O buraco nas contas públicas tem gerado um vai-e-vem no governo sobre as medidas possíveis e cabíveis para evitar o estouro da meta fiscal deste ano e do orçamento de 2018. Já perdendo a batalha da comunicação, os tropeços só pioram a impopularidade de Michel Temer. O último embaraço seria cômico se não fosse trágico. Michel Temer admitiu que governo poderia aumentar IR para pessoas físicas no ano que vem e depois se desmentiu. Todo mundo viu a gritaria, principalmente do Congresso Nacional.
Longe do olho do furacão político, e do mau marketing, mas com a cadeira fervendo, os técnicos da equipe econômica estão sim debruçados sobre planilhas e dados para encontrar solução para as contas públicas. O que está nas manchetes dos jornais e nos debates é a revisão da meta fiscal para este ano, mas a prioridade “urgente” na mesa dos técnicos da Fazenda e do Planejamento é fechar o orçamento de 2018. O governo tem até 31 de agosto para apresentar sua previsão de receitas e despesas para o ano que vem. A revisão da meta fiscal pode esperar até meados de setembro.
Quando olha para o esboço do orçamento de 2018, a equipe econômica vê com mais clareza o lado das despesas. Até porque, o teto de gastos impõe um limite de recursos, que só podem crescer 3% acima do que esteve disponível em 2017, e a proeza ficará na distribuição do cofre raso. A primeira versão tem que sair do governo e se o Congresso quiser, pode remanejar as moedas entre os ministérios e as áreas que escolherem, mas não vão poder “fabricar” dinheiro para atender anseios políticos.
Quando olham para o lado das receitas esperadas, os técnicos do governo sentem suor na testa escorrer. A ideia de aumentar alíquota do IRPF apareceu na lista de possibilidades, mas jamais deveria ter saído da sala, porque além de ser absolutamente impopular, seria um castigo pesadíssimo à parcela dos brasileiros que paga o imposto “na veia”, já que o tributo é retido na fonte. Tantas outras opções aparecem no balão de ensaio da equipe, mas incógnita pesa mais.
Se não encontram o que querem, sabem o que não querem. O grupo liderado por Henrique Meirelles não quer criar “puxadinhos” para o orçamento, ou seja, medidas que salvariam um ano, mas falhariam nos seguintes. A intenção é boa, porque o orçamento público no Brasil é uma enorme gambiarra de fios e amarrações que ninguém consegue chegar na caixa elétrica, muito menos cortar os fios que mais roubam energia. Mas o tempo urge e, sob as limitações da lei do teto dos gastos e da responsabilidade fiscal (revigorada depois do impeachment), o remédio tende a ser mais emergencial do que estrutural.
Tem uma coisa que a equipe econômica não quer abrir mão para 2018: a reoneração da folha de pagamento. O ideal seria que a volta da cobrança de impostos de vários setores teria aliviado muito as contas deste ano. Mas o Congresso não gostou da ideia e deixou de lado a MP que recuperava a arrecadação. O Refis, para o pagamento de impostos atrasados, também vai caducar no final do mês e o governo está com a faca nos dentes para impedir o parlamento de criar a maior farra da história, dando descontos de até 99% nos juros dos atrasados. Seria o melhor negócio do continente, deixar de pagar tributo ao estado.
Agora sobre a meta fiscal de 2017. O cofrinho do governo tem que encher até faltar R$ 139 bilhões para pagar as contas. Agora, estão faltando R$ 180 bi e, não valendo milagre, vão faltar R$ 150 bi até dezembro. É praticamente uma batalha inglória, já que não há mais ferramenta, instrumento, varinha de Harry Porter que faça aparecer receita para cobrir o que excede a meta de R$ 139 bi. Vai depender de como será arrecadação de impostos em julho e agosto, também de como vão andar os planos de leiloes de petróleo e usinas de energia elétrica, e o próprio Refis que está valendo e acaba em 31 de agosto.
No caso da meta fiscal há uma trinca na mesa onde sentam os técnicos da Fazenda e os do Planejamento. O grupo de Meirelles quer esperar até meados de setembro para bater o martelo e anunciar a revisão. O grupo de Dyogo Oliveira está com mais pressa, quer passar logo pelo constrangimento de voltar atrás. Como o mercado financeiro está calmo e satisfeito com esforço das equipes, talvez valha a pena esperar para saber o que ainda vai entrar para não correr o risco de errar na dose do ajuste da meta.
No fundo, no fundo, o que está em discussão e deveria ser a prioridade do Congresso Nacional, é a rigidez do orçamento federal. O corte de despesas chegou no limite, mais um pouco e o que ainda funciona para de vez. Se não querem “puxadinhos”, governo precisa mexer nas despesas obrigatórias, principalmente com pessoal. Cerca de 70% de todos os gastos do governo federal, do poder executivo, são com previdência e funcionalismo público. No legislativo e no judiciário, o peso destes gastos é ainda maior
A ameaça de aumento de impostos não vai definhar porque o Congresso Nacional gritou contra a ideia despropositada de subir o IRPF. Como disse o comentarista Renato Sardenberg na CBN, o Congresso não admite votar aumento de imposto. E redução de despesa, estão dispostos a aprovar? Será que na agenda “pro-mercado” de Rodrigo Maia cabe enfrentar o corporativismo mais forte do Brasil e flexibilizar a manutenção da folha de pagamento do setor público? Ou vai chegar o momento em que vamos pagar impostos para bancar a aposentadoria e os salários do funcionalismo público?
Com trinca ou sem trinca na mesa da equipe econômica sobre as soluções disponíveis para as contas deste e do próximo ano, os assessores dos ministros da economia estão entre a cruz e a espada, entre a fome e a vontade de comer. No dia a dia deles têm muita procura e pouco achado. Até porque, o antídoto mais eficaz está visível, mas blindado pela política.