Até 11 de janeiro, o carro mais barato da Ford no Brasil era o Ka S: R$ 51.990, segundo a tabela de preços sugeridos. Naquele dia, porém, a empresa anunciou o fim da sua produção e do EcoSport. O restante do estoque ainda pode ser encontrado em concessionárias. Na prática, porém, de um dia para o outro o Ford 0 km mais barato no país passou a ser a Ranger de R$ 156.890. Se for para deixar comerciais de fora, o Territory parte de R$ 179.900. Isso é quanto custa a partir de agora um carro da marca no Brasil. Os importados prometidos não devem chegar abaixo na tabela.
Após duas semanas, a GM anunciou que, até 2035, não vai mais oferecer motores a combustão interna, e investirá mais 35% em elétricos e autônomos em cinco anos. São R$ 146 bilhões para desenvolver e produzir carros, picapes e SUVs movidos só por eletricidade ou outro combustível sem emissões, como hidrogênio. A decisão foi revelada nos EUA, e vale para o Brasil.
A Volvo já decidira vender só híbridos por aqui neste ano. Mas, além de a marca não ter fábrica no Brasil, a opção de deixar motores a combustão para trás é global. Por isso o anúncio da GM de incluir o país é um marco histórico, por ser a primeira montadora local a tomar essa iniciativa. E isso num horizonte de 14 anos. Parece tempo suficiente, mas a guinada para a eletrificação do carro já começou nos EUA, na Europa e Ásia. Exige investimentos bilionários e transformações radicais no modo de produção e em infraestruturas urbana e rodoviária. E envolve toda a cadeia de fornecedores.
A GM ainda vai dizer se fará híbridos ou elétricos no país. Seu único elétrico hoje é o importado Bolt, que custa R$ 262.100. O Chevrolet mais barato é o Joy, de R$ 58.580. São 14 anos para reduzir a distância entre os dois valores para mais perto do bolso do consumidor.
Desde que a indústria automobilística foi organizada no Brasil, no fim dos anos 1950, recebeu alguma proteção do governo. Em prejuízo até de quem já fazia carros por aqui, como a Romi-Isetta. A iniciativa atraiu empresas, criou grande rede de fornecedores, gerou empregos e riqueza. Por outro lado, o fechamento do mercado e a falta de concorrência comprometeram a competitividade e o carro nacional foi ficando obsoleto.
Regras criadas pelo governo para melhorar a eficiência energética e gasto local em tecnologia atraíram empresas para produzir aqui. O modelo de benefícios fiscais faliu, a burocracia tributária continua um pesado ônus no país e os altos investimentos exigidos pela eletrificação desafiam a indústria no mundo inteiro.
Estudo do Banco Mundial para o governo brasileiro estima que sete montadoras bastariam para atender o mercado com rentabilidade. Hoje são 22. O país, que não chegou a fazer mais de 3,5 milhões de veículos, tem capacidade para 5 milhões, e metade hoje está ociosa.
A Renault, em nível global, avisou que vai passar a explorar modelos maiores e mais caros, de margem de lucro maior. A recém-criada Stellantis sinalizou a mesma meta por seu braço Fiat no Brasil. O futuro do que um dia foi o “carro popular” parece incerto.
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