O mercado automobilístico global passa por uma revolução. Querendo ou não, gostando ou não, isto é indiscutível. É provável que nos próximos anos veremos veículos nas ruas que nada lembrarão as tecnologias atuais, pois iremos observar cada vez mais lançamentos de modelos elétricos e híbridos. O crescimento do mercado de eletrificados é uma tendência, sob meu ponto de vista, irreversível, que enfrenta na infraestrutura de recarga um dos maiores desafios para sua popularização.
Globalmente, a distribuição desigual de estações de recarga é evidente: países como Noruega, Alemanha, Estados Unidos e China lideram em número de pontos públicos, enquanto nações emergentes, como o Brasil, ainda enfrentam limitações representativas.
Não podemos desmerecer os esforços de ampliação desta rede que vem se ampliando mês a mês chegando a 10.622 pontos públicos e semipúblicos – números previstos apenas para 2025 e já atingidos em outubro último, segundo a Associação Brasileiro do Veículo Elétrico (ABVE). Entretanto, não podemos fechar os olhos para a situação atual. O que representam estes números de carregadores em um país de dimensão continental?
Relativamente pouco, mas não podemos nos comparar a Luxemburgo, por exemplo. Neste contexto, elaborei um comparativo entre países com os números de carregadores divididos por área. Tomando por base a Europa, o pior país neste quesito é a Letônia, que tem 12,65 vezes mais carregadores do que o Brasil.
Se eliminarmos as áreas de baixa densidade demográfica, especificamente a Amazônia Legal e o Pantanal, este número cai para 4,97 vezes. E analisando Portugal e Espanha, países mais próximos ao nosso, culturalmente falando, eles têm, respectivamente 27,11 e 21,13 vezes mais carregadores. Estamos melhorando, mas ainda falta.
A falta de infraestrutura adequada prejudica a adoção em massa de veículos elétricos e eletrificados, pois cria uma restrição de circulação para médias e longas distâncias motivada pelo baixo alcance destes veículos.
Outra questão é a alta concentração de infraestrutura em grandes centros urbanos. Cidades como São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro, por exemplo, apresentam uma rede inicial satisfatória – também encontrada em rodovias como Bandeirantes e Dutra. No entanto, outras rodovias consideradas estratégicas ainda têm poucos pontos públicos de recarregamento. Segundo dados (desatualizados) de março de 2024, a região Sudeste dispõe de mais de 45% de todos os carregadores existentes no Brasil.
Por fim, existem as questões regulatórias. O setor enfrenta alta carga burocrática para a instalação de novos pontos e o Corpo de Bombeiros de São Paulo está em fase final de elaboração de uma necessária regulamentação que será aplicada em todo o território nacional. Custos elevados dos equipamentos de eletrocarga e sua operação, especialmente fora de áreas urbanas, são igualmente pontos cruciais.
Com respeito ao produto, a alta diversidade de conectores e de sistemas de recarga penaliza a padronização. Observa-se movimento contrário na Europa, com determinados padrões sendo adotados. E, neste tema, fabricantes de veículos ou importadores que inicialmente investiram em eletropostos passaram a cobrar valores altos de quem não têm os veículos da marca. Nada mais justo, sob meu ponto de vista, mas que impede a massificação.
Em países com alta participação de mercado de veículos elétricos, como a China, observou-se um aumento no consumo de energia durante os horários de pico, o que forçou investimentos em infraestrutura energética. Por lá, o desenvolvimento de tecnologias de recarga inteligente e horários de consumo diferenciados se tornaram essenciais.
Por aqui, algumas regiões que enfrentam problemas na distribuição de energia indicam que investimentos em infraestrutura são fundamentais e necessários. Também na dinâmica do tema, caso uma parcela da frota veicular se tornar elétrica, faltará energia mesmo com o aumento relevante observado em relação às energias eólica e solar, que aumentaram, respectivamente, 17,4% e 68,1% entre 2022 e 2023.
A solução para esses desafios, no Brasil, passa pelo sempre difícil alinhamento entre governo, empresas e consumidores. No exterior foi comum observarmos incentivos fiscais para instalação de eletropostos, parcerias público-privadas e subsídios para os veículos elétricos.
Estes benefícios, porém, já cessaram em diversos países. Já no nosso caso, não existe qualquer previsão de incentivos, exceto os já pensados como os encontrados no MOVER.
Chegaremos lá, mas ainda estamos muito longe de Luxemburgo com seus 2.586 carregadores, país que está em terceiro lugar no quesito ora informado (no indexador pela área, tem 738 vezes mais carregadores que o Brasil, ou 290 mais quando retiramos Amazônia e Pantanal).
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