A Botânica

Por Gabriela Nora

Gabriela Nora é cenógrafa botânica, diretora de arte e fundadora da Galeria Botânica


A natureza como fonte. O artista visual Yuri Leal uniu técnicas e linguagens: tatuagem e muralismo. O ateliê foi montado em meio à instalação botânica e sombreado pelo ombrelone da Biasá Home  — Foto: João Barboza
A natureza como fonte. O artista visual Yuri Leal uniu técnicas e linguagens: tatuagem e muralismo. O ateliê foi montado em meio à instalação botânica e sombreado pelo ombrelone da Biasá Home — Foto: João Barboza

A Galeria Botânica é um lugar de transmutação. Uma plataforma criativa para reunir pensamentos diversos a partir do encontro, da espacialidade e das intenções artísticas em sinergia. É também um ateliê para potencializar a percepção a partir do contorno e vibração da natureza. O que os olhos enxergam, a pele filtra como estímulo que faz seu percurso pelo corpo. Esse tem sido o nosso maior desafio: alinhar a produção comercial de arranjos florais e projetos de cenografia à ebulição de ideias constantes. Como um espaço vivo.

 Instalação “Work In Progress” por Gabriela Nora - corpo-espaço / objetos / natureza - durante a Semana de Design. A transfiguração da galeria Botânica em tempo físico e real — Foto: João Barboza
Instalação “Work In Progress” por Gabriela Nora - corpo-espaço / objetos / natureza - durante a Semana de Design. A transfiguração da galeria Botânica em tempo físico e real — Foto: João Barboza
Cenógrafa Botânica Gabriela Nora reuniu artistas para provocar uma simbiose de naturezas diversas em manifestação na Galeria Botânica. As Monsteras Deliciosas por Jan de Wit Flores por Veiling Holambra — Foto: João Barboza
Cenógrafa Botânica Gabriela Nora reuniu artistas para provocar uma simbiose de naturezas diversas em manifestação na Galeria Botânica. As Monsteras Deliciosas por Jan de Wit Flores por Veiling Holambra — Foto: João Barboza

Em um mundo de processos automatizados, produtos fabricados em grande escala, provoco a pensar com o corpo todo e a resgatar a natureza de cada um nas criações da vida. Por isso, quando surgiu o convite do Lauro Andrade, idealizador da Design Weekend, para incluir a Galeria no mapa da maior semana de design urbano de São Paulo, a DW!, não pensei duas vezes: convoquei alguns artistas do país para o que chamamos de "Atravessamentos". Um processo compartilhado que extrapolou a noção do que é arte floral, até então, exibido na história do evento. A metamorfose orgânica de um fazer inesperado.

De Amsterdã para viver uma transitoriedade extraordinária da sua natureza em simbiose. Yuri Leal uniu técnicas tradicionais a processos contemporâneos estabelecendo a pele como tela pintada — Foto: João Barboza
De Amsterdã para viver uma transitoriedade extraordinária da sua natureza em simbiose. Yuri Leal uniu técnicas tradicionais a processos contemporâneos estabelecendo a pele como tela pintada — Foto: João Barboza

A flor pode estruturar um arranjo, mas não se trata disso. A ideia do coletivo era justamente escancarar a paisagem, transcender os pensamentos para as materialidades eclodirem e desestabilizarem, de certa forma, preconceitos - como o de transformar a pele em tela. Assim Yuri Leal, artista visual e fundador da The Gallery em Amsterdã, marcou sua passagem pela Galeria. Com a proposta de elevar a tatuagem ao status da arte contemporânea. É pintura do - e no - corpo.

A técnica de tear as materialidades disponíveis para dela ver surgir novas tramas — Foto: João Barboza
A técnica de tear as materialidades disponíveis para dela ver surgir novas tramas — Foto: João Barboza

A beleza ordinária do upcycling para ressignificar os materiais vivos. O artista mineiro Romildo Ferreira demonstrou a habilidade de outrora, na técnica ancestral de tecer que aprendeu com a família, nas pontas dos dedos conjugando estéticas estruturadas em tecidos e folhas secas. Como mantos, com aconchego, com o poder do toque e o movimento sincronizado à máquina de tear, que acompanha gerações do clã.

A Mata que habita Cris Conde, reaviva a reaproximação com a natureza humana — Foto: João Barboza
A Mata que habita Cris Conde, reaviva a reaproximação com a natureza humana — Foto: João Barboza

Das paisagens que habitam a artista Cris Conde, da Cris Conde Galeris, outras miragens aparecem. A conexão com a Mata Atlântica, nos últimos anos, estabeleceu novas rotas do pincel. "Faz um ano que absorvi a mata em mim e ando extravasando no meus quadros", conta Cris. E ela extravasou, de fato, linhas sinuosas nos desenhos acomodados em pequenas cerâmicas, utilizadas para customizar a poltrona Peacock da Biasá Home. Além dos vasos pintados especialmente para a DW, a partir de um processo transmitido em uma live painting no nosso jardim.

O olfato leva as pessoas às regiões distantes, intocadas e genuínas das nossas geografias — Foto: João Barboza
O olfato leva as pessoas às regiões distantes, intocadas e genuínas das nossas geografias — Foto: João Barboza

Pelos caminhos dos sentidos corporais, a Lènvie lançou uma experiência aromática com suas fragrâncias naturais em parceria com a Galeria Botânica, transportando para o contexto urbano os aromas dos biomas brasileiros. Os atravessamentos seguiram na confecção de esculturas botânicas criadas por nós.

Um arranjo é uma primeira conversa com criação botânica por Juliana Hames — Foto: João Barboza
Um arranjo é uma primeira conversa com criação botânica por Juliana Hames — Foto: João Barboza

A designer floral catarinense Juliana Hames tridimensionou uma demonstração floral com ares quase renascentistas. As flores ganharam camada de tinta e brilho realçantes. A artista consagrada também possui um espaço botânico que vale a pena conhecer em Florianópolis.

Conexão Floristas, por Raquel Franzini, reuniu artistas florais em um talk sobre o setor — Foto: João Barboza
Conexão Floristas, por Raquel Franzini, reuniu artistas florais em um talk sobre o setor — Foto: João Barboza

A Galeria Botânica também foi palco de uma importante iniciativa do setor. Abriu espaço para a troca entre artistas, como um marco de fortalecimento e amadurecimento dos protagonistas do segmento floral dentro do evento voltado ao design. Encabeçou a união da rede colaborativa de profissionais que atuam com flores e plantas ornamentais, uma participação inédita na história da DW.

"Incluir a arte floral dentro da principal semana de design significa mostrar a importância do trabalho dentro de um contexto da arquitetura, design e urbanismo, trazendo a oportunidade do profissional poder falar do seu trabalho artesanal e garimpo. Há uma dedicação muito grande em busca do material, pois o artista trabalha com algo perecível. A partir do bate-papo mediado pela Gabi Nora, tivemos trocas muito ricas que só fortaleceram a criação da rede", nos contou Raquel Franzini da plataforma Conexão Floristas.

A arte floral ganhou espaço na maior semana de Design Urbano, a DW! e isso não é pouca coisa. Convidados para o workshop, os arquitetos Paulo Azevedo e Selma de Sá, produziram seus próprios buquês com flores da Fazenda Alpes por Cooperflora. — Foto: João Barboza
A arte floral ganhou espaço na maior semana de Design Urbano, a DW! e isso não é pouca coisa. Convidados para o workshop, os arquitetos Paulo Azevedo e Selma de Sá, produziram seus próprios buquês com flores da Fazenda Alpes por Cooperflora. — Foto: João Barboza

Quais reflexões levamos desta semana tão cheia de trocas? O universo botânico não se resume à beleza das flores e plantas em arranjos. É isso também, e mais. Muito mais. As intervenções despertaram a necessidade de contemplação e ação, desbravando as geografias que formam mapas e subjetividades. O coletivo borrou os limites do que se compreende ser arte e a ampliação sobre o sensível.

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