Por Alan Tiago Alves, G1 BA


Repasses do MEC para universidades federais chegam ao menor patamar em sete anos

Repasses do MEC para universidades federais chegam ao menor patamar em sete anos

Uma mudança metodológica no orçamento das universidades federais fez com que a Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) fosse uma das mais atingidas para o ano de 2018. A queda do orçamento previsto foi de 37% em relação a 2017.

Por conta do orçamento, a instituição, que foi criada há cinco anos, continua funcionando em locais improvisados. As salas de aula no campus de Itabuna, por exemplo, estão em galpões que antes serviam como depósitos.

Segundo a UFSB, a falta de recursos impede também a compra de equipamentos tecnológicos, livros e instrumentos de laboratório. Os valores de recursos, como bolsas de auxílio a estudantes, estão congelados há três anos.

A queda no orçamento é explicada em parte porque, a partir deste ano, o MEC afirma que passou a concentrar uma parte da verba, e liberar esses recursos ao longo do ano, depois de analisar "a real necessidade" das instituições.

Também registrada na Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf, de Pernambuco), essa queda de mais de um terço representa a maior redução do orçamento inicial entre todas as 63 universidades federais do país, segundo dados do Ministério da Educação retirados do Sistema Integrado de Orçamento do Governo Federal (Siop).

A UFSB, que tem três campi, nas cidades baianas de Itabuna, Porto Seguro e Teixeira de Freitas, foi criada em 2013 e começou a operar em 2014.

O levantamento, feito a pedido do G1, mostra o histórico de uma década do orçamento das 63 universidades federais existentes até 2017. Ele inclui os valores do orçamento previsto e também do valor empenhado, que representa a verba repassada pelo MEC às instituições, já corrigida pela inflação do período, usando como base o IPCA médio. Os dados deixaram de fora as despesas que são obrigatórias por lei, como o pagamento de salários de professores, para analisar apenas o repasse de verbas que podem ser cortadas ou contingenciadas pelo governo federal. Entenda a composição do orçamento das federais

No ano passado, em comparação com 2013, a verba repassada às universidades federais teve queda de 28%.

Em 2014, a instituição de ensino ao sul da Bahia registrou 765 matrículas e um orçamento inicial, previsto na Lei Orçamentária Anual (LOA), de R$ 27,2 milhões, dos quais R$ 18,5 milhões foram efetivamente empenhados pelo MEC. Para este ano, o orçamento inicial aprovado foi de apenas R$ 17,2 milhões, mais de um terço a menos que os R$ 27,4 que haviam sido aprovados para 2017.

Mudança de metodologia

Campus de Porto Seguro da Universidade Federal do Sul da Bahia — Foto: Divulgação/ UFSB

O Ministério da Educação afirma que o orçamento inicial das universidades federais em 2018 não pode ser diretamente comparado com o de anos anteriores por causa de uma mudança metodológica, "o que provoca distorção nos números".

A partir deste ano, 50% dos recursos destinados a novos investimentos em cada universidade ficam alocados no próprio MEC. Essa verba serve, por exemplo, para a construção de salas de aula e laboratórios de ensino, mas agora ela vai sendo liberando pelo MEC a cada instituição no decorrer do ano. "Isso permitirá distribuir o recurso de acordo com a real necessidade após análise global da rede", diz o MEC.

No total das 63 universidades, porém, 29 tiveram aumento na dotação orçamentária inicial. Já a UFSB está no grupo de 17 federais que tiveram uma redução de pelo menos 20% no orçamento previsto para o ano.

Os R$ 17,2 milhões que estão previstos são menores que a dotação inicial de 2017 e também ao valor empenhado, que, segundo o MEC, representa a quantia que já teve a execução aprovada pelo governo federal.

Veja abaixo a evolução de repasses do MEC à UFSB:

Evolução de repasses do MEC à UFSB
Veja o total da verba empenhada ano a ano pelo governo federal à Universidade Federal do Sul da Bahia
Fonte: Ministério da Educação

Veja a evolução de repasses a todas as universidades federais da Bahia

Orçamento x matrículas

A UFSB foi uma das últimas instituições federais do país a serem criadas dentro do Reuni, o programa de expansão das universidades federais que surgiu em 2007.

Nos dois anos seguintes depois da abertura da UFSB, a verba empenhada para a instituição aumentou para R$ 18,5 milhões, em 2015, e R$ 24,1 milhões, em 2016, um aumento de 30%. Em 2017, no entanto, o valor permaneceu quase o mesmo, aumentando apenas 4%, para R$ 25,2 milhões. No ano passado, o valor empenhado foi de R$ 27,3 milhões.

Enquanto a variação do valor empenhado pelo MEC foi de 47,3% entre 2014 e 2017, a expansão de matrículas da UFSB cresceu em ritmo mais acelerado.

De 2014 para 2015, ela saltou 82%, de 765 para 1.392 estudantes de graduação. Em 2016, ano dos dados mais recentes do Censo da Educação Superior, eram 2.194 estudantes matriculados, o que representa um aumento de 186,8%.

Os especialistas ressaltam, porém, que não é possível dividir o total da verba pelo total de matrículas, já que as federais também realizam outras atividades além da graduação, principalmente a pesquisa em nível de pós-graduação. Além disso, alguns cursos exigem verbas mais altas do que outros, por causa da necessidade de laboratórios e equipamentos.

Impacto

Segundo a UFSB, o descompasso entre o aumento de matrículas e o aumento de verba fez com que os recursos para permanência estudantil (bolsas, auxílios para alimentação, moradia, transporte...) estejam congelados há três anos.

Mas o maior impacto do corte orçamental, diz a instituição, ocorre no investimento, pois o contingenciamento impede que a universidade adquira equipamentos e materiais permanente, o que pode afetar o andamento de obras estratégicas.

Aproximadamente R$ 40 milhões foram solicitados pela instituição para investimento em 2018, mas o valor inicial previsto para repasse pelo governo representa somente 45% disso.

Ainda segundo a UFSB, apesar de não ter havido corte nos recursos de custeio/manutenção do exercício 2017 para 2018, não houve acréscimo, o que, conforme a instituição, inviabiliza a expansão da Universidade.

A UFSB diz que há obras e projetos em andamento. Dentre eles, conforme a institução, três projetos são estratégicos e fundamentais para expansão: construção de três núcleos pedagógicos nos campi, tendo em vista que a universidade não possui prédios próprios construídos.

Há, ainda, de acordo com a UFSB, projetos em desenvolvimento para expansão de matrículas, mas dependem da construção dos três núcleos pedagógicos. Também há propostas em andamento de criação de novos cursos.

Para cobrir os gastos frente à redução orçamentária, a UFSB informou que suspendeu aquisições de equipamentos e materiais permanentes a fim de equipar laboratórios e salas de aula. Diz, ainda, que não possui receitas próprias suficientes para cobrir os cortes e que tem trabalhado estritamente em conformidade com o disponibilizado na LOA.

Repercussão

Alunos da UFSB ocuparam os três campi da instituição, em Itabuna, Teixeira de Freitas e Porto Seguro, em 2016 em protesto contra PEC. — Foto: Reprodução/TV Santa Cruz

Em 2016, docentes, alunos e servidores técnicos administrativos da instituição de ensino realizaram atos, inclusive com paralisação de atividades e ocupação de campi, contra a Proposta de Emenda à Constituição, do governo federal, que estabelece um teto para os gastos públicos por 20 anos -- pela proposta, as despesas da União (Executivo, Legislativo e Judiciário) só podem crescer conforme a inflação do ano anterior.

Alunos e funcionários diziam que, com a PEC, que passou a vigorar no final de 2016, haveria falta de investimento na educação, suspensão de concursos públicos e de novas contratações, a diminuição do investimento em novos institutos federais e universidades e o congelamento de salários.

A UFSB afirma que não houve, até então, demissão de funcionários técnicos, ou encerramento de contratos de serviços terceirizados, e nem de docentes por causa nos últimos anos, em decorrência de corte orçamental. Os professores, no entanto, dizem agora estar preocupados com a possibilidade de a instituição ficar estagnada.

"No primeiro ano de funcionamento, ela [a UFSB] foi concebida de um plano orientador que previa a implementação da instituição em etapas, considerando que outras necessidades, outras demandas, se dariam em anos subseqentes. O plano previa implementação gradativa de material, de pessoal, que haveriam mais contratações e, com os cortes, essa possibilidade de manutenção e expansão dessa estrutura se torna impossível. Os cortes impactam em todas as questões inerentes à instituição, não só as despesas correntes e atividades dos campi, como a previsão orçamentária das bolsas estudantis", destaca Celso Francisco Gayoso, professor de artes e humanidades da UFSB e representante dos docentes da instituição junto ao Conselho Universitário.

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