Automobilismo

Ayrton Senna faleceu no fatídico GP de San Marino de 1994, que completou 30 anos no último dia 1º de maio, a bordo do modelo FW16 da equipe Williams. Entretanto, foi na conterrânea McLaren que o tricampeão viveu seus dias de glória na Fórmula 1. Lá, conquistou todos os seus três títulos mundiais (1988, 90 e 91), além de 35 de suas 41 vitórias, 46 de suas 65 pole positions e 55 de seus 80 pódios na categoria.

Não é à toa que a própria McLaren preparou uma pintura especial para homenagear as três décadas da morte de Senna no GP de Mônaco de 2024. O modelo MCLA38, pilotado por Lando Norris (vencedor do GP de Miami deste ano) e Oscar Piastri, trocará a cor laranja de seu carro por uma combinação de verde, amarelo e azul similar à do capacete do piloto brasileiro.

McLaren em homenagem a Ayrton Senna para o GP de Mônaco 2024 — Foto: Divulgação
McLaren em homenagem a Ayrton Senna para o GP de Mônaco 2024 — Foto: Divulgação

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A escolha por Monte Carlo simboliza o fato de Ayrton ser até hoje o recordista em vitórias lá. Foram seis (1987 e entre 89 e 93), cinco delas obtidas com a escuderia britânica. O feito o levou a receber o apelido “Rei de Mônaco”, visto que o país encravado na costa francesa é um principado.

Combinação de cores marcou a história da F1 — Foto: Divulgação
Combinação de cores marcou a história da F1 — Foto: Divulgação

Mas você já reparou que a própria McLaren não demonstra qualquer intenção de recriar a pintura tradicional nas cores branca e vermelha usada em todos os campeonatos que Senna disputou pela equipe? Ayrton correu pela esquadra sediada na cidade britânica de Woking entre 1988 e 93. Em todos esses anos, o esquema de coloração dos carros sempre foi o mesmo, devido ao patrocínio máster da companhia tabagista Philip Morris, que expunha ali a marca Marlboro.

Carro de Senna exibia a marca da Marlboro — Foto: Paul-Henri Cahier/Getty Images
Carro de Senna exibia a marca da Marlboro — Foto: Paul-Henri Cahier/Getty Images

Pois é justamente por causa da Philip Morris e da Marlboro que a McLaren não pode (e nem quer) fazer qualquer tipo de releitura da pintura usada naqueles tempos. São dois os fatores principais ligados a isso. O primeiro e mais importante é comercial. O segundo, de menor impacto, tem a ver com a própria legislação da categoria.

Comecemos pelo segundo. Desde o final da década de 2000 a F1 proíbe a propaganda explícita de marcas de tabaco em seus carros ou em qualquer ação promocional envolvendo a categoria. Isso, por si, impediria a McLaren de pintar seus monopostos com o logotipo vermelho da Marlboro exposto sobre uma base branca, como acontecia nos anos de Ayrton Senna.

Ainda assim, é óbvio que seria possível burlar essa restrição, a partir de uma releitura que apenas remetesse à pintura do passado sem necessariamente recriá-la. Mas aí entra a primeira e mais relevante questão: comercial. A McLaren, hoje, recebe um forte aporte financeiro da British American Tobacco (BAT), principal concorrente mundial da Philip Morris.

Mas calma lá: se o patrocínio de cigarros é proibido, por que a gigante tabagista com sede nos Estados Unidos despeja centenas de milhares de dólares no time que um dia empregou Ayrton Senna? Porque a própria F1 faz vista grossa à publicidade velada (nem tanto assim) dos cigarros, além de permitir a exposição de marcas adjacentes da indústria tabagista.

A McLaren se beneficia disso ao divulgar em seus carros, já há alguns anos, as empresas Vuse e Velo. Ambas são subsidiárias da BAT voltadas ao comércio de sachês de nicotina e cigarros eletrônicos, respectivamente. A própria Philip Morris expôs, entre 2018 e 21, logotipos da Mission Winnow nos carros da Ferrari. O projeto era acusado de estimular, embora implicitamente, o uso do cigarro eletrônico.

McLaren recebe as cores da Vuse; empresa produz tabletes de nicotina e vapes — Foto: Divulgação
McLaren recebe as cores da Vuse; empresa produz tabletes de nicotina e vapes — Foto: Divulgação

Aliás, a Ferrari foi o grande pilar da separação entre McLaren e Philip Morris, ocorrida em 1996, dois anos após a morte de Ayrton Senna. Após mais de duas décadas ininterruptas de patrocínio, a tabagista norte-americana decidiu deixar a equipe britânica para acompanhar a nova estrela da F1, Michael Schumacher, em seu projeto de voltar a fazer da Ferrari uma esquadra vencedora.

Entre 96 e 2021, a Marlboro foi a patrocinadora principal da Ferrari. Passou, inclusive, a expor de maneira velada o logotipo da marca nos carros vermelhos da escuderia quando a exposição foi definitivamente proibida pela categoria, em 2008. Fez isso, primeiro, inserindo códigos de barra nos pontos nobres da carenagem dos carros. A partir de 2011, o emblema da Scuderia Ferrari na F1 passou a ser um triângulo vermelho sobre um fundo branco, que parecia ser a “metade” do logotipo da Marlboro.

Desde aquela época, a McLaren evitava fazer qualquer uso de combinações de branco com vermelho em sua pintura, para não fazer propaganda gratuita a uma empresa que despejava caminhões de dinheiro em sua principal rival. Hoje, a Philip Morris não apoia mais a Ferrari, mas é o acordo com a BAT que impede os britânicos de cogitar qualquer homenagem do tipo em relação a Ayrton Senna. Se o branco com vermelho da Marlboro não pode, vai o amarelo com azul e verde do capacete mesmo.

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