Blog do Cássio Barbosa

Por Cássio Barbosa

Doutor e pós-doutor em astronomia, leciona no Centro Universitário da FEI. Mostra as últimas novidades dos céus de maneira descomplicada e descontraída.


Mistura de duas imagens do Sol capturadas pelo observatório dinâmico da Nasa — Foto: Divulgação/Nasa/SDO

Faltam poucos dias para chegar 2020, mas ao que tudo indica o Sol já está no seu novo ciclo de vida, o ciclo 25.

Segue o fio que a história é assim:

O nosso Sol é uma estrela de tipo espectral G2 de meia idade, ainda com uns 5 bilhões de anos de vida. Estima-se que seu tempo de vida seja de 10 bilhões de anos e ao fim desse período ele deve se tornar uma gigante vermelha expulsando suas camadas mais exteriores.

Mas durante seu tempo de vida, o Sol apresenta um ciclo periódico de aumento e diminuição de manchas solares. As manchas são, na realidade, a parte mais visível do ciclo de atividade magnética da nossa estrela. Elas são observadas desde o tempo dos astrônomos chineses há quase 2 mil anos e desde o século XVII são monitoradas e contabilizadas todos os dias.

Com essa vigilância toda, sabemos que o período do ciclo de manchas solares é de 11 anos, mais ou menos, alterando períodos de baixa atividade magnética (o mínimo solar) e períodos de máxima atividade (o máximo solar). Durante o mínimo, o número de mancha solares é muito pequeno, passam-se semanas sem que uma sequer seja avistada. Já nos períodos de máximo é o contrário, são muitas manchas que trazem junto tempestades solares intensas.

O estudo dos ciclos solares tem ficado cada vez mais importante para a sociedade moderna, por causa da dependência de energia elétrica e de equipamentos eletroeletrônicos. Quando ocorrem tempestades violentas há ejeção de massa coronal, uma grande nuvem de plasma, que se atingir a Terra pode causar muitos estragos.

Em geral, as tempestades no Sol causam auroras visíveis em altas latitudes terrestres, mas se houver mesmo um choque com o plasma solar ejetado, as correntes induzidas em estações de energia elétrica, satélites e equipamentos elétricos podem torrar os circuitos. Isso já aconteceu várias vezes e existe até um plano de contingência para essas épocas, a fim de minimizar os estragos.

Imagem de 2018 mostra registro da aurora boreal na Finlândia — Foto: Alexander Kuznetsov/Reuters

Atualmente o Sol está em seu período de mínimo saindo do ciclo 24 e entrando no ciclo 25. Não é fácil saber exatamente quando termina um ciclo e começa outro, ou melhor, a transição entre um e outro não é abrupta. Ainda mais no atual ciclo.

Esse é um dos mínimos mais mínimos já registrados.

No início de 2019 o Sol vinha se comportando como o esperado pelos modelos, mas no meio do ano o número de manchas despencou. Somando os dias em que nenhuma mancha foi observada no atual ciclo, temos o total de 948. Esse é o terceiro menor registro desde 1856! Apenas nos mínimos em 1878 (1028 dias) e 1913 (1015 dias) a atividade solar foi mais baixa.

Mesmo o pico do atual ciclo já foi fraco: o máximo teve muito menos manchas do que o pico do ciclo 23. Aliás essa característica vem sendo observada pelo menos nos últimos 3 ciclos: o pico do ciclo é menor do que o pico anterior.

Ninguém sabe ao certo o que se passa no interior do Sol para dizer por que isto está acontecendo. O mais provável é que seja um ciclo natural do Sol e que, se tivéssemos registros precisos obtidos há mais tempo, veríamos esse comportamento peculiar.

Não sabemos as causas, mas desconfiamos dos efeitos. As baixas contagens de manchas solares fazem com que a temperatura global diminua. A relação entre ambos é intermediada pela magnetosfera terrestre que permite a passagem de mais partículas carregadas, inclusive raios cósmicos. Já está provado que a incidência maior de raios cósmicos favorece a formação de nuvens que por sua vez refletem a luz do Sol. No fim das contas, com uma menor incidência de luz solar na superfície, o planeta acaba esfriando.

Existe um período entre 1645 e 1715 em que o número de manchas solares registradas foi muito pequeno. Pequeno mesmo. Por exemplo, em 1640 e 1670 nenhuma mancha foi registrada no Sol! Durante esse período, conhecido por Mínimo de Maunder, a temperatura média na Europa foi mais baixa do que o usual. A coincidência entre os dois fatos levou muita gente a associar as duas coisas. Ainda que não haja consenso entre os pesquisadores de que realmente haja uma relação de causa-consequência neste caso, muita gente acredita que o motivo das baixas temperaturas esteja de fato relacionada com a baixíssima atividade solar.

Essa semana já apareceu uma mancha com as características esperadas para o novo ciclo. Em outras palavras, o ciclo 25 de fato está para começar. Como a transição é bem discreta, é possível que 2020 ainda seja um ano com pouquíssimas manchas, podendo até mesmo bater 2019 que registrou 277 dias sem manchas. Estaremos aqui para conferir!

Imagem divulgada pela Nasa em 2016 mostra uma mancha solar gigante. A região do Sol onde a mancha foi encontrada está sendo chamada de 'monstro benevolente' pelos cientistas. — Foto: AP/Nasa

VÍDEO: SOL

Em 2018, a Nasa lançou uma sonda para estudar o Sol. Confira no vídeo abaixo:

Nasa lança sonda que vai tocar no Sol

Nasa lança sonda que vai tocar no Sol

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