Brasil e Índia estão separados por mais de 12 mil km. Em meio a culturas diferentes, as famílias de cada país se unem em uma mesma necessidade: ter um carro barato e espaçoso para se locomover. Há outra semelhança, a econômica, que refletem os dois países como economias emergentes. É por isso que a Citroën escolheu a Índia como base para desenvolver a nova família C3 para mercados como o Brasil. Nessa lógica nasceu o novo C3 Aircross, o SUV que também é o carro de 7 lugares mais barato do Brasil.
Mas a família ainda vai crescer. Além do próprio Aircross e do C3 hatch, haverá um futuro SUV cupê, que deve se chamar C3 X ou C3 Fastlounge.
Mas estamos aqui para falar do novo Aircross, lançado no fim do ano passado só em versões de cinco lugares — opções para sete chegaram mais recentemente. Não que o preço da versão que testamos, a Shine Turbo 200 (topo de linha), R$ 129.990, seja barato; mas pode ser considerado atrativo no segmento de SUVs compactos.
Citroën Aircross
O carro tem ótimo espaço para cinco pessoas e porta-malas de 493 litros, mas o pacote de segurança é o mínimo: traz airbags laterais e só. Os demais itens são obrigatórios pela legislação brasileira, como controles de estabilidade e de tração, ganchos Isofix e freios ABS.
Com dois filhos e um feriado pela frente, achei fácil acomodar quatro passageiros mais bagagem para passar quatro dias no interior de São Paulo. Objetivo da Citroën concluído? Pode ser, mas a vida não é só isso, nem aqui, nem na Índia. Brasileiros e indianos querem um pouco de conforto em um automóvel de quase R$ 130 mil. E é nos detalhes que vemos onde a Citroën economizou. Não há luz de leitura; os espelhos dos para-sóis são pequenos e sem tampa; os cintos de segurança não têm regulagem de altura.
Mesmo sendo o Shine Turbo 200 o C3 Aircross mais caro, não tem ar-condicionado digital nem saídas para o banco traseiro. Falta isolamento acústico na cabine e capricho no acabamento interno. Se o motor tocasse uma cítara (ou um cavaco), daria para ouvir lá de dentro, mas o ruído maior é da ventoinha, que grita alto para dizer que está ligada quando paramos o carro e o motor segue acionado.
Cortes e mais cortes
O interior é quase igual ao do C3 hatch. Se já é simples para um carro de R$ 80 mil, imagine para um de R$ 130 mil. Tudo em nome dos cortes de custos e ganhos de escala. O único conforto de quem vai atrás é ter duas portas USB para recarregar celulares. Até abrir os vidros é uma tarefa complicada, pois os botões ficam no fim do console central. Uma criança de sete anos com o cinto de segurança afivelado não tem condições de acionar as teclas sem pedir ajuda.
O visual agrada. A frente, em relação à do hatch C3, tem basicamente o mesmo desenho, mas com alterações pontuais no para-choque e nos para-lamas para dar um ar mais robusto, de SUV. Os faróis são os da moda, com o bloco principal abaixo da linha da grade das luzes diurnas. Mas há um truque para cortar custos: a peça é única, parcialmente escondida pelo próprio para-choque.
A diferença para o C3 está da coluna B para trás. O teto alongado só termina rente à queda da linha da tampa do porta-malas, dando um ar de perua. Em meio à larga coluna C, uma pequena vigia lateral quebra o excesso de lataria. A traseira tem lanternas exclusivas interligadas por uma barra preta. O porta-malas pode ser aberto por meio de um botão posicionado na própria tampa, exatamente ao lado da câmera de ré. A placa fica no para-choque traseiro, preto com detalhes prateados.
Na versão Shine, as rodas são de liga leve com 17 polegadas de diâmetro, calçadas com pneus 215/60 de uso misto. O desenho traz quatro raios, que lembram uma cruz e são finalizados com faces diamantadas e de pintura preta. A versão testada era cinza-escuro com teto e retrovisores pretos. Aliás, a pintura metálica bicolor é opcional, por mais R$ 1.600.
Grande, mas ágil
Hora de dar a partida. A chave é um bastão com dois botões, para abrir e fechar as portas. Não é canivete, muito menos presencial. Ao girá-la no contato, é comum apertar uma das teclas sem querer e até acionar o alarme por causa disso. Meu carro é 2009 e tem uma chave parecida, até um pouco menor que a da Citroën. Mais um corte de custos.
O motor, por outro lado, é moderno. O 1.0 de três cilindros turbo com injeção direta de combustível e sistema MultiAir III, que promove a variação inteligente das fases de admissão e escape, entrega 130 cv de potência e 20,4 kgfm de torque. O câmbio é automático CVT com sete marchas simuladas. O conjunto foi a colaboração da Stellantis para o projeto, já que equipa os Fiat Strada, Pulse e Fastback.
Os engenheiros da Stellantis trabalharam bem para adaptar o novo C3 Aircross para o Brasil. Afinaram o motor e o câmbio para carregar o peso extra do SUV com cinco pessoas e porta-malas cheio. Em ultrapassagens e subidas, o desempenho contou com boas respostas. Mas a construção do carro permite a entrada de muitos ruídos na cabine. É possível ouvir até o característico assovio dos motores turbo.
Suspensão é ponto alto
Apesar da arquitetura simples, a suspensão é o ponto alto do acerto. Em estradas esburacadas e ruas de paralelepípedos, ninguém reclamou de solavancos ou fim de curso. Tampouco notamos barulho das peças ou batidas secas, sinais de um bom acerto.
Em nosso teste no Rota 127 Campo de Provas, os números confirmaram as impressões. Com etanol, o C3 Aircross foi de zero a 100 km/h em 9,7 segundos. Seu principal concorrente, a Chevrolet Spin, com o veterano motor 1.8 aspirado flex de oito válvulas com 111 cv de potência e 17,7 kgfm de torque, precisa de 11,4 s. No consumo, o SUV da Citroën também não fez feio, embora sem números brilhantes: 8,8 km/l na cidade e 11,8 km/l na estrada. A Spin faz 7,3 km/l e 10,7 km/l, respectivamente, diferença considerável em um mesmo segmento.
Na Índia, apesar de não ter Spin — a Chevrolet nem opera mais lá —, o mercado de SUVs compactos de sete lugares é mais concorrido do que no Brasil. Para colocar o novo C3 Aircross na briga, os indianos entraram com espaço e versatilidade. Os brasileiros completaram com desempenho. Só que, tanto lá como cá, poderiam ter caprichado mais nos detalhes.
Citroën C3 Aircross Shine
Teste |
ACELERAÇÃO |
0 - 100 km/h: 9,7 s |
0 - 400 m: 16,9 s |
0 - 1.000 m: 31,4 s |
Vel. a 1.000 m: 164,1 km/h |
Vel. real a 100 km/h: 96 km/h |
RETOMADA |
40 - 80 km/h (D): 4,3 s |
60 - 100 km/h (D): 5,5 s |
80 - 120 km/h (D): 7,1 s |
FRENAGEM |
100 - 0 km/h: 46,8 m |
80 - 0 km/h: 28,4 m |
60 - 0 km/h: 16,4 m |
CONSUMO |
Urbano: 8,8 km/l |
Rodoviário: 11,8 km/l |
Média: 10,3 km/l |
Aut. em estrada: 555 km |
Citroën C3 Aircross Shine
Ficha técnica |
Preço: R$ 129.990 |
Motor: Diant., transv., 3 cil. em linha, 12V, turbo, flex, injeção direta |
Potência: 130 cv a 5.750 rpm |
Torque: 20,4 kgfm a 1.700 rpm |
Câmbio: CVT, 7 marchas simuladas, tração dianteira |
Direção: Elétrica |
Suspensão: Indep., McPherson (diant.) e eixo de torção (tras.) |
Freios: Discos ventilados (diant.) e tambores (tras.) |
Pneus: 215/60 R17 |
Tanque: 47 litros |
Porta-malas: 493 litros (fabricante) |
Peso: 1.216 kg |
Multimídia: 10,3", Android Auto e Apple CarPlay (sem fio) |
Ponto positivo: Desempenho do motor 1.0 turbo; suspensão; espaço interno e porta-malas |
Ponto negativo: Isolamento acústico; acabamento interno; lista de itens de segurança |
DIMENSÕES |
Comprimento: 4,32 metros |
Largura: 1,72 m |
Altura: 1,67 m |
Entre-eixos: 2,68 m |
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