro Nacional tem que pagar! Isto é muito aviltante. É filantropia desonesta com dinheiro público.

     

    O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, está brincando com fogo. Ele ameaça o governo dizendo que os projetos que precisam ser aprovados na Casa são “um problema” porque insistem em cobrar contrapartidas dos estados que quiserem alívio financeiro. “Se o ambiente do ano passado continuar neste ano, a gente sabe que é difícil (aprovar), não adianta a gente negar”, ele disse.

     

    O que não dá para negar é o grau de irresponsabilidade e desaforo que a classe política que lidera o Legislativo está dirigindo ao país. Já faz pelo menos dois anos que propostas com mesmo fundamento transitam pela Casa. No apagar das luzes de 2016, os deputados resolveram que os estados teriam direito a tudo e dever com nada. A lei ganhou um belo veto de Michel Temer. Mas o problema persiste e se agrava.

     

    O que o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, topa fazer depende de mudança na Lei de Responsabilidade Fiscal, de aprovação do STF e da anuência da Assembleia Legislativa do RJ. Não é nada simples ou pequeno. Sem falar do risco de expor a LRF a um esquartejamento que anule seus efeitos e dê ainda mais liberdade para o gestor público fazer o que quiser com dinheiro dos contribuintes.

     

    É preciso dizer que alguns governadores fizeram boa lição de casa e conseguiram evitar o pior fazendo ajustes radicais antes da crise romper as barreiras de segurança. Muitos do Nordeste temem uma imposição mais forte de mudanças já que não conseguiram ir tão longe quanto RJ, MG e RS. Ainda assim, esta visão é de curto prazo. A gestão dos estados tem que mudar radicalmente no Brasil. Ponto.

     

    Com a crise vai ficar mais caro, muito mais caro. Sem arrecadação suficiente para ajudar, os cortes vão alcançar as áreas mais sensíveis e deixar na mão muita gente que já é mal atendida pelos serviços públicos essenciais. A privatização das empresas estatais, bancos, companhias elétricas ou de abastecimento, como a Cedae fluminense, é o mínimo a se fazer para compensar o descalabro financeiro. Tratei disso num artigo anterior.

     

    Uma pesquisa feita SPC Brasil com a CNDL mostrou que mais de 60% das famílias brasileiras não têm poupança ou reserva. Além de revelar o nível de insegurança que acomete milhões de pessoas, o país não pode mais financiar o descontrole dos gastos públicos nos estados. A ameaça do deputado Rodrigo Maia coloca o país inteiro refém da vontade política de quem não tem apoio da sociedade. Nem ele, nem seus pares. 

  • A reação do mercado ao processo de impeachment


    A bolsa de valores fechou em alta e o dólar teve queda. Futuro vai depender das medidas de ajuste fiscal. Assista no vídeo acima.
  • Medida impopular é música para o mercado

    Depois de soltar um inesperado pacote de bondades com dinheiro público, o presidente interino Michel Temer se deu conta de que tinha abusado da confiança que os investidores do mercado financeiro lhe deram até agora. Este “sujeito”, o mercado, é sensível ao fisiologismo e entortou a boca ao perceber que o governo afrouxou o cinto além da conta. Até agora o peso da nova equipe econômica, as aprovações no Congresso Nacional e a sinalização das medidas de contenção dos gastos públicos tinham tecido um tapete de credibilidade para Temer caminhar. Mas é melhor não desfilar ignorando a plateia, sob o risco de escorregar.

     

    Percebendo o perigo o presidente interino aproveitou um evento em que recebeu apoio de 46 entidades do agronegócio para tirar a casca da banana do caminho. “A partir de certo momento começaremos com medidas, digamos assim, mais impopulares”, discursou no Global Agrobusiness Forum em São Paulo. O que o mercado quer é, digamos assim, exatamente isso. A justificativa é mais racional do que desumana. Foi o excesso de populismo que nos levou ao quadro atual. E o pior do populismo é ser financiado pelos cofres públicos. Pior ainda é tentar ser populista quando os cofres estão arrombados.

     

    O acordo com os estados – em que houve leniência além do esperado e socorro financeiro além do razoável – o mercado aceitou com uma boa dose complacência com o governo. Como se tivesse se aproveitado do feito, Michel Temer embalou e concordou com o aumento no salário do funcionalismo público com custo que chega a R$ 70 bilhões em dois anos – em pleno desemprego de 11,4%. Na mesma toada, Temer anunciou reajuste do Bolsa Família em 12,5%, com impacto de quase R$ 3 bilhões. Como discordar desse aumento para um programa que representa tão pouco no orçamento total da União? A questão aqui é a mensagem. É para ser ortodoxo ou popular? Político ou gestor? Austero com todos ou generoso com poucos?

     

    Passados quase dois meses de governo interino, Michel Temer gastou boa parte do velcro que o envolvia quando chegou à presidência. E não foram só os escândalos de corrupção nos gabinetes ministeriais onde ele colocou aliados políticos que provocaram desgaste. A demora em apresentar as medidas – que ele mesmo chama de impopulares agora – também pesa. A PEC dos Gastos, que limita o aumento das despesas públicas foi engavetada pelo presidente do Congresso, Renan Calheiros, para só depois da votação final do processo de impeachment. Sem falar, já falando, da reforma da previdência. Nesta semana o governo deve apresentar o tamanho do rombo esperado para as contas públicas em 2017 – que promete ser assustador, para acima dos R$ 100 bilhões.

     

    O tempo vai passando e a pergunta que não quer calar já grita pelos cantos: de onde virão as receitas necessárias para equilibrar minimamente a gestão dos cofres da União no curto prazo? Quanto mais tempo levar a aprovação das ações mais definitivas, mais caro vai ficando o financiamento das necessidades do setor público. Adotar medidas impopulares não será uma opção indesejada. Será a única opção resumida a, basicamente, aumento e/ou criação de impostos. É apenas uma questão de tempo. Tempo da governabilidade de Michel Temer sair da corda bamba esticada pelo processo de impeachment de Dilma Rousseff. Até agosto, data da votação final do processo, a melhor ferramenta será a comunicação, ou a cantoria. No discurso de hoje, o presidente interino fez apenas uma serenata debaixo de uma sacada. Lá na janela, o mercado. 

Autores

  • Thais Herédia

    Jornalista, especialista economia e política; é colunista da Globo News. Foi assessora de imprensa no BC e gerente de comunicação do Carrefour. Na TV Globo, foi repórter de economia do Bom Dia Brasil. Tem pós-graduação em finanças pela FIA.

Sobre a página

A jornalista Thais Herédia comenta os principais fatos econômicos do país e do mundo e explica como eles afetam a sua vida.