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Por RFI


Trabalhar mais de dez horas por dia, pelo menos 50 dias por ano, aumenta em 29% a possibilidade de ter um AVC (acidente vascular cerebral). Se a situação persiste por mais de dez anos, o risco cresce 45%. — Foto: caio_triana/Creative Commons

Aviso aos "workaholics" de plantão: trabalhar mais de dez horas por dia, pelo menos 50 dias por ano, aumenta em 29% a possibilidade de ter um AVC (acidente vascular cerebral). O perigo cresce com o tempo. Se a situação persiste por mais de dez anos, o risco cresce 45%. É o que mostra uma pesquisa realizada por um grupo de cientistas europeus e americanos, entre eles o pesquisador francês Alexis Descatha, especialista de doenças profissionais do hospital Raymond-Poincaré, situado em Garches, na região parisiense.

O estudo pôde ser realizado graças a grupo de 200 mil pacientes que frequentam hospitais e centros públicos e integram um banco de dados colocado à disposição dos cientistas. Muitos deles tinham histórico de AVC, o que permitiu aos cientistas fazerem as comparações necessárias para chegar às conclusões estabelecidas na pesquisa.

"Temos agora uma análise importante que evidencia esse risco moderado e que é estatisticamente significativo. O que é interessante notar é que ele é significativo a partir de dez anos de exposição. No consultório, é algo que já podemos observar. Então temos a confirmação de algo que, em termos de duração, nunca havia sido constatado até agora”, diz Descatha, em entrevista à RFI.

Quais outras razões poderiam explicar a ocorrência de um AVC, que é um problema relativamente raro, em caso de excesso de trabalho?

Por enquanto os cientistas formulam hipóteses, lembra Alexis Descatha, que ainda não foram confirmadas pelo estudo publicado na revista Stroke. Eles ainda não sabem dizer ao certo se os ataques cerebrais seriam uma consequência direta da carga de trabalho ou do tipo de trabalho realizado, explica.

Segundo ele, há atividades que têm um efeito direto nas funções cardiovasculares, no ritmo cardíaco e na coagulação. Os horários noturnos, após as 22h, por exemplo, e alternados, são comprovadamente nocivos para a saúde, exemplifica, porque afetam o relógio biológico.

Cirurgia em hospital do interior de SP — Foto: Hospital das Clínicas de Botucatu/Divulgação

Algumas funções também estimulam comportamentos pouco saudáveis, como o tabagismo, a falta de atividade física, a alimentação inadequada, consequência do ritmo profissional e o consumo excessivo de álcool. Problemas como insônia também são frequentes. “Há uma modificação do comportamento ligada ao trabalho, principalmente ao excesso de trabalho a longo prazo, o que pode justamente, acarretar a ocorrência de um acidente cardiovascular”, diz.

O pesquisador francês explica que o estudo não detalha quais atividades profissionais tornam as pessoas mais propensas aos ataques cerebrais, mas os médicos já sabem que o trabalho que continua a ser executado de casa (envio de e-mails e telefonemas, por exemplo) também influencia negativamente a saúde, com todos seus riscos.

“Nosso objetivo agora é entender os mecanismos que estão por trás desse risco, preveni-los, e diminuir a incidência dos acidentes vasculares cerebrais”, reitera Descatha.

Seus próximos estudos agora deverão analisar qual a relação entre o trabalho excessivo e outras doenças cardiovasculares, e a maneira exata como os efeitos diretos e indiretos afetam os indivíduos. Somente desta forma poderá ser possível efetuar uma prevenção eficaz, reitera.

As próximas pesquisas também buscam entender se a carga de trabalho extrema exerce a mesma influência em acidentes vasculares hemorrágicos, quando há ruptura de uma veia ou artéria bloqueada por excesso de colesterol, por exemplo, ou vasculares isquêmicos, nos quais o cérebro fica temporariamente sem oxigênio, mesmo sem antecedentes.

A pesquisa leva a crer, diz Descatha, que o excesso de trabalho pode ser a razão das isquemias cerebrais em jovens que não apresentam fatores de risco.

“É o que constatamos no estudo, quando tentamos analisar os casos mais jovens, de adultos de menos de 50 anos. É mais do que claro que todo mundo pode ser vítima de um AVC, jovens ou nem tanto.”

Como criar um programa de prevenção?

“Dizer às pessoas para trabalhar menos não tem sentido”, diz o pesquisador francês. “O que é certo, por diferentes razões, que sejam sociais ou financeiras, ou de carreira profissional, é que trabalhar mais do que a média, mais de 10 horas por dia e 50 dias por anos, é algo comum, já que 30% da população declara estar nessa situação.

Mas se essa situação se prolonga por mais de dez anos, há efeitos na saúde que devem levar a uma prudência maior da gestão de Recursos Humanos e do tempo de trabalho”, diz Alexis Descatha. A prevenção para evitar essa situação, ressalta, deve ser coordenada entre o médico do trabalho e outros setores da empresa.

Essa situação de risco existe em empresas de todo o mundo, lembra o especialista francês, e já foi demonstrada em estudos asiáticos, americanos e europeus. As pesquisas demonstram que a prevenção passa pelo equilíbrio entre o tempo dedicado ao trabalho e à vida pessoal. “Há limites que não devem ser ultrapassados”, conclui

O objetivo agora do pesquisador francês e de sua equipe é ir mais longe nos estudos para compreender se é carga cognitiva, física ou ambas que afetam a saúde e se isso depende da maneira como o individuo lida com essa situação. “O objetivo é fazer a prevenção. E já sabemos que trabalhar demais por muito tempo afeta a saúde.”

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