Organize a casa

Por Cora Fernandes

Na coluna Organize A Casa, a personal organizer Cora Fernandes mostra a importância da organização na vida familiar, profissional e social das pessoas


Coluna Cora Fernandes - Caixinha de memórias — Foto: Getty Images
Coluna Cora Fernandes - Caixinha de memórias — Foto: Getty Images

Como um agrado e um lugar apropriado para guardar aquilo que traz boas lembranças, sempre ofereço a caixinha de memórias aos meus clientes. Muitas vezes, acham que o trabalho de organização é algo sem sentimento e que vamos jogar tudo fora — até aquela camiseta assinada por amigos da primeira série! No entanto, quando falo que podemos fazer uma caixinha de memórias, vejo que brota um sorriso no rosto. É como se fosse um agradecimento. Um sentimento de “ela se importa comigo".

Não me importo só com seus objetos de recordação como também com a conservação deles, que muitas vezes estão esquecidos atrás do armário - amarelado, amassado, com traças. E quando está passando pelo processo de organização, esse item desperta lembranças. Às vezes de alegria, outras de tristeza.

E para trazer uma reflexão mais profunda sobre a caixa de memórias, convidei a arteterapeuta Monica Soares para compartilhar um pouco sobre a experiência em seu ateliê:

"Falar sobre o espaço simbólico é recorrente em um ateliê de arteterapia. E encontrar a Cora, para conversar durante um processo de organização de um espaço de um grupo de teatro, na qual faço parte, foi mais uma conexão daquelas que faz o coração e os olhos brilharem nas trocas entre áreas super distintas, mas que no fundo, se conectam.

Falamos sobre a importância de separar um lugar para as memórias. Algo concreto que delimita o espaço e que acolha os objetos que trazem as lembranças que valem a pena serem acessadas.

Para entendermos melhor o contexto da conversa, falamos sobre o quanto o processo de organizar, separar o que vai e o que fica, é simbólico e envolve nossa psique. É como organizar nossas emoções enquanto aprendo com algo concreto - o objeto, sobre o que fica e o que consigo permitir que vá. Seja reciclando, doando ou gerando renda para mim, e dentro disso, observo e escolho os objetos que merecem um espaço só dele, para ser lembrado num momento em que eu escolho lembrar. Então, entra ela, a caixinha das memórias.

Partilhei com Cora um caso do ateliê arteterapêutico em que a pessoa sofreu diversas perdas bastante difíceis de lidar. Quando as pessoas que amamos se encantam, fica dentro de nós um grande vazio. É uma ferida que se transforma com o decorrer do tempo e a saudade se transmuta, traz novos significados. Para cada pessoa a forma e o tempo, são totalmente diferentes e precisamos encontrar maneiras de lidar emocionalmente com isso.

Pensando nesse vazio, elaborei junto a minha supervisora de arteterapia uma proposta de jornada chamada "Dia de Los Muertos" - inspirada na cultura mexicana. Ela consiste em usar materiais expressivos e artísticos para criar uma caixa de memórias, celebrando as pessoas que já se encantaram.

Essa caixa é o espaço onde guardamos todas as criações voltadas para as pessoas que se encantaram, exemplo: criamos um ritual que abençoa quem partiu, escrevemos cartas, criamos presentes, e transformamos algum objeto que pertenceu a pessoa que partiu deste plano. Elaboramos seu conteúdo interno pensando nos 4 elementos (terra, fogo, água e ar), lembrando que o processo de transformação ocorre, os ciclos existem e tudo se ressignifica.

A proposta é trazer algo concreto para cuidar dos espaços que estão vazios. Veja bem, não disse que é para preencher os espaços vazios, mas ter um local em que possa ser acessado sempre que é preciso ritualizar a saudade: quando quero lembrar, chorar, celebrar ou, quem sabe, conversar com quem não está mais aqui concretamente.

Esse processo de selecionar um espaço dentro de sua casa que caiba uma caixinha, na qual possa acessar sempre que sentir necessidade é também terapêutico, ressoa em nossas emoções e nos prepara para lidar com as convivências no mundo, nos ajuda a refletir: O que preciso deixar ir? O que desejo que fique? Para o que estou dando espaço? O que selecionei como importante? Cabe dentro da minha caixa emocional?".

Até a próxima coluna!

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