Nas reportagens da série Investidor entrevista Startup, o head de um fundo (de Venture Capital, Corporate Venture Capital ou Private Equity) escolhe uma startup e entrevista seu founder ou CEO. Neste episódio, Época NEGÓCIOS convidou Guilherme Chernicharo, sócio da mineira Hiker Ventures, marca de venture capital da AF Invest, gestora do grupo Araújo Fontes. Fundada em 2023 em Belo Horizonte, a Hiker investe em empresas B2B em estágio inicial, mas com produto já validado no mercado.
Para esta reportagem, Chernicharo decidiu bater um papo com a proptech Yuca, criada em 2019 por Paulo Bichucher, Rafael Steinbruch e Eduardo Campos. A startup começou oferecendo locação de apartamentos compartilhados (coliving) em bairros centrais de São Paulo, e depois expandiu o portfólio, passando a trabalhar também com apartamentos prontos para morar, além de ter uma frente de investimentos residenciais para renda, a Yuca Invest. Quem representou a startup na conversa foi Paulo Bichucher, founder e CEO da Yuca.
Confira a seguir os principais trechos dessa conversa.
Guilherme Chernicharo
Acho que para a gente começar o papo aqui, nada melhor do que ouvir do empreendedor a história da Yuca e do Paulo pré-Yuca, como surgiu a ideia, quais foram os maiores desafios.
Paulo Bichucher
Fiz faculdade na FGV, mas focado em empreendedorismo. Acabei caindo na área de investimentos, no time de Private Equity, onde eu fiz basicamente minha carreira profissional quase toda antes de empreender. Depois, fui fazer MBA fora, em Wharton, focado em real estate e tecnologia. No meu segundo ano, foquei 100% do meu tempo em como entrar no mercado de real estate usando tecnologia. Voltando para o Brasil, eu conheci meu co-fundador Rafael, ele estava também com a ideia de empreender em real estate com tecnologia, e a gente foi pesquisando que tipo de mudanças no mundo estavam acontecendo e que podiam ser transportadas para o Brasil.
Se você olha o mundo imobiliário fora do país, você percebe que a maior classe de ativo é a classe residencial para renda, apartamento de aluguel. Fomos para a Ásia visitar algumas operações. E o que surgiu foi a ideia de profissionalizar a alocação na perspectiva do investidor. A gente viu que os investidores institucionais estavam vindo para o Brasil lá em 2019, e que existia uma parcela crescente dos imóveis no Brasil sendo entregues na mão de investidores. Então, como você serve esse público?
Para aumentar o retorno sobre o imóvel, a gente começou num modelo muito parecido que a gente viu na China. Vamos pegar apartamento antigo, reformar e sublocar os quartos. A gente fez isso em 2019. Estava dando retornos na faixa de 9%, em contratos de longo prazo, quando a média de retorno do mercado era 4,5%. A gente criou toda uma base de imóvel, mas aí veio a pandemia, e a gente rapidamente expandiu nosso portfólio de produto com apartamentos tradicionais. Desde então, a gente foi construindo essa plataforma de locação. De um lado, voltada para o investidor de residencial para renda – a gente provê ajuda de ponto a ponto, desde dados, consultoria, para que esses investidores consigam investir, comprar, reformar os imóveis, para ter o melhor retorno naquele investimento, passando por toda a etapa de locação. E a gente tem o nosso próprio marketplace, onde as pessoas locam os apartamentos. Os apartamentos estão sempre prontos para morar, porque a ideia é que o inquilino de hoje não quer gastar dinheiro para morar de aluguel, ele só quer pagar o aluguel. E, eventualmente, a gente tem também produtos que ajudam o investidor a manter um acompanhamento do ativo dele, dos retornos dele, que é o nosso PMS, nosso Property Management System.
Desde então, a gente vem construindo essa plataforma de tecnologia, abocanhando esses três frentes de tecnologia, tanto nos investidores individuais, mas, principalmente, nos investidores institucionais. Então, a gente trabalha com nomes muito grandes, como Jard, Cerberus, Gazit e outros, que são grandes detentores de residencial para renda fora do país, mas que estão começando no país.
Guilherme Chernicharo
Legal. Sou fã da sua tese, já conheci há algum tempo e acho que é legal. Falando da tese da Yuca, o quanto o conceito ‘asset light’ está incorporado em tudo que você está construindo? Se não me engano, você teve um pouco de sublease no início da trajetória, mas agora você está bem focado nisso e mostra o quanto ela tem, de fato, uma tecnologia embarcada e uma inteligência de mercado no modelo de negócio que você está criando, correto?
Paulo Bichucher
Exatamente. Eu acho que no começo todo mundo usou desse artifício de você sublocar, reformar e locar os imóveis, que, na cabeça de muita gente, era ‘asset light’, porque você não tinha o imóvel, mas não é, porque você fazia a reforma e você corre o risco da ocupação – se está vazio você está pagando o leasing. A gente precisou começar assim, na verdade, até para provar que a gente tinha um produto em que as pessoas gostariam de morar. Mas quando veio a pandemia, a gente parou de fazer esse sublease e foi direto para o modelo de gestão. E tem sido ótimo ter mudado para esse modelo: você cresce mais devagar em termos de faturamento, mas com uma qualidade de receita e margem bem maior.
Guilherme Chernicharo
Agora, queria puxar um gancho para a sua construção da jornada. Você teve uma vivência como investidor, trabalhou em algumas casas de private equity, e aí depois de cinco anos virou empreendedor e mudou do lado da mesa. E conseguiu grandes captações. E a gente surfou uma onda ali, de 2021, onde grandes captações foram realizadas. Se você puder contar um pouquinho como foi esse relacionamento com investidores e, hoje, qual seria sua dica para os empreendedores.
Paulo Bichucher
A gente criou a Yuca num momento onde o cenário macroeconômico estava muito diferente e o capital estava muito disponível para empreendedores que tinham ideias grandes. Não que não esteja hoje, mas talvez tenha que ter um plano de negócios bem mais refinado do que só uma ideia para você conseguir ter esse acesso a capital. Lá atrás, onde a ideia era relevante, o tamanho do time era relevante, a qualidade do time em si era relevante, a marca por si só era relevante, hoje continua relevante, mas o ‘unit economics’ tem que estar provado. Você tem que provar que você faz dinheiro.
Se eu soubesse melhor, talvez teria sido mais detalhista no volume de captação que a gente teve para atacar alguns produtos e áreas que tentamos ao longo do tempo e que não se tornou viável. Só um exemplo, a gente chegou a ter dez devs mobile para um aplicativo para o morador, enquanto a gente nem tinha tantos moradores, os apartamentos ainda estavam ficando prontos. Tinha dez devs e tinha, sei lá, 500 moradores. Não faz sentido nenhum essa conta. Hoje a gente teria feito diferente, com certeza.
Guilherme Chernicharo
Agora, para o futuro: o que você espera de fato dos próximos cinco anos? Onde a Yuca vai estar, onde o Paulo vai estar, já vai ser uma venda estratégica, o Paulo vai lá para Maldivas curtir a vida?
Paulo Bichucher
Não sei se para Maldivas, eu não sei se eu consigo ficar muito tempo parado tomando sol, mas a Yuca eu acho que finalmente está chegando num lugar onde a gente entende profundamente as dores do nosso principal cliente, que é o investidor, o proprietário. Para os próximos cinco anos, o que a gente quer é desenvolver o maior número de soluções possíveis para essa pessoa continuar rentabilizando o imóvel e os investimentos dela da melhor forma. Daqui a cinco anos, ela com certeza vai ter saído de São Paulo, hoje a gente está focado em São Paulo. Vai ter uma gama de produtos, seja compra e venda de imóvel voltado 100% para o investidor, seja você conseguir fazer antecipação de aluguel para o investidor poder reformar o apartamento dele, seja você lançar o cartão de crédito da Yuca para o inquilino pagar e ganhar ponto no pagamento do seu aluguel...
E a gente hoje tem o maior market share em termos de players profissionais. Gostaria que daqui a cinco anos a gente não se tornasse apenas o maior market share entre esses players, mas ter o maior share of wallet. Então, provar para esses players que a gente é muito bom no que a gente faz e ganhar cada vez mais participação das unidades deles e conseguir ser o parceiro número um, tanto da parte de tecnologia, como da parte de operação, como da parte de diversificação desses investidores que estão no Brasil e que querem entrar no Brasil. Pensou investimento em residencial para renda, pensou Yuca, vamos falar assim. A Yuca daqui a cinco anos tem que ser ‘top of mind’ para investidor que quer entrar no mercado de residencial para renda e tem que entregar o melhor retorno para esse investidor, tanto na parte de locação, quanto na parte de liquidez, compra e venda, onde ele estiver do Brasil.