Filtrado por indústria Remover filtro
  • 'Timing e política seguraram o leilão, mas o resultado é muito bom', diz analista

    O pré-sal é um bom negócio. Tanto assim que foi alto o interesse pelos 8 blocos leiloados pelo governo nesta sexta-feira. O governo acabou não vendendo tudo e arrecadou abaixo do esperado, R$ 6,15 bilhões. A Petrobras surpreendeu e fez as melhores ofertas, levando 3 blocos, se comprometendo a entregar 80% da produção para o governo federal. O que não deu tão certo?

     

    “O timing. O leilão era para ter sido feito há muito tempo, quando havia um maior engajamento do mercado internacional por poços de petróleo e exploração. Isto foi passando e chegamos agora com preço do petróleo mais baixo no mercado internacional. Além disso, o momento político é questionável e duvidoso, o que deixa o investidor um pouco com pé atrás. Ainda assim, temos motivos para comemorar, não com euforia, mas com realismo”, disse Raphael Figueredo, sócio analista da Eleven Financial.

     

    O mercado financeiro reagiu bem, tanto que bolsa de valores sobe e dólar cai durante o dia. Mesmo que a arrecadação esperada pelo governo, de R$ 7,75 bilhões, não tenha se realizado, o resultado foi considerado positivo. Na atual situação das contas públicas qualquer bilhão a mais faz diferença, para mais ou para menos, mas é o que temos para hoje. E foi um bom termômetro.

     

    “A expectativa é positiva até pelos agentes que entraram vindo de fora. Isto aconteceu porque nós temos regras claras, porque não viramos uma Venezuela, porque somos 200 milhões de consumidores. E, especialmente, porque mudou o sistema de partilha para exploração, que era um absurdo impor à Petrobras ser exclusiva do pré-sal”, avalia Celson Plácido, da XP Investimentos.

     

    Olhando para o mercado internacional, mesmo que o barril do petróleo esteja historicamente baixo, há uma expectativa muito positiva pela frente. A Saudi Aramco, maior companhia de petróleo do mundo, pode fazer uma oferta de ações no mercado internacional, o chamado IPO (Initial Public Offering) em 2018. O mercado especula que, se apenas 5% da empresa forem vendidos, a operação pode alcançar US$ 100 bilhões, a maior da história.

     

    “Não tem uma previsão de data, mas tudo indica que será em 2018. Pelo fato de ser a maior petroleira do mundo ela consegue algum controle sobre os preços do barril no mercado internacional. Por traz disso, na logica do mercado, há um interesse para o que petróleo se valorize e o Brasil se beneficiaria com isso também. Além disso, a atividade econômica global é crescendo, com sinais de aceleração dos EUA, da Europa e da China, o que pode aumentar a demanda por petróleo, melhorando os preços lá fora”, diz o sócio da Eleven Financial.

     

    O primeiro leilão do pré-sal do governo Temer passou no teste. A surpresa com a participação da Petrobras mostra mais ainda a qualidade da gestão de Pedro Parente na estatal. Se a companhia entrou com força para brigar pelos campos, é porque fazia sentido para o negócio, não porque houve pressão política ou obrigação do governo. “Nós não podíamos nos dar ao luxo de perder essas oportunidades”, disse Parente ao final do leilão.

     

    A quantidade de recursos que serão investidos no país nos próximos anos é enorme. Mesmo que ainda leve tempo para os investimentos se concretizarem e devolverem benefícios maiores para economia, este é o tipo de dinheiro que o Brasil mais precisa agora. Sob regras claras, debates transparentes e com fortalecimento da Petrobras da forma mais saudável e eficiente. Ainda há muito por se fazer, mas o primeiro passo foi dado na direção correta.

     

    “Nós temos sim motivos para comemoração. Das pequenas conquistas que tivemos, o evento maior foi a desobrigação da Petrobras (em participar dos leilões), e agora ela atua onde quer e com propósito correto, tendo mais eficiência. No limite, no médio e longo prazos, teremos maior investimento de capital estrangeiro, mais competitividade e geração de emprego”, ressalva Raphael Figueredo. 

  • 'Parar de cair não quer dizer que vai começar a crescer', diz economista sobre a indústria

    Ao contrário do que temos visto com a inflação, que só surpreende para melhor, a produção industrial tem pregado surpresas negativas neste começo de ano. O resultado do primeiro trimestre de 2017 foi positivo, com alta de 0,6%, em comparação com mesmo período do ano passado. Entretanto, o dado mais relevante neste momento é o resultado de março contra fevereiro, quando houve uma queda acentuada de 1,8% - o pior março desde 2002, segundo o IBGE.  Comparando março contra março, o crescimento foi de 1,15.

     

    “Eu venho insistindo que não estamos numa recuperação ainda. Este movimento é de estancamento da crise, com alguns componentes positivos e uma base de comparação muito baixa. No primeiro trimestre de 2017, contra o último de 2016, houve queda de 0,7%, com todas as grandes categorias em queda. Uma coisa é parar de piorar, outra é voltar a crescer”, disse Rafael Cagnin, economista chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial, IEDI, em conversa com o Blog.

     

    Quem tirou a indústria do vermelho de um ano para o outro foi a o setor extrativo, que se beneficiou do boom de exportações que aconteceu nos primeiros meses de 2017, e cresceu nada menos do que 8,2%. Na outra ponta está a indústria da transformação que continua no campo negativo e tem o maior déficit da balança comercial. Apesar disso, está se formando uma onda mais favorável para linha de eletrodomésticos.

     

    “A indústria de transformação continua em queda, não há recuperação, permanece na mesma trajetória de moderação das perdas. A linha marrom, dos eletrodomésticos, principalmente a fabricada no Amazonas, estão com esperança de que a liberação do FGTS e o crédito um pouco melhor para as famílias, reative as vendas. Vem os Dias das Mães agora em maio, que pode recompor uma fração de demanda”, explica Cagnin.

     

    A previsão média dos analistas do mercado era de uma queda de 0,8% da indústria em março. Portanto, o resultado veio bem pior do que o estimado. Não é a primeira vez que isto acontece, nem será a última. Parece estar havendo uma dificuldade de identificar a intensidade dos movimentos na economia na saída da recessão com os dados disponíveis. Será só isso?

     

    “Existe um certo exagero na hora de relacionar o desempenho da produção efetiva com a evolução dos indicadores de confiança. A recuperação dos índices de confiança, que tem acontecido há algum tempo, não é uma panaceia, não vai resolver tudo por si só. Me sinto um pouco na obrigação de ser pessimista, fazer uma chamada realista para segurar os ânimos”, desabafa o economista do IEDI.   

     

    O clima de otimismo com a recuperação melhorou nas últimas semanas. A previsão coletada pelo Boletim Focus, do Banco Central trouxe, pela primeira vez em muito tempo, uma alta – ainda tímida - na expectativa para o PIB de 2017. O ministro Henrique Meirelles chegou a prever que o PIB do primeiro trimestre seria mais forte, chegando a 0,8%. Talvez contasse com um desempenho melhor da indústria, que ainda não veio.

     

    “As pessoas confundem a dinâmica lógica de ciclos, que prevê crescimento, queda e retomada da economia. Mas a amplitude de cada uma dessas etapas não é previsível. Parar de cair não quer dizer que vamos voltar a crescer. Podemos ficar presos no fundo do poço por mais tempo. Dado tamanho da queda e a dificuldade financeira das empresas, é preocupante”, ressalta Rafael Cagnin.

     

    O resultado fechado do PIB do primeiro trimestre será revelado pelo IBGE em 1o de junho. Até lá, os exercícios de tentar enquadrar a realidade nas previsões dos economistas e do governo vão continuar. Esta baliza é importante para a tomada de decisões, mas parece ainda desalinhada. Só depois deste dado será possível encaixar melhor as peças do novo desenho da economia, depois da pior recessão da história. 

  • Queda na produção não é a pior notícia para indústria

    A indústria brasileira teve, em 2015, o pior desempenho desde 2003 – queda de 8,3% na produção. Dos 26 segmentos analisados pelo IBGE, 25 recuaram confirmando enfraquecimento generalizado do setor. Na sequência de números ruins da indústria, há muitos outros que revelam que o buraco está mais lá embaixo. Da porta para dentro das fábricas há menos dinheiro no caixa, menos investimento, menos empregos, menos produtividade e menos competitividade. Vender mais, dentro ou fora do Brasil, não vai tirar as empresas de onde se encontram hoje.

     

    Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), maior entidade representativa do setor, o peso da atividade manufatureira nacional sobre o PIB está hoje nos mesmos níveis do período pré-industrialização do país, há nada menos que 70 anos! Em 2015, o setor de transformação deve ter alcançado míseros 9% de participação no PIB nacional. Um ano antes, ainda era na casa dos dois dígitos – 10,4% do PIB. Além da CNI, o Instituto Brasileiro de Economia da FGV (IBRE) também constata esse desmantelamento do setor, ressaltando contudo que este movimento não significa que o Brasil está mais eficiente, entrando na era da tecnologia, automação e domínio dos serviços e comércio. Não, estamos mesmo é sem um e sem o outro.

     

    Há muitos fatores externos que explicam parte deste movimento. A retração da economia chinesa, menor crescimento mundial pós crise de 2008, deterioração da Argentina – maior compradora de manufaturados do Brasil -, queda nos preços das commodities estão entre os principais. Mas a lista de feitos de total responsabilidade brasileira é muito maior. Para começar, o aumento desmedido da intervenção do Estado na engrenagem econômica. Um estudo recente do IBRE/FVG mostra que a concessão de benefícios fiscais no governo de Dilma Rousseff mais do que dobrou de 2011 a 2015. No ano passado, mais de R$ 400 bilhões foram gastos em cortes de impostos e contribuições, o que equivale a 6,5% do PIB.

     

    Mesmo sem detalhar a participação da indústria neste regalo – que não foi pequena -, esqueça os números, olhe para a dinâmica da economia. De um lado, temos um governo que, apenas em 2015, deixou de arrecadar aqueles mais de R$ 400 bi em forma de incentivos ao consumo, ao investimento e à produção – teoricamente. De outro, um setor produtivo que derreteu, sem conseguir transformar nenhum centavo deste dinheiro em mais empregos, mais produção ou mais crescimento. 

     

    Dinheiro a mais não vai resolver a deterioração estrutural da economia brasileira. Tampouco dinheiro a menos vai contribuir para uma derrocada mais acelerada. Neste processo todo, quem mais influenciou a situação que vemos hoje foi o declínio da confiança na condução do país, na eficácia das medidas adotadas, na honestidade dos líderes políticos que vivem um mundo à parte da realidade das famílias brasileiras. Reverter a trajetória atual passa, obrigatoriamente, por assumir que a economia travou, está de pernas quebradas. Tratar o Brasil com sopa e mel não vai colar os ossos do setor produtivo, muito menos fazer com que ele volte a andar tão cedo. 

  • Resultado da indústria é apenas um 'vagalume' no meio do túnel

    A indústria cresceu! A notícia, sozinha, é um alento num período de números tão negativos para a economia brasileira. Segundo o IBGE, o setor teve alta de 0,6% em maio, comparado com abril, interrompendo três meses seguidos de queda. Pronto, acabou a parte positiva do resultado. Na comparação com maio do ano passado, a atividade fabril caiu 8,8%. No acumulado do ano, a baixa é de 6,9%.

    “O cenário é o mesmo, não mudou o quadro para a economia. É bom ver o sinal positivo (de maio), mas dá para relativizá-lo bastante, infelizmente. Essa melhora veios dos setores de equipamentos de transporte e refino de petróleo. O primeiro, tem a ver com vendas da Embraer para o mercado externo. O segundo, com decisões de produção da Petrobras”, pondera o economista Rogerio Cesar de Souza, do Instituto Estudos Desenvolvimento Industrial (Iedi).

    O que poderia ser a luz no fim do túnel se revela rapidamente num vagalume perdido, brilhando solitário no escuro. Quando olhamos para o desempenho do setor de bens de capital – produção de máquinas e equipamentos que melhoram a capacidade da indústria – fica bem claro que o buraco do setor é mais baixo, ou a saída do túnel está longe ainda.

    Na construção civil, a produção de bens de capital teve queda de 25.5% e entre abril e maio, o tombo chega a 40%. No setor de energia, recuo de 7,9% no 1o/tri para 22,3% negativo. Mesmo com ajuda dos aviões da Embraer, nos transportes a produção de máquinas e equipamentos está agora com redução de 30%. O único que estava com resultado positivo em 0,8% nos três primeiros meses do ano – bens de capital para a própria indústria – fecha maio com queda de 10%.

    “Esses indicadores são de um ambiente recessivo. Nós estamos em crise, não adianta evitar dizer essa palavra. Estamos longe de uma sinalização de investimento, a confiança dos empresários está em queda. O que poderia ajudar na recuperação de bens de capital são as concessões, mas não está nada definido. O consumo das famílias e o emprego ainda estão em acomodação com tendência pra queda”, avalia Rogério Cesar de Souza.

    A coisa não está fácil nem para número positivo. Ele não basta “parecer” bom, ele tem que ser bom “por inteiro”. Mesmo com a surpresa da produção de maio, a indústria brasileira está vivendo um de seus piores momentos e seriam necessários meses seguidos de alta na produção para limpar o passado recente de perdas. O otimista agora é aquele que espera que o cenário pare de piorar logo.

    “Em suma, tal desempenho reforça nosso cenário de retração de 1,2% do PIB no segundo trimestre, dado que será conhecido no final de agosto. De fato, tanto a contração de 1,7% da economia brasileira quanto a de 4,0% para a produção industrial, esperadas para 2015, já podem ser consideradas ligeiramente otimistas”, é o que diz análise feita pelos economistas do banco Bradesco e distribuída a clientes. 

  • Confiança é condição para recuperação

    A indústria amarga queda de 7,6% entre abril deste ano e o passado, segundo dados divulgados pelo IBGE.  Em 2009 todo, o setor teve queda de 7,4% – a pior em 19 anos. Não é só a produção industrial que alcança comparação com o pior momento da atividade econômica no milênio – o emprego na fábricas também está com desempenho tão negativo quanto aconteceu há seis anos. Em 2014 já teve queda de 3,2%. Nos três primeiros meses de 2015, o quadro acentuou-se para uma redução de 4,6% no nível de emprego do setor.

    Quando o tema é expectativa, as comparações negativas vão bem mais longe. O índice de confiança dos empresários da indústria, calculado pela Fundação Getúlio Vargas, está no menor nível em 10 anos. O indicador sinaliza preocupação com o presente e pessimismo com o futuro, ou seja, a virada ainda está distante. Quando olham para dentro da fábrica, os empresários veem seu custo subindo e a produção baixando, com nível de ociosidade em alta.

    Vou me ater à questão da confiança, como condição indispensável para a recuperação da economia. A sondagem de confiança do comércio, também calculada pela FGV, já acumula queda de mais de 15% entre dezembro passado e março. O pessimismo está mais forte com a situação atual e, a expectativa para os próximos seis meses melhorou refletindo alguma esperança dos empresários para o segundo semestre do ano – estão mais positivos do que os colegas da indústria.

    A Fundação Getúlio Vargas também acompanha a evolução da confiança da construção civil. Qualquer pontuação abaixo de 100 sinaliza uma percepção negativa da economia. Em maio, o indicador sobre a avaliação da situação atual estava em 59,4, e em 86,4 pontos para as expectativas futuras – menos pior. Para os empresários consultados, tudo que depende de crédito e de obras públicas está fadado a paralisar. 

    A confiança do consumidor não está diferente de nenhuma das categorias citadas. Em maio, os brasileiros fizeram a pior avaliação sobre sua condição financeira em 10 anos. Foi o que mostrou o levantamento feito também pela FGV. Assim como acontece entre os industriais, os comerciantes e os empresários da construção civil, a percepção dos consumidores sobre a situação atual é pior do que a expectativa para os próximos meses. Ainda assim, as duas visões estão em baixa histórica.

    O “ser” mais sensível é o tal do “mercado financeiro”. Ele é sempre o primeiro a mostrar o que sente – para o bem ou para o mal. A movimentação no preço dos ativos financeiros sinaliza a confiança dos investidores – devidamente representados por instituições financeiras – no país e na situação corrente. O “mercado” já passou da fase mais pessimista, vide a recente recuperação da bolsa de valores. O comportamento do dólar, apesar da alta recente, não demonstra ruptura ou risco de.

    “Está se formando, não um consenso, mas uma corrente majoritária de opinião de que o governo será relativamente bem sucedido nos ajustes, não só das contas públicas mas também dos preços relativos (conta de luz, por exemplo), num cenário em que o país não está mais no caminho do desastre. Ninguém espera nada de brilhante. Nem significa que não vai haver volatilidade e turbulências à frente. Tudo vai depender de como o governo vai trabalhar as expectativas”, disse ao blog o ex-presidente do Banco Central, Gustavo Loyola.

    Entre as turbulências e a volatilidade, a confiança do consumidor vai piorar antes de melhorar. “O emprego vai continuar tendo uma dinâmica negativa. E no mercado de trabalho, quando a economia retoma, e não vai retomar tanto assim, o emprego não volta ao nível anterior.  As empresas se acostumam a trabalhar com menos gente. A produtividade deve crescer antes do emprego se recuperar”, explica Loyola. 

  • Está na hora de revisar a meta de inflação

    O IPCA de março confirmou as expectativas e levou a inflação em 12 meses para 8,13%. A barreira psicológica da carestia brasileira continua sendo desafiada, afinal, a discussão já não se dá mais sobre o “limite superior da meta de inflação”, que é de 6,5%. Com a evolução dos preços nestes primeiros três meses do ano fica claro que o IPCA de 2015 caminha para 9%.

    A última vez que os preços sofreram choques dessa magnitude foi há 13 anos, em 2002, 2003 e 2004. Naqueles anos, a meta de inflação era de 3,5% 3,5% e 3,75%, respectivamente. Foi um período bastante turbulento, com a crise de confiança aguda pelo receio da chegada do PT ao poder. O IPCA fechou em 12,53%, 9,30% e 7,60% nos três anos. O maior culpado pelo estouro foi o dólar, que sofreu uma maxidesvalorização provocada pela fuga massiva de investidores.

    O Brasil ainda era frágil, muito vulnerável. As reservas internacionais à época revelavam o nível da fragilidade do país: terminamos 2002 com US$ 15 bilhões no caixa. Hoje, temos US$ 370 bilhões. Para retomar as rédeas dos fundamentos econômicos, o Banco Central precisou levar os juros a 26,5% em fevereiro de 2003. E para reconquistar a confiança dos investidores, o governo decidiu se “ajustar” à realidade e assumiu que seria impossível cumprir as metas de inflação estipuladas pelo Conselho Monetário Nacional.

    Em janeiro de 2003, primeiro mês de mandato do presidente Lula, Henrique Meirelles, que assumira o comando do BC, anunciou as novas metas de inflação para aquele ano e o seguinte. “A política de juros terá como objetivo atingir uma inflação de 8,5% e 5,5% para este e o próximo ano”. O sistema adotado pelo BC também foi ajustado, elevando o intervalo de tolerância da inflação para 2,5 pontos percentuais para baixo ou para cima das novas metas.

    O ‘timing’ das decisões foi decisivo para a virada nas expectativas e da coordenação da política econômica adotada para corrigir os rumos.  Com uma meta de inflação ajustada, o BC conseguiu cumprir sua tarefa e os preços caíram sistematicamente até que a inflação entrasse num período de estabilidade, previsibilidade e convergência com a meta. A confiança dos consumidores, empresários e investidores convergiu positivamente na mesma velocidade.

    Voltando para 2015, há diferenças fundamentais nas condições econômicas do país. Já citei o nível das reservas internacionais como uma delas. Mas não fomos só nós que mudamos: há 12 anos, o mundo convivia com taxas de juros mais altas, comércio mundial superaquecido, inflação mais elevada nas economias emergentes. O vento soprava a nosso favor. Hoje, os juros nos países desenvolvidos estão negativos, os europeus enfrentam uma deflação, ou seja, inflação negativa, e no comércio mundial só ficou quem é bastante competitivo. O crescimento, depois de rastejar nos últimos anos, já sinaliza um pulso mais fortalecido.

    O Brasil está exatamente na ponta contrária a esse cenário – o vento agora está contra. Outra diferença crucial entre os dois períodos relatados aqui está na causa dos nossos problemas. Há 12 anos, a inflação subiu bruscamente por causa do dólar que refletia a insegurança dos investidores. Atualmente, a inflação estourou seus limites porque criamos um país “sintético” nos últimos 5 anos, em que as decisões foram tomadas por conta e risco do próprio governo, consumindo boa parte da estabilidade alcançada depois da crise da década passada.

    O Banco Central continua afirmando que a inflação brasileira vai “convergir para o centro da meta de 4,5%” até o final de 2016. Nada é impossível, mas muita coisa é improvável. Para ser possível e provável, a sociedade precisa acreditar que o objetivo é realista. Nós já perdemos o ‘timing’ favorável - elemento essencial do controle alcançado em 2003. Mas nunca é tarde. E é de choque de confiança que o país precisa agora.

    Ser realista vai assustar menos do que ser “sonhador solitário”. Apresentar metas mais condizentes com a realidade atual pode desanuviar o horizonte e prover ao governo algum benefício da dúvida sobre sua competência e capacidade de reverter os maus feitos do passado recente.

Autores

  • Thais Herédia

    Jornalista, especialista economia e política; é colunista da Globo News. Foi assessora de imprensa no BC e gerente de comunicação do Carrefour. Na TV Globo, foi repórter de economia do Bom Dia Brasil. Tem pós-graduação em finanças pela FIA.

Sobre a página

A jornalista Thais Herédia comenta os principais fatos econômicos do país e do mundo e explica como eles afetam a sua vida.