Viagem de moto: roteiro e moto têm que combinar
Motocicletas e o chão em que rodam! Esta é uma típica relação íntima que, para dar certo, precisa ser muuuuito harmoniosa. Pela própria natureza motos têm uma área de contato com o solo mínima, em alguns casos menor do que um cartão de crédito!
Já comentei diversas vezes nesta coluna que pneus bons com pressão correta são o mínimo que qualquer motocicleta precisa para entregar a seu condutor a segurança básica. Daí para frente é conosco, com a segurança dependendo “apenas” de nossa pilotagem onde atenção, respeito às regras, – sejam elas as leis estabelecidas ou o sempre mais importante bom senso – evitará problemas…
Porém, muitas vezes não basta estar em uma boa motocicleta, bem calçada, e ser bem experiente para escapar de problemas. E isso aconteceu há algum tempo atrás comigo, que rodo há mais de 30 anos em motos variadas e em estradas de todo tipo.
COMO FOI?
Véspera de fim de semana, tudo pronto para pegar a estrada. A moto? Uma naked (BMW F 800R) equipada com bolsas laterais e baú de primeira, equipamentos originais. Os pneus, não só eram novos como de marca “da boa”, e lá fomos nós, eu e acompanhante, ansiosos para explorar um canto do planeta do ladinho de casa, mas que ainda não conhecíamos: as cidades históricas do Vale do Paraíba, na divisa de São Paulo e Rio de Janeiro. Silveiras, Areias, São José do Barreiro e Bananal, todas elas à margem da rodovia dos Tropeiros, um antigo caminho agora asfaltado, que serpenteia entre montanhas e paisagens bucólicas.
A naked parecia perfeita para o roteiro, e era, até a curiosidade (aquela que matou o gato, lembram?) entrar em cena e causar uma decisão que se comprovaria errada. Por sugestão de um local, decidimos conhecer uma localidade “ali do lado”, e para isso precisaríamos percorrer uma estradinha que, segundo nosso (muy) amigo, era “tranquila”. Não asfaltada, mas é como se fosse, disse ele. E eram apenas 24 km.
Na empolgação, o fator “pneu” foi desconsiderado e esta "excursãozinha" de pouco menos de 50 quilômetros de ida e volta resultou em um paradoxo. Vimos paisagens belíssimas, mas elas nos custaram caro em termos de estresse. Subir a tal estrada até que não foi um grande problema. Realmente tranquila, para carros. Para uma naked com pneus projetados para o asfalto aquela brita média – o trecho aparentemente estava sendo preparado para receber pavimentação – foi um treajeto torturante.
Motocicletas em geral contrariam o provérbio que diz que para baixo todo santo ajuda. Nelas troque o para baixo por para cima, uma vez que em aceleração, superar aquelas pedras não foi um grande problema. Mesmo com dois a bordo e malas lotadas, bastou apenas concentração e bom senso (sempre ele…) para vencer os mais de mil metros que nos levaram ao tôpo da localidade, o Parque Nacional da Serra da Bocaina, literalmente dentro das nuvens com seus mais de 1.700 metros acima do nivel do mar.
Mas e a volta, como foi? Foi um inferno. A moto dotada de ABS (sem possibilidade de desligá-lo) nos fez encarar o trecho que subimos alegres descendo tensos, muito tensos. 24 km percorridos a zero km/h ou quase isso, dando patadas para salvar escorregadas principalmente do pneu dianteiro a toda hora. Um sacrifício besta e que poderia ter terminado em um tombo mais besta ainda, daqueles a dois por hora que mais machucam o ego do que o corpo, mas que teria certamente consequências ruins para a motocicleta. E não se tratou de falta de habilidade mas sim de juízo: por conta dos pneus “errados”, do ABS e da presença de bagagem e garupa, deixar a moto desmbestar não era opção nem para mim nem para um campeão de enduro.
Qual lição foi aprendida?
Não se deixe levar pela empolgação. Viagens de motocicleta devem ser planejadas minuciosamente por mais curtas que sejam, e encarar um trecho off-road com uma motocicleta sem pneus apropriados para tal é pedir para ter problemas. Acompanhados por um par de viajantes em uma bem mais adequada Yamaha XT 660 Ténéré, observamos o quanto tal moto, mesmo plena de bagagem, estava muito mais à vontade naquela situação.
Dica a ser dada? Se tiver de enfrentar uma situação parecida baixe a pressão dos pneus. Isso garantirá uma melhor capacidade de enfrentamento deste tipo de terreno. O problema é que pneus com pressão baixa ficam mais sujeitos a cortes ou rasgos e tendo isso em mente (e principalmente vendo a quantidade de pedras afiadas com cara de malvadas) decidi não baixar a pressão e sim a velocidade.
No final, a viagem foi um sucesso e o trecho de sofrimento plenamente digerido, deixando lições, que basicamente são usar o sapato certo para a ocasião certa, evitar empolgação e principalmente planejar ao máximo para não colocar os pneus no lugar errado.
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