Inovadores

Para Edu Lyra, idealizador do ecossistema de desenvolvimento social Gerando Falcões, a inovação surgiu em sua vida muito antes de empreender. Segundo ele, foi uma questão de sobrevivência, que começou dentro de casa.

"Eu tive que inovar muito para sobreviver e desviar dos tiros na favela", dispara ele em entrevista a Época NEGÓCIOS. Nascido em uma comunidade precária em Guarulhos, na Grande São Paulo, Edu cresceu em um contexto desafiador: viver em uma favela violenta e sem condições básicas de saneamento, enquanto o pai estava preso e a mãe se virava como podia como diarista para o sustento da família.

"Como minha família era muito pobre, lembro que minha mãe picotava um bife em muitos pedacinhos para a gente comer durante uma semana inteira. E a gente tinha uma sensação de prosperidade quando ela fazia isso, não de pobreza. Então, pequenos gestos como esse foram me ensinando sobre inovação", afirma.

Segundo ele, é como se o sistema tivesse botado uma bomba-relógio em seu pescoço e ela iria explodir a qualquer momento. No entanto, ele decidiu transformar a possibilidade de uma tragédia em sua maior obsessão de vida: a de desarmar as "bombas da pobreza", viabilizando projetos de impacto social em periferias e favelas do Brasil.

O incentivo e a força que o move, desde menino, vêm de sua mãe, Maria Gorete, que sempre lhe dizia: "Não importa de onde você vem, o que importa na vida é aonde você vai. E você pode ir aonde quiser, você pode tudo."

O início da jornada como empreendedor

Foi na faculdade que Edu começou a empreender. Trancou o curso de Jornalismo, na Universidade Mogi das Cruzes (UMC), e decidiu "ir para o mundo". Teve a ideia de escrever um livro, intitulado “Jovens Falcões”, para contar histórias de superação de jovens que deram certo.

Ao ter a publicação de sua obra rejeitada por uma editora, Edu não se abalou. Decidiu, então, reunir um time de 50 jovens para vender os exemplares de porta em porta na periferia e na favela por R$ 9,99. A estratégia deu certo. Em três meses, vendeu 5.000 livros e, com o dinheiro das vendas, fundou em 2011 - junto com três amigos - a Gerando Falcões, como uma ONG.

A rede já impactou mais de 5.500 favelas por todo Brasil, com a formação de líderes sociais e acompanhamento de organizações, além de projetos sociais que têm por objetivo redesenhar as favelas brasileiras, transformando-as em um ambiente "Digno, Digital e Desenvolvido".

Tecnologias sociais escaláveis

Os projetos desenvolvidos pela Gerando Falcões são denominados pela rede como tecnologias sociais escaláveis de superação da pobreza. O mais recente deles, entregue em outubro deste ano, foi o Favela 3D (Digna, Digital e Desenvolvida) na Favela Marte, em São José do Rio Preto, no interior de São Paulo.

Ao longo de dois anos de trabalho, foi possível, em conjunto com a CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo), reconstruir 239 residências, sendo 16 delas adaptadas para moradores com necessidades especiais. Antes do projeto, apenas 6% das famílias viviam em casas de alvenaria e 12% tinham acesso à água encanada. A partir do Favela 3D, 100% das famílias terão moradia digna, com casas de alvenaria, acesso à água encanada, esgoto e banheiros, além do direito à educação, cultura e lazer.

Projeto Favela 3D, na Favela Marte, em São José do Rio Preto, leva moradia digna às famílias carentes — Foto: Divulgação
Projeto Favela 3D, na Favela Marte, em São José do Rio Preto, leva moradia digna às famílias carentes — Foto: Divulgação

Já com o projeto "ASMARA”, negócio social focado na geração de renda para as mulheres das favelas, Edu pretende transformar a vida de 500 mil mulheres em três anos. Todos os meses, cada Mara, como são chamadas as mulheres que fazem parte da iniciativa, recebe gratuitamente um kit com 80 itens, entre roupas e sapatos, vindos de doação e com preços variados e 80% mais baratos se comparados ao mercado tradicional.

O objetivo de cada “mara” é realizar a venda direta desses itens em sua própria comunidade em um prazo de 30 dias. Caso sobre algum item para ser comercializado, o mesmo retorna para o estoque do projeto e é enviado para outra comunidade que possa ter interesse nessa peça. Vale ressaltar que essa devolução não acarreta nenhum custo para as vendedoras. A expectativa da rede é chegar a 7.000 "maras" até dezembro.

Incansável em seu propósito e metas, Edu não pretende parar tão cedo. "Já me perguntaram se vou tirar um ano sabático. É claro que não, agora que eu vou trabalhar ainda mais, quero criar novos projetos. É isso que me alimenta", diz.

Para 2025, Edu adiantou em primeira mão a Época NEGÓCIOS, que a Gerando Falcões se prepara para criar coalizões com cidades-chave para embarcar num plano de quatro anos para investir nas favelas, inová-las e resolver problemas sociais para construir dignidade.

"Criamos uma área governamental na Gerando Falcões específica para isso. Ter uma agenda de inovação nas favelas para construção da dignidade, incluindo um comitê permanente multisetorial, para fazer o mapeamento, planejamento e a transformação de cada vez mais favelas", planeja. "Quando olho para trás e vejo que a gente solidificou, me dá muita alegria e orgulho. Estou só começando, agora é o momento de ganhar escala", acrescenta.

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