O espaço que os carros ocupam nos Estados Unidos impressiona: em Nova York, há 3 milhões de vagas no meio-fio (sem contar os estacionamentos), que correspondem a 6% da área da cidade; em Los Angeles, os estacionamentos somam 520 quilômetros quadrados. No livro "Paved Paradise: How Parking Explains the World" ("Paraíso Pavimentado: como o Estacionamento explica o mundo", em tradução livre), o autor Henry Grabar afirma que, em termos de área, há mais lugar para carros nos Estados Unidos do que habitação para as pessoas.
Na obra, ele traz números que comprovam a tese: em muitas cidades, o número de vagas de estacionamento dedicadas a cada moradia impressiona: na Filadélfia, são 3,7 vagas por domicílio; Seattle, 5 e em Des Moines, 20 vagas para unidade. Muitos centros urbanos americanos, "como Little Rock, Newport News, Buffalo e Topeka, têm mais terra dedicada ao estacionamento do que aos edifícios", diz a publicação.
O livro detalha os caminhos que levaram a isso: muitas cidades criaram centros urbanos para compras em bairros considerados degradados e, para competir com os shoppings, era oferecido estacionamento gratuito. Além disso, nas décadas de 1950 e 1960 praticamente todas as jurisdições nos Estados Unidos exigiam vagas de estacionamento em cada nova casa, escola, escritório, loja, cinema ou quadra de tênis que fosse construída.
As cidades também criaram estacionamentos municipais - até o final da década de 1960, 90% dos estacionamentos em garagens e quase 70% das vagas de estacionamento "de superfície" eram de propriedade pública, segundo a pesquisa para o livro. Esses números, no entanto, não aparecem em livros didáticos de planejamento urbano nem nos currículos de escolas de arquitetura por lá.
Os requisitos mínimos de estacionamento para novas moradias acabam encarecendo os orçamentos de construção. O autor conta que cinco studios exigiriam um espaço para carro cada; cinco apartamentos de um quarto precisam de oito vagas, enquanto cinco unidades de dois quartos necessitam de dez espaços para estacionar. O tamanho de muitos terrenos não suporta essa quantidade de vagas de estacionamento.
Entre os impactos, o livro traz dados de que a construção de edifícios de duas, três e quatro unidades caiu mais de 90% entre 1971 e 2021. E os arquitetos se sentem limitados. "Na verdade, nós apenas organizamos espaços de estacionamento. É a primeira coisa em que você pensa. Os espaços determinam a grade de colunas e as colunas determinam o edifício", desabafa o arquiteto Daniel Dunham, de Los Angeles, ao autor.
Algumas cidades perceberam e mudaram a legislação. Los Angeles aprovou em 1999 uma portaria que eliminou os requisitos mínimos de estacionamento exigidos para a reforma de edifícios comerciais para habitação. O impacto veio: em uma década, só o empreiteiro Tom Gilmore conseguiu converter mais de 60 prédios vazios em 6.500 apartamentos - mais do que o centro da cidade havia construído nas três décadas anteriores - e a população dessa região triplicou até 2020.
Em 2015 os requisitos mínimos de estacionamento em cidades de todo os Estados Unidos começaram a ser eliminados, e algumas delas permitiram que as vagas fossem compartilhadas entre usuários diurnos e noturnos em edifícios comerciais e residenciais de uso misto, por exemplo.
O espaço público também poderia ser melhor aproveitado se não houvessem tantas vagas para estacionar. Um estudo de 2021 apontou que, se Nova York recuperasse apenas um quarto do espaço de rua destinado aos carros, poderiam ser criados 800 quilômetros de faixas de ônibus; 65 quilômetros de vias exclusivas de ônibus; 3,5 milhões de metros quadrados de espaço comunitário; 1.600 quilômetros de ruas abertas; 280 mil m² de novos espaços para pedestres e 500 mil m² para restaurantes, empresas e instituições culturais.