A paleontóloga argentina Claudia Marsicano, ao descobrir o fóssil, disse saber “que era algo completamente diferente” — Foto: Reuters via BBC
40 milhões antes do aparecimento dos primeiros dinossauros na Terra, um predador feroz vagava por pântanos pré-históricos.
Media até dois metros e seu enorme crânio de mais de meio metro incluía uma boca com longas presas entrelaçadas que funcionavam como uma ventosa para devorar suas presas.
Trata-se de Gaiasia jennyae, cujo fóssil foi descoberto recentemente na Namíbia e descrito pelos cientistas em artigo na revista especializada Nature como uma salamandra gigante com cabeça achatada em forma de vaso sanitário.
“Essa criatura poderia ser chamada precisamente de ‘salamandra dos infernos’”, comentou o jornalista científico Paul Smaglik, em texto na revista Discover sobre a achado.
O fóssil foi nomeado em homenagem à formação Gai-as na Namíbia, onde foi descoberto, e em homenagem a Jenny Clack, a paleontóloga que se especializou na evolução dos primeiros tetrápodes: vertebrados evoluíram a partir de peixes e que foram os ancestrais dos anfíbios, répteis e mamíferos.
“Encontramos este enorme espécime deitado como um gigante que se solidificou sobre uma formação rochosa. Foi realmente chocante”, disse Claudia A. Marsicano, da Universidade de Buenos Aires, uma das líderes da equipe de pesquisa.
“Só de olhar eu sabia que era algo completamente diferente. Ficamos todos muito entusiasmados”, disse a paleontóloga.
O formato da cabeça e da mandíbula do tetrápode permitia que ele abrisse a boca e sugasse a presa — Foto: Gabriel Lio/Reuters via BBC
A equipe encontrou vários espécimes, incluindo um com crânio muito bem preservado e articulado com a coluna vertebral.
“Depois de examinar o crânio, a estrutura frontal me chamou a atenção. Era a única parte visível na época e mostrava grandes presas entrelaçadas muito incomuns, criando uma mordida estranha para os tetrápodes primários."
Jason Pardo, pesquisador de pós-doutorado no Field Museum de Chicago e coautor do artigo, explicou que o formato da cabeça e da mandíbula permitia que ele abrisse a boca e sugasse a presa.
“Temos um material realmente fantástico, incluindo um crânio completo que podemos usar para compará-lo com outros animais desta época e compreender como era este animal e o que o torna único.”
Marsicano acrescentou que “o novo tetrápode aquático excepcionalmente grande fornece informações críticas sobre os tetrápodes que habitavam as altas latitudes de Gondwana”, referindo-se às regiões polares da massa terrestre pré-histórica.
Ancestral arcaico
Embora a Namíbia hoje se situe logo a norte da África do Sul, há 300 milhões de anos estava muito mais a sul, perto do paralelo 60, quase ao nível do ponto mais setentrional da atual Antártica. E naquela época, a Terra estava se aproximando do fim de uma era glacial.
Os pântanos perto da linha do equador estavam secando e se tornando mais arborizados. Mas, mais perto dos pólos, os pântanos permaneciam, possivelmente ao lado de manchas de gelo e glaciares.
Nas partes mais quentes e secas do mundo, os animais evoluíram para novas formas.
Os primeiros vertebrados quadrúpedes, chamados tetrápodes, ramificaram-se e dividiram-se em linhagens que um dia se tornariam mamíferos, répteis e anfíbios. Mas nas periferias, em locais como a atual Namíbia, permaneceram formas mais antigas.
“É realmente surpreendente que Gaiasia seja tão arcaica”, disse Pardo. “Estava relacionada com organismos que provavelmente foram extintos 40 milhões de anos antes.”
E, apesar de um estranho vestígio de uma época ainda mais antiga, Gaiasia parecia se sair muito bem, possivelmente como o principal predador do seu ecossistema.
“O fato de termos encontrado Gaiasia no extremo sul nos diz que existia um ecossistema próspero que poderia suportar estes grandes predadores. Quanto mais olhamos, mais respostas podemos encontrar sobre estes importantes grupos de animais que nos interessam, como os ancestrais dos mamíferos e dos répteis modernos", concluiu Pardo.