Por R$ 11,2 bilhões, a ArcelorMittal concluiu, em 2023, uma etapa decisiva na sua história: a compra da Companhia Siderúrgica de Pecém, no Ceará. É o apogeu de um ciclo de investimentos de R$ 25 bilhões iniciado em 2022, a se completar em 2026, com ampliação do potencial produtivo e extensos investimentos em sustentabilidade. Um traço importante, pois a siderurgia, como se sabe, é um dos setores com mais desafios ambientais – responde por 7% a 9% das emissões totais de gases de efeito estufa. Campeã setorial, a ArcelorMittal é a empresa do ano nesta edição.
* Este conteúdo foi publicado originalmente na edição de novembro de Época NEGÓCIOS, que está disponível na versão digital, nas bancas e no app Globo+.
Pecém trouxe para a ArcelorMittal uma capacidade extra de produção de 3 milhões de toneladas de aço. Quando se completarem os aportes previstos, o volume pode chegar a 5 milhões. Com a ampliação, a empresa vendeu, em 2023, 14,4 milhões de toneladas na América Latina, acréscimo de 16,5% em comparação com o ano anterior.
“É uma planta extremamente produtiva, que baixou os nossos custos com alta qualidade”, diz Jefferson De Paula, presidente da ArcelorMittal Brasil e CEO da ArcelorMittal Aços Longos e Mineração América Latina. Segundo ele, a aquisição da Pecém (agora rebatizada de Arcelor Pecém) traz três vantagens estratégicas. A primeira é o fato de ser “muito bem localizada para exportações”. A usina tem acessos, via correias transportadoras, ao porto de Pecém. Algo fundamental, pois as exportações da ArcelorMittal respondem hoje por 40% dos seus negócios.
Segunda vantagem: aumentar, com investimentos no Nordeste, o potencial de produção de laminados planos e longos no Brasil. “Nós acreditamos no crescimento sustentável do país e estamos muito bem preparados para manter a liderança aqui”, afirma o presidente.
Em 2023, a ArcelorMittal teve receita líquida de R$ 69,8 bilhões, um pequeno recuo de 2,6%, mesmo com a concorrência da China que, segundo De Paula, vende abaixo do custo por contar com uma sobrecapacidade de produção. Com o tamanho da receita, a ArcelorMittal é a 15ª maior empresa do país.
O terceiro fator estratégico torna a compra da Pecém ainda mais interessante: a unidade vai usar “energia verde, limpa, renovável”, por se localizar em região fortemente propícia para a geração de energia eólica. “Estamos em negociações com outras empresas para fabricar também hidrogênio verde”, afirma De Paula. “Isso poderá motivar uma remodelagem para produção de aço verde, a ser consumido no Brasil e no exterior.” Hidrogênio verde não emite poluentes.
Além da aquisição da Unidade de Pecém, a ArcelorMittal formalizou em 2023 uma joint venture com a Casa dos Ventos, de soluções de energia sempre “em harmonia com o meio ambiente”. Aí está um dos vetores da política de sustentabilidade da ArcelorMittal no Brasil. A transação recebeu aporte de R$ 3,2 bilhões do BNDES para a construção de um dos maiores parques eólicos do país, iniciada imediatamente.
Resultado dessa parceria, o projeto Babilônia Centro está localizado nos municípios de Morro do Chapéu e Várzea Nova, na Bahia. Será inaugurado em outubro de 2025, com capacidade de 553,5 MW e investimento total de R$ 4,2 bilhões. É o maior contrato corporativo de energia renovável do Brasil. Vai abastecer com energia limpa aproximadamente 40% do consumo elétrico da empresa no Brasil, responsável pela sexta maior conta de luz do país. A ArcelorMittal terá, assim, 70% de geração própria.
Uma nova joint venture com a Casa dos Ventos foi anunciada pela ArcelorMittal em agosto de 2024, dessa vez para a implantação de um projeto de energia solar. Será na mesma área do Babilônia Centro e receberá investimento de aproximadamente R$ 690 milhões. Terá 200 MW de potência instalada.
Na mesma ocasião, De Paula anunciou contrato com a multinacional Atlas Renewable Energy, líder em energia renovável na América Latina, para a construção do parque Luiz Carlos de energia solar em Paracatu, Minas Gerais. O aporte será de R$ 895 milhões, e a produção prevista chegará a 69 MW médios/ano, com potência instalada de 269 MW. Segundo o presidente, além de garantir o suprimento das usinas com fonte própria de energia renovável, os investimentos visam à diversificação da matriz energética, à redução dos custos operacionais e ao aumento da competitividade.
Já foi investido cerca de R$ 1,8 bilhão no desenvolvimento de tecnologias para redução das emissões por meio dos centros de pesquisa e desenvolvimento do grupo. Até 2030, trabalhará com melhoria dos processos existentes e, depois disso, empregará tecnologias inovadoras. No campo da sustentabilidade, De Paula cita ainda a maior planta de dessalinização de água do mar para fins industriais do Brasil na unidade de Tubarão (ES), com investimento de R$ 50 milhões e capacidade para dessalinizar 500 m3/hora de água.
Com os três projetos, divididos em 80% de geração eólica e 20% de energia solar, a ArcelorMittal pretende fazer um corte de 200 mil toneladas de CO2 em suas operações. Fazem parte do esforço de descarbonização da ArcelorMittal, pioneira ao lançar a meta de ser carbono neutra até 2050, com um passo intermediário, de reduzir as emissões em 25% até 2030.
A ArcelorMittal mantém 15 centros de pesquisa no mundo todo, um deles no Brasil. Inaugurado em 2015, com sede em Tubarão, a unidade de P&D brasileira atende às demandas de inovação em aços planos e longos, com criação e aperfeiçoamento de produtos e processos e avanços na área de atendimento aos clientes. “Não há sustentabilidade sem inovação”, afirma o presidente.
Inovação e vanguardismo são marcas da empresa desde suas origens, há 104 anos, quando foi criada a usina de Sabará (MG), fruto da associação entre o grupo produtor de aço europeu Arbed e a Companhia Siderúrgica Mineira, resultando na Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira. Nesse período, a usina possuía o maior alto-forno a carvão vegetal do Brasil, com capacidade para produzir 25 toneladas de gusa por dia.
Na origem dessa associação está a procura, por um grupo de engenheiros da Escola de Minas de Ouro Preto interessado na produção de minério de ferro no Brasil, de apoio da Bélgica e de Luxemburgo. Hoje, a sede da ArcelorMittal fora do país fica em Luxemburgo.
Em 1925, a Belgo-Mineira tornou-se a primeira produtora de aço a contar com uma usina integrada na América do Sul, também na unidade de Sabará. Em 2002, a fusão entre a luxemburguesa Arbed, a francesa Usinor e a espanhola Aceralia deu origem ao grupo Arcelor. Três anos depois, após uma reestruturação societária, a Arcelor Brasil foi criada e passou a controlar a Belgo Siderurgia, a então Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST) e a unidade Vega do Sul, em São Francisco do Sul (SC). No ano seguinte foi anunciada a megafusão entre o grupo Arcelor e a indiana Mittal Steel. Daí nasceu a atual ArcelorMittal.
De Paula destaca um momento recente da história da companhia como um dos passos “de maior orgulho”: a aquisição, em 2018, da Votorantim (atual ArcelorMittal Sul-fluminense). A ArcelorMittal incorporou operações de vergalhão, fio-máquina, produtos transformados para a construção civil, perfis leves e médios.
Esses itens vieram a se somar aos aços planos e longos da empresa, tubos, arames e barras trefiladas, além de turbinas laminadas a quente fabricadas em Tubarão, a maior fábrica do grupo ArcelorMittal no mundo. “Antes da compra, éramos a segunda maior empresa do ramo de aço do Brasil. A líder era a Gerdau, e o terceiro lugar ficava com a Votorantim”, afirma De Paula. “Com a incorporação, assumimos a liderança.”
Hoje, a ArcelorMittal tem unidades industriais em 15 países, clientes em 140, e 127 mil empregados. No Brasil, conta com fábricas em oito estados e duas minas de ferro em Minas Gerais. Atende principalmente as indústrias automobilística, de eletrodomésticos, construção civil, óleo e gás e máquinas e equipamentos.
“Nosso modelo de gestão é muito forte. Estamos focados em desenvolver talentos para continuar sempre com os melhores resultados”, diz De Paula. As metas da empresa são definidas anualmente em reuniões com todos os vice-diretores, e há encontros trimestrais para ajustes. A mobilidade e os bônus dentro da companhia são definidos também em sistema de cascata invertida, por meio de planos de sucessão que começam nos cargos de gerência e afunilam para a alta direção. “Das discussões estratégicas saem também todos os projetos e suas métricas”, diz De Paula.
Instituído em 2007, o Programa de Integridade agrupa vários princípios para serem seguidos, como transparência e compliance. Eles inspiraram um código de conduta e princípios expressos em políticas anticorrupção, de direitos humanos, com acesso aos meios de denúncia. A ArcelorMittal usa ainda aplicativos para trabalhar a integração dos funcionários, e eventos como a Conecta Week – duas semanas de ações de engajamento.
Há três anos, os programas I AM Líder e I AM Estágios atendem as duas pontas da carreira dos funcionários da ArcelorMittal, com o objetivo de estimular habilidades e capacidade de comando. Em 2022, as atividades se centraram em negócios estratégicos e ESG, e em 2023 em relações interpessoais, ética, inclusão e diversidades.
No mesmo ano, foram investidos cerca de R$ 50 milhões nas iniciativas de promoção social da empresa, sobretudo no entorno das usinas, com ações nas áreas de educação, cultura, esporte, saúde, meio ambiente e infraestrutura urbana. De Paula destaca também o plano da companhia voltado à inclusão. “Além de ser movida por princípios de justiça, a diversidade enriquece o ambiente corporativo e traz bons resultados por estimular visões diferentes do negócio e do mundo.”
A empresa conseguiu bater a própria meta de ter 20% dos cargos de liderança preenchidos por mulheres ao chegar a 21% no início de 2024. O Programa de Diversidade, Equidade e Inclusão, lançado em 2019, se organiza em quatro dimensões: equidade de gênero, diversidade racial, pessoas com deficiência e pessoas LGBTQI+.
“O que mais me dá orgulho ao ocupar a posição de presidente é ter criado uma cultura de desempenho cujo primeiro pilar são os nossos empregados e sua formação profissional”, afirma De Paula. “As aquisições e joint ventures são prova de que temos capacidade de fazer grandes investimentos com segurança e geração constante de valor.” E, importante, com compromissos socioambientais.