Por que é difícil acreditar na queda da inflação?
Pela segunda semana consecutiva, os analistas baixaram sua previsão para o IPCA 2017. O número agora está em 3,03%. Para 2018, as perspectivas dos analistas apontam um IPCA de 4,02%, portanto, abaixo da meta de 4,5% e com uma trajetória bastante favorável para os preços ao longo do ano que vem. Outras pesquisas feitas pelo BC indicam que o IPCA deve se manter neste mesmo patamar, perto de 4%, até 2020 – com quadro político minimamente equilibrado e aprovação da reforma da Previdência.
Pesquisa Datafolha divulgada neste domingo (3) mostrou que 60% dos brasileiros acreditam que a inflação vai subir no ano que vem. Isso é mais gente do que em setembro passado (57%) e um pouco abaixo de dezembro de 2016, quando 66% esperavam alta dos preços – naquele mês do ano passado, a previsão dos analistas para o IPCA estava em quase 5% para 2017.
Por que será que está tão difícil acreditar que a inflação vai ficar baixa no Brasil? A expectativa dos chamados agentes econômicos é peça-chave do trabalho do Banco Central. Quando as pessoas não acreditam que a inflação está sob controle, a chance de ela subir é muito maior porque as decisões sobre preços – como dos salários, por exemplo – passam a ser defensivas, aumentando a indexação na economia e também a força da inércia da inflação.
Foi o que aconteceu entre 2011 e 2015, quando o Copom derrubou os juros à força para 7,25% e as previsões continuaram aumentando – tanto que a taxa Selic voltou a subir rapidamente e não parou até 2016. E o IPCA confirmou a conexão com as expectativas negativas, já que ficou perto dos 6% entre 2012 e 2014 e chegou aos 10,67% em 2015.
Será que a pesquisa Datafolha mostra que os ‘agentes econômicos’ que ‘contam’ para o BC estão limitados ao grupo de economistas e analistas de mercado financeiro? Não exatamente. Mas começa por eles, já que eles formam os preços dos ativos que podem influenciar na inflação, mesmo que indiretamente, como acontece com o dólar. De qualquer forma, o quadro atual tem uma explicação mais fácil para o que pode parecer um descolamento entre os economistas e os consumidores.
Os preços dos alimentos foram os que mais puxaram o IPCA para baixo em 2017, já que acumularam, até novembro, queda de quase 5%. Em 2016, neste mesmo período, a alta dos alimentos rondava os 9%. A supersafra de grãos derrubou muitos preços e o regime de chuvas evitou perdas de muitas culturas consumidas aqui durante o ano. Este deveria ser um dado a ser considerado pelas pessoas sobre sua percepção, não é mesmo? E ele é, mas pode ser também que haja uma desconfiança de que esta não é uma situação permanente e que o ciclo de queda já estaria chegando ao fim – elas têm razão sobre isso também.
Só essa informação não seria suficiente para piorar a expectativa dos brasileiros sobre a inflação. O que pode ter pesado na avaliação geral foi a alta seguida e mais acentuada das tarifas de energia elétrica e dos combustíveis. Houve mesmo um aumento salgado desses dois componentes – cerca de 10% para ambos entre janeiro e novembro, segundo cálculos do Itaú Unibanco. Estes são itens de peso no orçamento das famílias e assustam quando sobem seguidamente. Quando adicionamos a percepção correta de que acabou o ciclo de deflação dos alimentos, encontramos uma explicação para o pessimismo dos brasileiros.
No final das contas, a pesquisa Datafolha não está nem um pouco equivocada. Se os analistas ouvidos pelo BC esperam que o IPCA vai ser maior em 2018 do que foi em 2017, eles não só corroboram esta visão dos consumidores como podem também influenciá-la. O que a pesquisa não revela exatamente, é qual a intensidade da alta esperada pelas pessoas.
Ainda estamos muito mais perto do período de recessão, mesmo que ela tenha acabado. Há dois anos, ‘logo ali’, o IPCA foi de dois dígitos. A insegurança com o futuro do país e a decepção constante com a política misturam os sentimentos, seria incomum se isto não acontecesse. Vai levar um tempo para que a segurança com o controle da inflação seja assimilada pelas pessoas. Isto não anula a melhora da economia, mesmo que lenta e gradual; a queda acentuada do IPCA neste ano, a melhora no mercado de trabalho – ainda que de qualidade questionável.