Noite de Oscar

sex, 28/02/14
por Dodô Azevedo |
categoria Cinema, Cultura, Você

Cena do filme Ela, de Spike Jonze, que concorre ao Oscar de melhor roteiro original

 

QUERIDO LEITOR, ATUALIZE A PÁGINA COM FREQUÊNCIA PARA CARREGAR COMENTÁRIOS NOVOS.

 

Aqui, neste post, a partir das 20h, este blog passa a comentar tudo sobre a noite dos Oscars.

Sabe papo de quem tá ali do teu lado com um balde de pipoca na mão?

A ideia é que juntos, ainda que pela tela do computador, tudo fica mais divertido.

 

*****************************************************************

POSTADO às 02:09

E a grande vitoriosa da noite foi Ellen Degeneres. Revolucionou tudo com a ação de marketing que deu no selfie mais compartilhado da história, conduziu o espetáculo de modo a passar mais rapido do que nos anos anteriores. Contrato garantido no ano que vem.

MUITO obrigado a você que acompanhou aqui estas três, quatro horas de comentários aqui. Eu adorei.

Próxima parada, Cannes.

Você vem comigo, né?

 

 

POSTADO às 02:00

Deu 12 anos de escravidão. Ganhou mas não levou. Gravidade foi o grande vencedor da noite. Brad Pitt, branco, constrangedor em sua participação no filme, foi o primeiro a falar, antes de McQueen, o diretor negro. Óbvio. No fundo, e na superfície, é tudo negócio. E o Lobo de Wall Street é uma ópera que explica isso maravilhosamente. O filme do ano. Que explica tudo o que você viu comigo hoje.

POSTADO às 01:55

Matthew McConaughey. Mesma coisa da Lupita. Papel fácil prum ator. Leonardo Di Caprio não sair com estatueta é caso para o parlamento da Ucrânia.

POSTADO às 01:50

A impressão que se tem é se Leonardo Di Caprio nao ganhar a platéia levanta e vai embora.

POSTADO às 01:47

Meio mundo agora de olho na conta de twitter da @MiaFarrow .

POSTADO às 01:46

Estendo o tira-teima: Quero ver a Cate Blanchet fazendo uma escrava preta chicoteada

POSTADO às 01:36

Virou o jogo. Gravidade virou todo o tom da noite, preparada para consagrar 12 anos de escravidão. Alfonso Cuarón, o primeiro latino-americano a vencer melhor direção, sendo o menos latino americano que um diretor pode ser.

POSTADO às 01:35

Roteiraço, o de Ela. Inacreditavel Spike Jonze ter vencido. E conseguiu o que queria: empatou com a ex-esposa, Sofia Coppola, num filme que é clara resposta a Encontros e Desencontros, que explana a relação dos dois quando eram um casal e deu a ela também o Oscar de melhor roteiro original.

POSTADO às 01:33

O primeiro job de John Ridley, roteirista de 12 anos de escravidão, foi roterista do Fresh Prince of Bel Air. Pode ser que 12 anos fique com os prêmios principais e poucos, e Gravidade com o resto.

POSTADO às 01:18

Nos livramos do discurso do Bono.

POSTADO às 01:16

Trilhas muito fracas este ano. Todas. Mas é o sexto Oscar de Gravidade, o primeiro favorito ao Oscar, lembram?

 

POSTADO às 01:02

Momento máximo.

 

Viva Coutinho!

 

POSTADO às 00:55

Porque  que ficamos tão comovidos na hora do obituário? Porque nos enfiam na cabeça, o tempo todo, que são imortais.

 

POSTADO às 00:54

Agora, a homenagem a Eduardo Coutinho. Pera…

POSTADO às 00:39

Tira-teima definivo? Ver a Meryl Streep fazendo o papel da escrava negra chicoteada pelo homem branco.

POSTADO às 00:32

Melhor montagem sem Thelma Schoonmaker, ainda mais em Lobo de Wall Street, é campeonato de basquete sem o time americano. Mas é bacana o Oscar de montagem ir para o diretor do filme. Ah, gosto do trabalho de montagem de Alan Baumgarten, editor de A Trapaça, em Zombiland. Só.

POSTADO às 00:28

O fofógrafo do Terence Malick finalmente ganhou uma. E Roger Deakins, um dos melhores fotógrafos do mundo, bate o próprio recorde de derrotas.

POSTADO às 00:16

O prêmio pra Lupita é o primeiro sinal de que o vencedor da noite será mesmo 12 anos… – o papel e a atuação em si não são extraordinários não. É o tipo de papel bem fácil de atuar na verdade. Já vimos em novelas da Globo.

POSTADO às 00:13

Sally Hawkins, a irmã de Blue Jasmine: descobri-a no incrivel Happy-go-Lucky, do Mike Leigh. Dica de filme pra este fim de carnaval.

POSTADO às 00:09

Skip Lievsay é o soundmixer dos filmes dos irmãos Coen. Faz um trabalho incrivel em gravidade. Pouca gente reparou, mas metade do filme de Cuarón deve-se ao som.

 

POSTADO às 00:07

Tudo bem de novo.

 

Selfie Epic Win

 

POSTADO às 00:01

U2, melhor não comentar.

 

POSTADO às 23:54

E a Amy Adams tuitando na platéia?

POSTADO às 23:51

Outro que pouco barulho fez em Cannes foi A Grande Beleza. Mas o filme cresceu, acontece. Este blog trocaria todos os indicados este ano por Azul é a cor mais quente, vencedor da palma em 2o13.

POSTADO às 23:41

Estão ligados que esta que levantou o público com a cantoria é a esposa do Sargento Murtaugh de Máquina Mortífera, né? Sério.

POSTADO às 23:36

Kate Hudson nunca deixa nada em casa. Traz tudo o que tem.

POSTADO às 23:26

Karen O e sua canção de comercial de plano de saúde.

POSTADO às 23:21

Este clipe com os heróis do cinema (é o tema dos Oscars de hoje), tira todas as possibilidades de O Lobo de Wall Street, não?

POSTADO às 23:15

Frozen atingiu neste domingo um bilhão de bilheteria, tornando-se o segundo filme a faze-lo desde toy story 3. Merecido.

POSTADO às 23:12

Kim Novak no palco. Um corpo que cai, maior filme da história do cinema, foi indicado, na época, apenas para som e direção de arte.

POSTADO às 23:03

Uma verdade dita agora no palco: A garotada não sabe o que é a AIDS. Por isso, Clube de Compras Dallas vale.

 

POSTADO às 22:58

Michael Wilkison, figurinista de A trapaça, trabalhou com Walter Salles em Água Negra. Era o favorito e perdeu. Tô dizendo que trapaça vai ser o grande perdedor desta noite.

POSTADO às 22:53

Insistindo nesse chapéu e nesse gestual, o onipresente Pharell  reduz-se a a um Jamiroquai reboot. A música é bem boa, porém. Inofensiva, mas boa.

 

 

POSTADO às 22:46

Ponto pra Jared Leto. Valeu também pela primeira menção à política. Sóbria, embora o “estamos de olho”, dirigido à Venezuela e Ucrânia tenha soado, no fim das contas um tanto imperialista.

 

POSTADO às 22:43

Trapaça perdeu a primeira. Jared Leto superestimado. Filme superestimando. Mas tudo esperado.

POSTADO às 22:40

Ellen, de banho tomado, fazendo um dos melhores monolólogos de abertura dos últimos anos. Primeiro acerto da noite. Golaço.

 

POSTADO às 22:25

Assisto a esse povo todo bem vestido no tapete vermelho e penso que falta o peladão que invadiu o palco ao vivo durante a cerimônia 1974, lembram? Google aí: David Niven + Oscar + The Streaker.

 

POSTADO às 22:19

Gravidade deveria concorrer a melhor desenho animado, não filme. Apenas os rostos de Sandra Bullock e George Clooney são de carne e osso. O resto é animação renderizada em gigabytes. Tudo o que ganhar será por seus primeiros 15 minutos de filme. Tudo o que perder será por seus contrangedores 15 minutos finais de filme

 

POSTADO às 22:04

E o Jonah Hill, que levou a Iídiche Mama para a cerimônia do Oscar? Hollywood é judia, todo mundo sabe, mas essa safra desencanada, maconheira, cujo padrinho é o Judd Appatow (diretor de Ligeiramente Grávidos e Virgem de 40 anos) e o mentor é o Harold Hamis (de Feitiço do Tempo) falecido semana passada, ah essa geração é um grande barato.

 

POSTADO às 21:59

Este blog, fã de Steeve Coogan, torce pra qualquer coisa que Philomena belisque.

 

POSTADO às 21:33

O importante aqui é relaxar, curtir a festa, porque o que sai das urnas é historicamente coisa de maluco. Exemplos?

- Taxi driver não ganhou nenhum Oscar. Scorsese sequer foi nomeado para melhor diretor, que naquele ano foi para John Avildsen, de… Rocky, um lutador.

- A grande ilusao, de Renoir, foi o primeiro filme estrangeiro a ser indicado para melhor filme. Perdeu para You Can’t Take it With You, do Capra.

- Spike Lee perdeu o roteiro original de Faça a Coisa Certa para Tom Schulman, de Sociedade dos poetas mortos.

- Stanley Kubrick foi indicado a melhor diretor por Laranja Mecânica… E PERDEU William Friedkin, de Operação França.

- Art Carney, ganhou, por Harry and Tonto (!), de Al Pacino em O Poderoso Chefão II e de Jack Nicholson em Chinatown.

- Cantando na chuva foi indicado apenas para melhor trilha a atriz coadjuvante. E PERDEU nas duas.

 

 

POSTADO às 21:22

Vi Nebraska em Cannes 2013. Não me pegou, não. Nem a ninguém na Croisette.

 

POSTADO às 21:12

David O. Russel conhecido no metiêr como péssimo caráter. Pitis onde ele humilha atores estão pelo youtube, só achar. Artisticamente, não tem personalidade alguma. Trapaça imita Scorsese – ele diz que homenagem e todo mundo finge que acredita. Porém, em Três Reis, ótimo filme, engendrou uma das cenas de abertura mais sensacionais da história do cinema. Mark Whalberg, caracterizado de soldado americano, no meio do deserto do Iraque, perguntando “Are we shooting?” é um ponto alto da história do cinema. Um dia vão ter que dar um Oscar póstumo a O. Russel por isso. Tomara que não hoje.

 

POSTADO às 21:06

E a grande tragédia deste Oscar são as indicações por Trapaça. Um dos piores filmes já indicadados para melhor filme em 84 anos de Oscar. Como o hype em torno dele já passou, deve ser o grande perdedor da noite.

 

POSTADO às 21:03

Her/Ela, o favorito particular do blogueiro. É, na minha opinião, um filme… otimista. Toda forma de amor vale à pena. Monogamia e amor romântico é atributo humano. Amar demais, amor difuso, coisa de máquinas. E sim, uma escancarada resposta de Spike Jonze a Sofia Copola, que expôs o relacionamento dos dois, quando casados, no filme Encontros e Desencontros.

 

POSTADO às 21:00

Já O Lobo de Wall Street é um triunfo do cinema. Há mais valor técnico ali (montagem, edição de som, fotografia), que o técnico Gravidade. Scorsese filmando com tesão de um estudante de cinema de 18 anos. Ou como um velhinho de 71 cheirado. É o favorito deste blog.

 

POSTADO às 20:58

Em Los Angeles, há cartazes publicitários a favor de 12 Anos de Escravidão que apelam para o que elegeu Obama: “Chegou a hora de um negro ganhar o Oscar” etc. O maior triunfo do filme é ser britânico. O maior defeito é ser britânico. Há uma mão pesada e formal e na verdade não nos conectamos com os personagens emocionalmente, e sim fisicamente. Não sentimos a dor da mãe que é separada de seus filhos. Sentimos é as chibatadas que elas levam. Culpa do diretor. Uma única cena genial, que valeria uma estatueta: A que o personagem principal para o filme, e chocado, olha para a câmera. Mas é uma só.

 

POSTADO às 20:52

Vencedores de melhor ator que NÃO eram brancos: José Ferrer, Sidney Poitier, Ben Kingsley, F. Murray Abraham, Denzel Washington, Jamie Foxx, Forest Whitaker. Em 85 anos. Por isso também, a noite deve ser de 12 anos de Escravidão.

POSTADO às 20:51

Nos últimos 10 anos, nenhum ator latino, asiático ou descendente de indio ganhou Oscar.

POSTADO às 20:50

Dos votantes da Academia, 94% são brancos, 77% são homens.

POSTADO às 20:48

Acho que foi hoje, inclusive, que  a Julie Delply, cujo “Antes da Meia Noite” concorre a roteiro adaptado (por causa de uma lógica maluca que diz que continuação é roteiro adaptado) deu uma descascada Academia, dizendo à Vanity Fair que não se pode esperar muito de um corpo de votantes composto de velhinhos de mais de 70 que estão mais interessados nos presentinhos distribuidos durante a campanha dos filmes.

POSTADO às 20:42

Estas limusines todas chegando e o primeiro a dar as caras no tapete vermelho é justamente um ex-motorista de limusine. O somali Barkhad Abdi, em seu primeiro trabalho como ator, indicado para coadjuvante por Capitão Philips. Difícil os velhinhos da academia, todos lotados de culpa, não curtirem premiar o africano.

 

 

POSTADO às 19:52

Repórter para Ellen Degeneres, faltando duas horas para começar a cerimônia dos Oscars, que ela vai apresentar.

- E aí? Nervosa? Conta pra gente o teu ritual antes de subir ao palco, principalmente numa noite tão importante!

- Gosto de tomar banho, me vestir e pentear o cabelo.

A noite promete.

 

 

Carnaval em casa

qua, 26/02/14
por Dodô Azevedo |
| tags ,

São muitos os sentidos da palavra liberdade. Para os ucranianos que passaram o último mês ocupando a praça em Kiev, liberdade é uma coisa. Para os presidiários do Maranhão, outra. Para quem nunca teve grana pra comprar uma TV de LED, comprar uma TV de LED.

Ser livre pode ser, então, questão de poder agir – liberdade física. Ou de poder pensar – liberdade intelectual.

Porém, liberdade de querer é, de longe, a mais difícil de conservar. Afinal somos livres para querer o que queremos?

Chama-se a liberdade do querer liberdade metafísica. Ou liberdade sobrenatural, ensinam Platão, Russeau e Kant.

Para os cariocas, liberdade é querer passar o carnaval em casa.

Repare: faz uns quatro anos que o carioca deixou o carnaval de rua, revitalizado no início do século 21 e já três vezes o tamanho do carnaval da Bahia, para os turistas.

Carioca que é carioca curte o carnaval  nos cada vez mais antecipados fins de semana que o antecedem.

Durante os feriados do carnaval propriamente dito, o  carioca, já cansado da folia do pré-carnaval (já desfilou o Pérola da Guanabara em Paquetá, o Gigantes da Lira em Laranjeiras, o Timoneiros da Viola em Oswaldo Cruz, o Monobloco só na semana que vem) quer é distância.

E a distância mais barata entre o carioca e o vamos chamar de carnaval oficial – seu trânsito imprevisível, suas ruas fedendo a mijo sob um sol pusilânime e os brasileiros meio riquinhos com pele cor de palmito que a cada ano invadem em maior número a cidade – é a sua casa.

Quem nunca experimentou passar o carnaval em casa não sabe nada de metafísica.

Afinal, a gente vive reclamando que não tem tempo de visitar a casa dos amigos. Ou de curtir a própria casa.

Na verdade, o carioca trabalha tanto que o conceito de casa já é algo muito, digamos, intelectivo neste momento.

Pois o carnaval – que a cada ano expulsa mais cariocas das ruas – está aí pra isso.

Pra ficar em casa.

Mas ficar em casa fazendo o quê? Ah, a liberdade física.

Pra começar, esquece o preconceito dos outros. Olha-se para quem passa o carnaval em casa como quem sofre de dengue.

Liga não, é dengo de quem queria te ver na rua ali agregando valor ao camarote.

Segundo passo: deixar dietas para lá. Aliás, quanta gente faz dieta, malha e acorda cedo em dias de carnaval, já repararam? Meu avô me ensinou que exatamente o contrário que se faz em feriados.

Deixar as dietas: é carnaval dentro de você também. Brigadeiro de colher, Cheetos, Baconzitos, ovinhos de amendoim, essa nova Pringle’s sabor asa de frango frito e apimentado, pacotes de Bis, mortadela com limão servida no prato com palitos de madeira.

Esquece copo – menos coisa pra lavar. Tudo em lata. O refri, o suco, a vodca, a cerva. Arroto está liberado. Afinal, só amigo muito íntimo tem a manha de frequentar sua casa no carnaval.

TV. Prato cheio. Mesmo raciocínio de deixar a dieta e o preconceito para lá: veja TV aberta, que vai desde a manhã, acompanhando o carnaval de rua ao vivo do nordeste, passando pela cobertura de bailes decadentes e camarotes na Sapucaí cheio de celebridades pagando mico com camisa de cervejaria.

Rir de coisas ridículas – o feriado que seu espírito precisa.

Rebata com algum filme em preto em branco. Lubitsch ou alguma chanchada funcionam como um Engov para a alma. Tudo o que precisa num sábado de carnaval para recuperar o fôlego é assistir a, por exemplo, “Carnaval em Marte”, de 1995, com Ansemo Duarte.

Domingo é dia da cerimônia do Oscar. Já viu todos os indicados a melhor filme no cinema, reclamando feliz do frio do ar-condicionado? Tem até domingo para fazê-lo.

Se estamos falando aqui de um casal, convém alertar para um preconceito ainda mais feroz. Ah, Fulano não veio ao bloco este ano porque tá casado.

Já repararam nos casais em blocos? Bebendo para esquecer a tensão de encontrar com o ex, ou do outro encontrar com o ex. Se se perdem por 15 minutos, pronto: DR no meio da rua.

Já repararam nos solteiros em blocos? Todos solitários, no fundo sorrindo pra não chorar. No carnaval o folião baixa suas expectativas românticas como se no século 21 o romance já não sofresse tanto preconceito quanto… ficar em casa no carnaval.

O máximo que vão conseguir é um beijo ou um amasso descompromissado de cinco minutos, na melhor das hipóteses. No fundo, ninguém quer nada fundo contigo, pierrô, nem contigo, colombina. Bora beber pra esquecer.

Repare, metade das marchinhas são sobre tristezas, perdas, saudades e desencontros. Não só as marchinhas. No carnaval, metade do povo sai por aí acusando que você pagou com traição a quem sempre lhe deu a mão.

Enquanto nas ruas bebe-se para esquecer que se está sozinho, em casa bebe-se para celebrar a bela companhia que pode no caso ser até você mesmo.

E não se preocupe em perder nada do que se passa nas ruas. Você vai acompanhar o carnaval de todo mundo, e em tempo real, não se preocupe. Instagram, Whatsapp, o Tumblr onçinha cadê você, i hate flash, tá todo mundo aí pronto para expor, em todos os sentidos, suas fantasias.

A Zona Sul do Rio de Janeiro cabe todo em seu smartphone – sem o cheiro de mijo. “Não é que o mundo seja pequeno, a renda é que é má distribuída”. Se amigos foliões insistirem na sua presença, diz que você foi ao bloco fantasiado de múmia, e que quis passar incógnito, e que achou um barato. Minta. É carnaval.

Agora, se chover, caro leitor… Se por acaso o tempo fechar, ficar cinza, a temperatura cair a 18 graus e chover, ah, se isso acontecer, você para tudo o que estiver fazendo, coloca tua melhor fantasia e vai pra rua e canta todo Hino da Bandeira, emenda com o refrão de “Chuva, suor e cerveja”, passe a mão na bunda do guarda e dê cambalhotas no meio fio.

Se chover, será uma demonstração definitiva liberdade sobrenatural dos céus.

E se os céus resolverem também ir pra rua, aí sim: quem é você pra ser do contra?

PS: Saio de casa para pedir benção ao Cacique de Ramos na madrugada da Av. Rio Branco, que este ano será palco de tanta coisa política. No domingo, à partir das 21h, estarei em casa, bem acompanhado, comentando a cerimônia dos Oscars aqui neste blog. Agora que somos íntimos, está convidado.

Foto: Fernando Maia/Riotur

Estações

ter, 18/02/14
por Dodô Azevedo |

Fachada de rua do Cinema do Grupo estação - Foto por Dodô Azevedo

Sendo direto: No próximo dia 3 de abril, o Rio de Janeiro saberá se o Grupo Estação, responsável pela formação cinéfila do carioca nos últimos 30 anos, irá pedir falência definitiva.

O carioca está acostumado a perder ou ver transformadas suas coisas mais cariocas. O Palácio Monroe, o Morro do Pasmado, o Jornal Última Hora, o Tivoli Park, O Circo Voador no Arpoador, a Feira de São Cristóvão, o antigo Maracanã.

Morreram de vez ou reiventaram-se.

Em comum, um espírito imortal.

Que uma grife de cinemas, sozinha, entre para este grupo, é inédito. E diz muito sobre ela.

Quem, nas redes sociais, nos botecos e nos blocos de pré-carnaval está consternado, não é tanto o profissional de cinema, não é tanto quem trabalho no ramo ou é do meio.

Quem mais sentirá falta do Grupo Estação é tudo quanto é carioca. Aquele cujo apetite para a sala escura não se sacia com essas aventuras milionárias hollywoodianas, ou comédias brasileiras televisivas, esses filmes grandes.

Aquele que lambe o beiços é com grandes filmes.

Nas redes sociais, quem lambe os beiços com grandes filmes já se mobiliza para evitar o fim do Grupo Estação. No Facebook já existe página de apoio. No perfil de Marcelo Mendes, à frente do grupo, são muitas as manifestações de solidariedade.

Marcelo respondeu com uma proposta, algo que se pode fazer já: que cada pessoa que tem alguma história com o Grupo Estação, lembre-se, escreva, publique.

As minhãs são muitas. Fui criado nos cinemas do Grupo Estação. Minha vida daria um filme passado dentro de um dos cinemas do Estação. Eu aos 16 anos afogado nos números de Peter Greenaway, aos 18 conhecendo o cinema de preto de Spike Lee, aos 20 encontrando minhas almas gêmeas, os personagens de Jim Jarmush, tão estranhos no paraíso quanto nós que nos vestíamos de preto na cidade do sol para dançar no Cubatão, conhecendo Cassavetes e entendendo que aquilo já não é mais cinema, latindo feito um cão para um tal jovem chamado Tarantino, gritando “Lulaaaa!”, com o coração selvagem de Nicholas Cage e David Lynch, descobrindo o silêncio restaurado de Antonioni e, enfim, já no século 21, assistindo ao renascimento definitivo do cinema brasileiro.

Posso dizer, convicto: sou os filmes que vi na vida.

Em seu filme recente, “O primeiro dia de um ano qualquer”, Domingos Oliveira, há uma cena, dentre tantas, particularmente bonita. O personagem de Domingos dorme durante um filme antigo numa pequena sala de cinema. E é esquecido lá. Ao acordar, comenta algo como se existe um lugar digno para um último repouso, é o cinema.

Não quero viver numa cidade onde uma loja da Apple abre com cariocas cantando “sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor” e no mês seguinte cinemas fecham.

Mas morrer, bem velhinho, dentro de uma sala de cinema do Grupo Estação, assistindo a qualquer filme que esteja passando por lá, seria morrer satisfeito.

Morrer de ver, ou reinventar-se; afogar-se em números ou permanecer perto do coração selvagem; o que temos hoje, de certo, como consumado, é que a história do Grupo Estação é filme grande e um grande filme.

Fim?

Morto no centro do Brasil

ter, 11/02/14
por Dodô Azevedo |

A tática Black Bloc, que aqui no Brasil, e só no Brasil, virou grupo, movimento, com página no Face (característica também não encontrada em nenhum outro lugar do mundo), é o Riocentro, o atentado sabotador, da rapaziada, dos milhões, que em junho foram às ruas.

O Riocentro falhou. O grupo brasileiro, e só brasileiro, que autodenominou-se Black Bloc (sim, a página no Face veio antes do batismo da imprensa), não.

Haverá Copa e não haverá mais manifestações com milhões na rua nesse 2014.

O ano político, o cotidiano nas ruas neste 2014, será pontuado apenas pela ação, a partir de agora definitivamente isolada, destes grupos bem pequenos.

O que aconteceu em junho foi bonito, muito bonito, um passo à frente em nossa democracia.

Gente, afinal, indo para a rua, cobrar.

Povo que cobra, foi no que nos tornamos em 2013.

Muito bonito. Mesmo.

Mas acabou.

O atentado do Riocentro desta vez deu certo.

Em sua página no Facebook, o grupo – ratificando, grupo sim – ostenta a famosa foto da “passeata do milhão”, que lotou a Av. Presidente Vargas, no Rio, no dia 20 de junho.

Como tivessem tido alguma responsabilidade em haver reunido tanta gente ali.

Não. Não foi o grupo Black Bloc que mobilizou o povo.

Digo isso porque eu estava lá. E postei tudo para ser visto aqui.

Nem fui eu, ou o Freixo, ou a Sininho, ou o Fora do Eixo, ou a imprensa, ou qualquer partido o responsável por tanta gente na rua.

Daí a beleza daquele dia.

A turma de preto, assim como tantas outras turmas, pegou carona na mobilização espontânea do povo, e o que fez naquela ocasião foi, ao entrar em confronto com uma polícia despreparada, desmobilizar aquele milhão de pessoas que estava na rua.

Aquele milhão, vocês lembram, o povo, vestia branco, inclusive.

E foi, e é até hoje, hostilizado por quem veste preto.

Por isso, sumiram das ruas.

Não é o fim do mundo, como os apocalípticos gralham nas ruas e nas redes sociais, morrendo de calor.

O Brasil está longe, muito longe, no bom sentido, de ser a Síria. De ser o Afeganistão. De ser a Nigéria. De ser a Ucrânia.

Policiais fizeram perícia no local onde o cinegrafista foi atingido (Foto: Marcos Arcoverde/Estadão Conteúdo)

Principalmente na contagem de mortos em confrontos políticos.

Nesta semana morreram 17 num ônibus no oriente médio.

Também morreu trabalhador que obrava no estádio da Copa em Manaus. Ontem morreu outro trabalhador. Estava a serviço no Rio de Janeiro, na Central do Brasil, Centro do Rio, Riocentro.

Aqui na terra tão jogando futebol, tem muito samba, muito choro e rock’n'roll, uns dias chove, noutros dias bate sol, mas o que eu quero lhe dizer é que a coisa aqui não tá preta.

Tá 50 tons de cinza.

Preta mesmo estava em 1964.

E para os amigos e familiares do colega Santiago vai aqui um abraço do tamanho da cidade, porque a gente vai se amando – também, sem um carinho ninguém segura esse, aquele, qualquer rojão.

O Fim e o Princípio

seg, 03/02/14
por Dodô Azevedo |
categoria Cinema

No filme “O Fim e o Princípio”, filmado no sertão da Paraíba, Eduardo Coutinho observa e entrevista pessoas idosas, terminando o papo com a seguinte pergunta. “Você tem medo de morrer?”

Como resposta, ouviu, de primeira: “Eu tenho, você não?”

Também ouviu dos velhinhos sertanejos definições sobre a existência como:

- E quem é o mundo, somos nós?

Ou:

- Só existe o que aconteceu. O que não aconteceu não existe não.

Eduardo Coutinho era o maior cineasta brasileiro em atividade.

Em 2012, a exibição em Cannes da cópia restaurada da obra-prima “Cabra Marcado Para Morrer”, de 1985, com a presença da então ministra da Cultura, Ana de Hollanda, e de cineastas do mundo inteiro, subscreveu essa constatação.

Eduardo Coutinho não compareceu ao festival. Estava internado com pneumonia. Na plateia, nos bastidores, falava-se com preocupação à respeito da possibilidade de um dia Eduardo Coutinho vir a morrer.

Era a preocupação dos que entendem que Coutinho era o mestre definitivo de uma arte humanista. Era a preocupação dos que entendem que só o humanismo radical pode salvar o mundo.

Sim, o mundo: neste domingo, tudo o que se viu nas redes sociais e nos comentários das trágicas notícias publicadas ontem nos portais brasileiros comentavam – “O que está acontecendo com o mundo?”, “Este mundo está perdido!”

Não. Não está perdido. Tragédias acontecem desde que o mundo é mundo. Se existisse internet na época da Idade Média, os portais de notícia teriam atrocidades inomináveis diárias para noticiar.

É que a vida moderna, com seus ares-condicionados e antibióticos, nos transformou em sujeitos muito medrosos. Quem, ao ler as notícias do dia-a-dia, hoje, não sente medo, um medo de tudo, de sair na rua, de não sair na rua, de conhecer pessoas novas, de ficar sozinho, de ir para a passeata, de não ir para a passeata, ou medo do que quer a rapaziada do rolezinho em nossos shoppings centers seguros, medo da atitude suspeita daquela pessoa geralmente de pele escura que vem vindo da esquina em sua direção… Medo: essa é a nossa doença moderna.

Nossa real esquizofrenia.

Se um meteoro cai na Rússia, isso nos deixa com agonia, repercute mais dentro de nós. Mais do que se tua saúde vai bem, ou se tem um vizinho solitário precisa de uma palavra amiga, ou se um mendigo na esquina necessita de um prato de comida.

Temos coisas mais importantes com o que nos preocupar, como a queda do PIB na Argentina ou o coma do Michael Schumacher.

Os gregos, lá atrás, entendiam que a tragédia é cotidiana, humana, e que infalivelmente, acontece na vida. A dramaturgia da Grécia é trágica.

Ao contrário de nós, Eduardo Coutinho e os gregos clássicos não tinham medo do que é trágico. Porque não tinham medo do que era humano.

Nem tinham medo, como nós temos, do mistério. Do invisível.

Os filmes de Eduardo Coutinho estão cheios de melodramas e tragédias inexplicáveis vividas pelas pessoas invisíveis a nós, os verdadeiros esquizofrênicos.

Essas pessoas que a gente passa na rua e não vê, não registra, porque se vestem e se comportam como “pobres sem educação”. Ou as pessoas que moram em quitinete mínimos, como em “Edifício Master”, em favelas, como em “Santo Forte e Babilônia 2000″, ou no sertão da Paraíba, como em “O Fim e o Princípio”.

Esses brasileiros que nos interessa fingir que não existem.

E que por serem incapazes de retribuir a indelicadeza, são mais humanos que nós.

Desumanizados, amendrotados, incapazes de ver os outros, costumamos, nessas horas, comentar: “Este mundo está perdido”.

Tudo o que Eduardo Coutinho fez enquanto viveu foi encontrar o mundo para nós. Fazendo o que, hoje, é a coisa mais difícil para nós, desumanizados: sem julgamentos.

Se o fim da vida de Eduardo Coutinho deixou a arte brasileira com clima de juízo final é nossa responsabilidade: desumanizados, julgamos tudo.

Basta ver os comentários nas notícias dos portais de internet.

Mas Coutinho nunca foi de comentar.

Eduardo Coutinho era de documentar.

Este sempre foi o seu objetivo.

Seu fim.

E sua convicção.

Seu princípio.

Tentar nos salvar foi o fim e o princípio de Eduardo Coutinho.

Foto: Felipe Rau/Estadão Conteúdo



Formulário de Busca


2000-2015 globo.com Todos os direitos reservados. Política de privacidade