Se olhássemos para o passado, a única maneira de realizar um pagamento ou fazer investimentos no mercado financeiro seria ir até uma agência bancária. O processo envolvia conversas longas com o gerente, aguardando que ele oferecesse as melhores opções para uma decisão, em que o conhecimento estava totalmente centralizado no profissional do banco. As agências, localizadas em áreas nobres, eram imponentes, com funcionários bem-vestidos e altamente capacitados sobre o mercado financeiro.
Para o cliente, esse cenário envolvia questões como tempo de atendimento, confiança, relacionamento e a escolha entre poucas opções de produtos financeiros. A dificuldade para acessar esses serviços também era evidente: longas filas, burocracia excessiva e a necessidade de apresentar uma grande quantidade de documentos para realizar transações financeiras.
Neste mesmo período, os caixas eletrônicos começaram a inaugurar uma nova era no sistema financeiro, especialmente no Brasil. Essa inovação permitiu a realização de uma série de operações bancárias de forma digital, o que, na época, foi um avanço extraordinário. Em muitas regiões do Brasil, onde a infraestrutura rodoviária era precária, os caixas eletrônicos começaram a atuar como um agente silencioso de transformação financeira. A ideia de que poderia haver mais inovações além dos caixas eletrônicos parecia impensável para muitos.
Por trás dessa evolução tecnológica, houve um esforço substancial de modernização dos sistemas de backoffice, treinamento de pessoal e mudanças nos mecanismos de regulação do sistema financeiro. A combinação de investimentos em tecnologia, inovação, qualificação profissional e uma nova mentalidade por parte dos reguladores permitiu a construção de um sistema financeiro robusto e resiliente.
Esses avanços ocorreram em um contexto econômico complexo, com juros elevados, o início do Plano Real, inflação alta, crescimento do endividamento público, e até mesmo a falência de alguns bancos. No entanto, foi nesse ambiente desafiador que se iniciou a transição para a transformação digital, com um foco crescente na experiência do cliente. O Brasil acabou criando um dos sistemas financeiros mais modernos e resistentes a crises do mundo.
Hoje, o principal foco está na experiência do cliente. As instituições financeiras oferecem aplicativos digitais ágeis, que fazem uso de dados e inteligência artificial para fornecer soluções em tempo real, como recomendações personalizadas. Além disso, o papel do assessor bancário foi transformado: ele se tornou um especialista não só no mercado financeiro, mas também nas tecnologias digitais e na jornada do cliente.
O Banco Central também tem promovido importantes mudanças, como a implementação do Pix, do Real Digital, das carteiras digitais e do uso de criptomoedas como alternativas de pagamento. Juntas, essas iniciativas têm modernizado ainda mais o sistema financeiro brasileiro, tornando-o mais ágil, eficiente e integrado à economia digital.
Paralelamente, a governança bancária foi aprimorada, com foco em aumentar a eficiência e os resultados financeiros. Esses esforços, combinados com a busca por maior rentabilidade, ajudaram a transformar o sistema financeiro brasileiro em um exemplo global. Hoje, o Brasil é reconhecido mundialmente pela sua capacidade de adotar novas tecnologias no setor financeiro e pela resiliência do seu sistema.
O exemplo do setor financeiro brasileiro pode servir de inspiração para outros setores da economia, ainda tão carentes de inovação e digitalização. O compromisso com a mudança e o investimento em novas tecnologias têm sido fundamentais para o sucesso do setor financeiro e podem ser aplicados de maneira semelhante em áreas como saúde, educação e comércio, onde ainda existem desafios relacionados à digitalização e à criação de soluções efetivas.
*Hugo Ferreira Braga Tadeu é Diretor do Núcleo de Inovação e Tecnologias Digitais da FDC. Conselheiro de empresas e coordenador de estudos com WEF, IMD e PwC.